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A CULTURA E SEU CONTRÁRIO TC def.pmd

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O movimento em direção a essas duas posições estratégicas<br />

ocupadas pela cultura compõe-se de vetores menos contraditórios e<br />

conflitantes entre si do que costuma propor uma argumentação<br />

simplificadora mais recente a respeito do papel do Estado e do Mercado.<br />

Nem a política cultural dos estados foi de todo desinteressada ou<br />

generosa 1 , nem o mercado ofereceu unicamente novas fontes de lucro<br />

rápido e rasteiro para uma iniciativa privada que não se importaria<br />

com a qualidade de seu produto e o impediria mesmo de mostrar-se<br />

culturalmente relevante (o cinema, atividade mercantil como tantas<br />

outras, forneceu boa parte das mais destacadas obras-primas do século<br />

20, todos os gêneros considerados, incluindo-se aqui a literatura e as<br />

artes visuais: basta pensar na cinematografia de Fellini, Bergman,<br />

Oshima, Godard, Antonioni, Kurozawa, Glauber Rocha, tantos outros).<br />

De todo modo, não foi apenas para isso que se descobriu a cultura<br />

no século 20. Ela serviu também como instrumento ideológico de<br />

expansão imperial e de agressão econômica, política e social. Exemplos<br />

extremados dos dois últimos casos estão à disposição na história do<br />

comunismo e do nazismo. E uma amostragem dos dois primeiros, que<br />

se distinguem do segundo mais por um efeito de superfície que de<br />

fundo, encontra-se no uso que os EUA fez da penetração cultural para<br />

difundir seus valores e interesses. O Brasil foi um dos alvos escolhidos por<br />

esse país, mas não o único. A rivalidade dos EUA com a Europa levou-o<br />

também a difundir a ideia de uma “arte americana contemporânea”<br />

considerada como expressão privilegiada dos novos tempos — que o<br />

seria mais ainda que a própria arte da Escola de Paris, na opinião dos<br />

ideólogos norte-americanos oficiais — e da qual a obra de Pollock foi<br />

indício e uma das expressões máximas, adotada pelo Departamento<br />

de Estado como emblema da arte apropriada a um país novo, afirmativo<br />

e impositivo.<br />

As décadas finais do século 20 presenciaram uma fragmentação e<br />

paralela pulverização dessas guerras culturais e, ao mesmo tempo,<br />

uma maximização do conflito cultural. O cenário da atomização das<br />

diferenças culturais, frequentemente em choque mais que em sintonia<br />

umas com as outras, foi aquele demarcado pelo aparecimento dos<br />

“estudos culturais” à americana (apesar da eventual precedência da<br />

escola inglesa) que serviram de moldura teórica e estimulação para o<br />

surgimento de um novo feminismo e o reconhecimento cultural das<br />

minorias étnicas e sexuais. E à reascensão da cultura como instrumento<br />

1 Ao lado do ânimo humanista de André Malraux, que propunha a cultura como mola de uma<br />

outra qualidade de vida, residia a vontade política de reforçar e preservar a identidade<br />

francesa e manter a França como polo de atração do turismo, portanto dos negócios.<br />

8 A <strong>CULTURA</strong> E <strong>SEU</strong> <strong>CONTRÁRIO</strong>

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