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um problema da literatura: ela fazia sentido apen<strong>as</strong> no abstrato, não oferecia<br />
ajuda na vida real, que exigia muito mais coragem do que o necessário para virar<br />
págin<strong>as</strong> sozinho, escondido do mundo num canto, na cama, debaixo de uma<br />
árvore.<br />
— Estou escrevendo poesia aqui — contou Alex. — A experiência tem sido<br />
uma musa para mim. As palavr<strong>as</strong> jorram! Fiz um poema sobre a noite p<strong>as</strong>sada<br />
chamado “Há poder no conhecimento”.<br />
Só então reparei no caderno sobre a cama, uma caneta repousando em cima.<br />
Nem sei como deixaram que ele fic<strong>as</strong>se com aquel<strong>as</strong> cois<strong>as</strong> dentro da cela.<br />
Quando percebeu meu olhar, Alex foi até a cama, pegou o caderno, arrancou<br />
a folha com o poema e me entregou por entre <strong>as</strong> barr<strong>as</strong>.<br />
Com medo de que confisc<strong>as</strong>sem <strong>as</strong> palavr<strong>as</strong> dele, guardei o papel correndo,<br />
no bolso da calça.<br />
— Que prazer é esse em escrever poesia na cadeia, Alex? Você ficou maluco?<br />
— Como <strong>as</strong>sim? A cadeia é o lugar perfeito para a poesia! A poesia é a língua<br />
dos oprimidos!<br />
Ele parecia um louco.<br />
— E a nossa missão? — questionou Oliver. — E Sandra Tackett? E o<br />
mistério que a gente ia desvendar?<br />
— Tudo a seu tempo, meu amigo. Tudo a seu tempo.<br />
— Alex, você está na cadeia — tentei novamente. — Na cadeia! Isso é grave.<br />
Você não pode sair por aí socando <strong>as</strong> pesso<strong>as</strong>.<br />
— Eu não “saí por aí socando <strong>as</strong> pesso<strong>as</strong>”. Estava defendendo Oliver e os<br />
direitos de todos que já estiveram no lugar dele. É uma questão de princípios.<br />
Não tenho medo de pagar o preço pel<strong>as</strong> minh<strong>as</strong> convicções. Wrigley entenderia.<br />
— Você perguntou ao Booker o que ele achava disso?<br />
— Booker é um velho. Não se pode pedir conselhos a um velho sobre algo<br />
que deve ser feito por um jovem. M<strong>as</strong> eu posso ler O ceifador de chicletes. Com<br />
certeza. E o li um milhão de vezes!<br />
Alex estava com o olhar de um louco. Eu estava <strong>as</strong>sustada, m<strong>as</strong> ao mesmo<br />
tempo me sentia f<strong>as</strong>cinada com a honestidade dele na conversa. Nem a cadeia<br />
tinha conseguido obrigá-lo a vestir uma máscara e mentir para o mundo. Era<br />
loucura, clara e simples, m<strong>as</strong> uma loucura sedutora. Como estar diante de uma<br />
grande fogueira, dançante e cheia de calor e de luz, uma fogueira que também<br />
continha em si o perigo de me consumir. Por quanto tempo mais eu poderia<br />
permanecer ali?