Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
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<strong>Do</strong> <strong>Belo</strong> <strong>Musical</strong> 103<br />
acontece no quadro e no drama “Egmont”. O conteúdo <strong>da</strong> abertura são<br />
sequências sonoras que o compositor criou de modo inteiramente livre<br />
a partir do seu íntimo e segundo as leis do pensamento musical. São de<br />
todo autónomas e independentes <strong>da</strong> ideia “Egmont”, com que as relacionou<br />
apenas a fantasia poética do compositor. Esta relação, porém, é<br />
tão arbitrária que nunca um ouvinte <strong>da</strong> peça musical adivinharia o seu<br />
pretenso objecto, se o autor não impusesse à nossa fantasia a orientação<br />
determina<strong>da</strong>, mediante a designação explícita. A grandiosa abertura de<br />
Berlioz tem por si tão escassa relação com a ideia do “rei Lear” como<br />
uma valsa de Strauss. Tal não pode afirmar-se com rigor suficiente,<br />
porque abun<strong>da</strong>m a este respeito as opiniões mais dis<strong>para</strong>ta<strong>da</strong>s. A valsa<br />
de Strauss só parece contradizer a ideia do “rei Lear”, e a abertura de<br />
Berlioz, pelo contrário, só parece coadunar-se com ela no instante em<br />
que com aquela ideia se com<strong>para</strong>m as músicas referi<strong>da</strong>s. Não existe nenhum<br />
motivo intrínseco <strong>para</strong> semelhante com<strong>para</strong>ção, mas apenas uma<br />
imposição expressa por parte do autor. Se somos forçados por meio de<br />
um título determinado a com<strong>para</strong>r a peça musical com um objecto que<br />
lhe é extrínseco, devemos medi-la por uma bitola determina<strong>da</strong>, que não<br />
é a musical.<br />
Talvez se possa então dizer: A abertura Prometeu de Beethoven<br />
não é assaz grandiosa <strong>para</strong> esse tema. Mas não pode li<strong>da</strong>r-se com ela<br />
a partir de dentro, não pode demonstrar-se que tenha alguma lacuna<br />
ou deficiência musical. É perfeita, porque realiza integralmente o seu<br />
conteúdo musical; e a realização análoga do seu tema poético é uma segun<strong>da</strong><br />
exigência de todo diversa. Esta nasce e desaparece com o título.<br />
Além disso, semelhante pretensão quanto a uma obra musical com um<br />
título determinado só pode referir-se a certas proprie<strong>da</strong>des características:<br />
que a música ressoe sublime ou graciosa, sombria ou alegre, passe<br />
<strong>da</strong> exposição simples ao final triste ou alegre, etc. O tema [material]<br />
exige <strong>da</strong> arte poética ou <strong>da</strong> pintura uma determina<strong>da</strong> individuali<strong>da</strong>de<br />
concreta, e não simples proprie<strong>da</strong>des. Seria, pois, plenamente concebível<br />
que a abertura Egmont de Beethoven pudesse levar o título de<br />
“Guilherme Tell” ou “Joana d’Arc”. O drama e o quadro de Egmont<br />
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