Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
✐<br />
✐<br />
✐<br />
✐<br />
90 Eduard Hanslick<br />
com o carácter paisagístico do ambiente e a disposição anímica pessoal,<br />
pode deixar muito atrás de si, em poder, qualquer fruição artística.<br />
Existe, pois, uma preponderância <strong>da</strong> impressão que o elementar<br />
pode alcançar sobre o artístico, mas a estética (ou, se pretendermos<br />
uma formulação mais estrita, aquela sua parte que trata do belo artístico)<br />
só deve considerar a música a partir <strong>da</strong> sua vertente artística, por<br />
conseguinte, reconhecer unicamente os efeitos que ela, enquanto produto<br />
espiritual humano, suscita na pura contemplação mediante uma<br />
determina<strong>da</strong> configuração <strong>da</strong>queles factores elementares.<br />
A exigência mais peremptória de uma percepção estética <strong>da</strong> música<br />
é que se escute uma peça musical por mor de si mesma, seja ela qual for<br />
e com a concepção que se quiser. Logo que a música se utiliza apenas<br />
como meio <strong>para</strong> fomentar em nós uma certa disposição de ânimo, de<br />
modo acessório e decorativo, cessa de actuar como arte. Confundese,<br />
infinitas vezes, o elementar <strong>da</strong> música com a sua beleza artística,<br />
tomando, pois, uma parte pelo todo e originando assim uma confusão<br />
indizível. Cem aforismos dedicados à “arte dos sons” não se referem a<br />
esta, mas ao efeito sensual do seu material.<br />
Quando Henrique IV na obra de Shakespeare (II Parte, IV, 4) man<strong>da</strong>,<br />
ao morrer, tocar música, tal não acontece decerto <strong>para</strong> ouvir a composição<br />
que se executa, mas <strong>para</strong> se embalar sonhando no seu elemento<br />
imaterial. <strong>Do</strong> mesmo modo Pórcia e Bassânio (no Mercador de Veneza)<br />
não estão com disposição <strong>para</strong> prestar atenção à música, durante<br />
o momento fatal <strong>da</strong> escolha <strong>da</strong> caixinha. J. Strauss escreveu nas suas<br />
melhores valsas música encantadora e até brilhante, mas ela deixa de<br />
ser tal logo que se pretende apenas <strong>da</strong>nçar ao seu compasso. Em todos<br />
estes casos é de todo indiferente que música se toca, contanto que possua<br />
o carácter fun<strong>da</strong>mental desejado. Mas onde assoma a indiferença<br />
perante o individual domina o efeito sonoro, e não a arte musical. Só<br />
ouviu e desfrutou de uma peça musical quem persiste na contemplação<br />
inolvidável e determina<strong>da</strong> desta peça, e não apenas no seu simples<br />
efeito secundário e geral sobre o sentimento. Aquelas relevantes impressões<br />
no nosso ânimo e o seu elevado significado psíquico e fisio-<br />
www.lusosofia.net<br />
✐<br />
✐<br />
✐<br />
✐