Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
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56 Eduard Hanslick<br />
ponto surge como uma espécie de Cabala, que ensinaria o “cálculo <strong>da</strong><br />
composição”.<br />
Se a matemática proporciona uma chave indispensável à investigação<br />
<strong>da</strong> parte física <strong>da</strong> música, não deve, pelo contrário, exagerar-se a<br />
sua importância na obra já pronta. Em nenhuma composição, seja ela<br />
a mais bela ou a pior, na<strong>da</strong> há de matematicamente calculado. As criações<br />
<strong>da</strong> fantasia não são exemplos aritméticos. Não se integram aqui<br />
as experiências com o monocórdio, as figuras tonais, as proporções dos<br />
intervalos e quejandos, o domínio estético só começa onde aquelas relações<br />
elementares deixaram de ter significado. A matemática regula<br />
apenas a matéria elementar <strong>para</strong> o seu tratamento susceptível de espírito<br />
e interfere ocultamente nas relações mais simples, mas a ideia musical<br />
vem à luz sem ela. Quando Oerstedt pergunta: ”Bastará o tempo<br />
de vi<strong>da</strong> de vários matemáticos <strong>para</strong> calcular to<strong>da</strong>s as belezas de uma<br />
sinfonia de Mozart 7 ?” Confesso que não compreendo. Que se deve ou<br />
pode calcular? Porventura a relação de vibrações de um som com o<br />
seguinte ou a extensão dos períodos individuais entre si, ou outra coisa<br />
ain<strong>da</strong>? O que faz de uma música uma composição e a eleva acima <strong>da</strong><br />
série de experimentos físicos é algo de livre, espiritual e, por conseguinte,<br />
incalculável. A matemática tem tão restrita ou tão ampla parte<br />
na obra de arte musical como nas produções <strong>da</strong>s restantes artes. Com<br />
efeito, a matemática deve, ao fim e ao cabo, guiar também a mão do<br />
pintor e do escultor, a matemática tece na proporção os comprimentos<br />
dos versos e <strong>da</strong>s estrofes, há matemática na construção do arquitecto,<br />
nas figuras do bailarino. A aplicação <strong>da</strong> matemática, como activi<strong>da</strong>de<br />
racional, tem de encontrar um lugar em todo o conhecimento exacto.<br />
Mas não há que atribuir-lhe uma força realmente positiva, criadora,<br />
como de bom grado desejam muitos músicos, os conservadores <strong>da</strong> estética.<br />
Acontece com a matemática algo de semelhante à produção dos<br />
sentimentos no ouvinte: tem lugar em to<strong>da</strong>s as artes, mas o grande<br />
alarido a seu respeito é simplesmente na música.<br />
7 Geist in der Natur, T. III, trad. alemã de Kannegiesser, p. 32.<br />
www.lusosofia.net<br />
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