Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
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54 Eduard Hanslick<br />
vestigar o que nelas há de belo e o seu porquê. A inquirição estética<br />
na<strong>da</strong> sabe nem pode saber <strong>da</strong>s condições pessoais e do ambiente histórico<br />
do compositor, só ouvirá e acreditará no que a própria obra de arte<br />
expressa. Descobrirá, pois, nas sinfonias de Beethoven, mesmo sem<br />
conhecer o nome e a biografia do autor, o tempestuoso, a luta, o anelo<br />
insatisfeito, a obstinação consciente <strong>da</strong> sua força, mas nunca deduzirá<br />
<strong>da</strong>s obras nem empregará <strong>para</strong> a sua apreciação a circunstância de que<br />
o compositor terá sido de convicção republicana, solteiro e surdo, nem<br />
todos os outros rasgos que o historiador <strong>da</strong> arte aduz a título ilustrativo.<br />
Com<strong>para</strong>r a diversi<strong>da</strong>de <strong>da</strong> mundividência de um Bach, Mozart e<br />
Haydn e reduzir a tal o contraste <strong>da</strong>s suas composições pode passar por<br />
um empreendimento muito atraente e meritório, mas está tanto mais<br />
exposto a conclusões erróneas quanto mais estritamente preten<strong>da</strong> expor<br />
o nexo causal. O perigo do exagero é extraordinariamente grande<br />
na aceitação deste princípio. Pode então apresentar-se a mais frouxa<br />
influência <strong>da</strong> simultanei<strong>da</strong>de como uma necessi<strong>da</strong>de intrínseca e interpretar<br />
a linguagem sonora eternamente intraduzível, segundo a própria<br />
conveniência. Dependerá <strong>da</strong> execução oportuna do mesmo <strong>para</strong>doxo<br />
que, na boca do homem engenhoso, surja como sabedoria, e na do simples<br />
como um desatino.<br />
Hegel também desatinou muitas vezes, ao referir-se à arte sonora,<br />
porque confundiu de modo imperceptível o seu ponto de vista predominantemente<br />
histórico-artístico com o estético e comprovou na música<br />
determini<strong>da</strong>des que ela jamais em si teve. O carácter de qualquer<br />
composição tem decerto “uma conexão” com o do seu autor, mas não<br />
vem à luz do dia <strong>para</strong> o esteta; — a ideia <strong>da</strong> necessária interrelação de<br />
todos os fenómenos pode exagerar-se até à caricatura na sua comprovação<br />
concreta. Hoje em dia, é preciso um ver<strong>da</strong>deiro heroísmo <strong>para</strong><br />
se contrapor a esta orientação picante e engenhosamente representa<strong>da</strong>,<br />
e <strong>para</strong> afirmar que a “compreensão histórica” e o “juízo estético” são<br />
coisas distintas 6 . Mas fica objectivamente estabelecido: primeiro, que<br />
6 Se aqui mencionamos os Musikalischen Kharakterköpfe de Riehl, tal acontece,<br />
no entanto, com o reconhecimento grato pelo seu livrinho engenhoso e estimulante.<br />
www.lusosofia.net<br />
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