Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
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<strong>Do</strong> <strong>Belo</strong> <strong>Musical</strong> 63<br />
compositoras, ao lado de tantas escritoras e pintoras, seria difícil de explicar.<br />
Não é o sentimento que compõe, mas os dons especificamente<br />
musicais, artisticamente educados. É, pois, cómico ver F. L. Schubart<br />
apresentar os “An<strong>da</strong>ntes magistrais” do compositor Stamitz, com to<strong>da</strong><br />
a serie<strong>da</strong>de, como uma natural “consequência do seu coração sensível”<br />
10 , ou Christian Rolle asseverar que “um carácter afável e terno nos<br />
torna hábeis <strong>para</strong> fazer de movimentos lentos obras-primas” 11 .<br />
Sem calor interior na<strong>da</strong> de grande nem de belo se realizou na vi<strong>da</strong>.<br />
O sentimento encontrar-se-á ricamente desenvolvido no compositor,<br />
como também em ca<strong>da</strong> poeta, mas não é nele o factor criador. Supondo<br />
mesmo que o imbui totalmente um pathos forte e definido, este<br />
será motivo e consagração de muitas obras de arte, mas – como sabemos<br />
pela natureza <strong>da</strong> arte sonora, que não tem nem a capaci<strong>da</strong>de nem<br />
a vocação de expressar um afecto determinado – jamais será o seu objecto.<br />
<strong>Um</strong> cantar interior, e não apenas um mero sentir interno, é que impele<br />
o indivíduo com talento musical <strong>para</strong> a invenção de uma peça sonora.<br />
É de regra que a composição se conceba de um modo puramente<br />
musical, e que o seu carácter não seja um resultado dos sentimentos<br />
pessoais do compositor. Só por excepção é que este improvisa as melodias<br />
como expressão de um afecto determinado, que o enche. Mas o<br />
carácter deste afecto, uma vez absorvido pela obra de arte, só interessa<br />
então como determini<strong>da</strong>de musical, como carácter <strong>da</strong> peça, e não já do<br />
compositor.<br />
Concebemos a activi<strong>da</strong>de do compor como um modelar; e como<br />
tal ela é essencialmente objectiva. O compositor forma uma beleza<br />
autónoma. O material espiritual, infinitamente susceptível de expressão,<br />
dos sons permite que a subjectivi<strong>da</strong>de de quem neles modela algo<br />
se manifeste na índole do seu formar. Visto que os elementos musicais<br />
singulares já possuem uma expressão característica, os rasgos<br />
caracteriais proeminentes do compositor – sentimentali<strong>da</strong>de, energia,<br />
10 Schubart: Ideen zur Aesthetik der Tonkunst, 1806.<br />
11 Neue Wahrnehmungen zur Aufnahme der Musik, Berlim, 1784, p. 102.<br />
www.lusosofia.net<br />
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