Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da ... - LusoSofia
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50 Eduard Hanslick<br />
timentos mais elevados ou os mesmos sentimentos de um modo mais<br />
correcto? Não, mas que ela modela formas sonoras mais belas. <strong>Um</strong>a<br />
música é boa ou má unicamente porque um compositor institui um tema<br />
cintilante de espírito, e outro um tema vulgar, porque o primeiro o desenvolve<br />
em todos os sentidos, sempre de novo e de modo significativo,<br />
e o outro vai tornando o seu ca<strong>da</strong> vez pior, porque a harmonia de um se<br />
desdobra cheia de mu<strong>da</strong>nças e de originali<strong>da</strong>de, ao passo que a outra,<br />
na sua pobreza, não progride, porque aqui o ritmo é um pulso saltitante<br />
e cálido de vi<strong>da</strong> e, ali, um toque de recolher.<br />
Nenhuma arte existe que esgote tantas formas e tão depressa como<br />
a música. Modulações, cadências, progressões de intervalos, sucessões<br />
de harmonias, gastam-se em cinquenta, mais ain<strong>da</strong>, trinta anos, de<br />
tal modo que o compositor engenhoso já as não pode utilizar e vê-se,<br />
sem cessar, compelido à invenção de novos rasgos puramente musicais.<br />
De um grande número de composições, que se elevam muito<br />
acima do nível corrente do seu tempo, pode dizer-se, sem incorrer em<br />
erro, que foram uma vez belas. A fantasia do artista brilhante, entre<br />
as relações primitivas e misteriosas dos elementos musicais e <strong>da</strong>s suas<br />
infinitas combinações possíveis, descobrirá as mais delica<strong>da</strong>s e recônditas,<br />
construirá formas sonoras inventa<strong>da</strong>s pelo mais livre arbítrio que,<br />
no entanto, parecerão uni<strong>da</strong>s com a necessi<strong>da</strong>de mediante um vínculo<br />
invisivelmente fino. A tais obras, ou a pormenores seus, chamaremos<br />
sem hesitação “engenhosas”. Assim se rectifica facilmente a opinião<br />
equívoca de Oulibicheff, segundo a qual uma música instrumental não<br />
poderia ser engenhosa, porque “o espírito existiria <strong>para</strong> o compositor<br />
única e exclusivamente em certa aplicação <strong>da</strong> sua música a um programa<br />
directo ou indirecto”. De acordo com a nossa perspectiva, seria<br />
inteiramente correcto denominar traço engenhoso o ré sustenido no<br />
Alegro <strong>da</strong> abertura de D. Juan, ou a passagem em uníssono descendente<br />
— mas o primeiro nunca representou (como opina Oulibicheff) “a posição<br />
hostil de D. Juan <strong>para</strong> com o género humano”, nem o segundo, os<br />
pais, esposos, irmãos e amantes <strong>da</strong>s mulheres seduzi<strong>da</strong>s por D. Juan.<br />
Se to<strong>da</strong>s estas interpretações são em si más, são-no duplamente no caso<br />
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