Número 8 - Janeiro 2006 - Faap
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argumentos humanitários também são difíceis de manter ante os destinatários<br />
mais heterogêneos e a aparição de algumas economias emergentes que já não<br />
respondem à imagem tradicional do subdesenvolvimento.<br />
Por outro lado, o processo de globalização modificou substancialmente as<br />
condições de acesso ao capital de investimento e o papel dos atores privados –<br />
em especial das empresas transnacionais e do Investimento Estrangeiro Direto<br />
(IED) – é muito maior, razão pela qual diminui a importância da ajuda oficial<br />
no financiamento do desenvolvimento. Também parece evidente que o<br />
desenvolvimento do Sul depende em maior medida de variáveis como o acesso<br />
aos mercados e à tecnologia, o alívio da dívida, as políticas internas e em particular<br />
o chamado “bom governo”. Além do mais, a noção de desenvolvimento, que<br />
nunca teve um significado unívoco do ponto de vista das políticas de cooperação,<br />
e o mesmo conceito de solidariedade internacional têm sofrido nas duas últimas<br />
décadas uma nova enxurrada de críticas e reformulações. Têm aparecido conceitos<br />
tão sugestivos como o “desenvolvimento humano e sustentável”, o<br />
“empowerment”, os problemas da igualdade entre os sexos, a criação de<br />
instituições e o papel da sociedade civil e o chamado “capital social” que se<br />
vêem como enfoques novos. Porém, ao mesmo tempo, as críticas, apresentadas<br />
desde posições tão diversas e díspares como o neoliberalismo, o relativismo<br />
cultural, os estudos pós-coloniais ou o desconstrutivismo, e em especial a<br />
demolidora crítica da escola do “pós-desenvolvimento”, têm contribuído para<br />
deslegitimar ainda mais a mesma idéia do desenvolvimento e sua potencial ação<br />
mobilizadora e emancipadora perante as políticas de ajuda e cooperação.<br />
Também no momento atual está em questão o marco institucional e os<br />
instrumentos de ajuda. A globalização reduz as capacidades do governo de<br />
Estado-nação, colocando em questão elementos essenciais do mesmo, como a<br />
soberania nacional, limitando as possibilidades e o alcance das políticas exteriores<br />
estatais. Ao mesmo tempo, emergem novos atores privados ou alguns, já<br />
existentes, aparecem com um poder, uma mobilidade e uma capacidade de sortear<br />
a regulação pública muito maior. Em direta relação com estes fenômenos, surgem<br />
novas demandas globais de governança e cooperação que apenas podem satisfazer<br />
os mecanismos tradicionais de cooperação interestatal e as organizações<br />
internacionais clássicas, dada sua limitada competência e sua natureza subsidiária<br />
com respeito aos Estados que as compõem. Estas insuficiências também afetam<br />
a ajuda, que costuma estar concebida e desenhada como instrumento da política<br />
exterior, e que como tal está subordinada aos interesses nacionais do país doador.<br />
Como revela a prática estatal, utilizar o próprio interesse como guia orientadora<br />
da ação exterior, incluindo a ajuda ao desenvolvimento, pode ser<br />
contraproducente em um mundo caracterizado por maiores níveis de<br />
interdependência e por problemas globais, que são muito difíceis, ou impossíveis,<br />
de enfrentar sem uma ação coletiva guiada por critérios cooperativos. Isto é<br />
especialmente certo quando as instâncias responsáveis da ação exterior do Estado<br />
adotam uma definição do interesse nacional unilateral, restritiva e, em suma, de<br />
curto prazo. Também ocorre assim quando é necessário fornecer os “bens<br />
públicos globais” sem os quais é difícil imaginar um processo de desenvolvimento<br />
12 Revista de Economia & Relações Internacionais, vol.5(8), jan.<strong>2006</strong>