— Senhor, quem vos contou? — inquirira Thom<strong>as</strong>.Antes de poder evitá-lo, o olhar de La Valette dirigira-se qu<strong>as</strong>e que porinstinto para os outros jovens cavaleiros que praticavam movimentos deataque contra bonecos de madeira instala<strong>do</strong>s no pátio <strong>do</strong> forte de St. Ângelo.Thom<strong>as</strong> tinha espreita<strong>do</strong> por trás dele e avistara Oliver Stokely, queos observava. Quan<strong>do</strong> os seus olhares se tinham cruza<strong>do</strong>, Stokely voltara adar atenção ao boneco que tinha esta<strong>do</strong> a atacar, pinta<strong>do</strong> de forma a <strong>as</strong>semelhar-sea um turco, completo com uma face de traços cruéis, tez escurae olhos negros.O delator fora portanto aquele homem, que sempre considerara umamigo, concluíra Thom<strong>as</strong>. A surpresa não fora grande, ainda <strong>as</strong>sim. A amizadeentre os <strong>do</strong>is arrefecera n<strong>as</strong> seman<strong>as</strong> p<strong>as</strong>sad<strong>as</strong> desde o regresso da galeraa Malta, à medida que se tornara evidente que a mulher que tinham liberta<strong>do</strong>preferia a companhia de Thom<strong>as</strong>. Tinha-se mostra<strong>do</strong> sempre gratae amigável com Stokely, m<strong>as</strong> <strong>as</strong> su<strong>as</strong> feições iluminavam-se na presença deThom<strong>as</strong>, e fora a ele que pedira que a acompanh<strong>as</strong>se em p<strong>as</strong>seios, primeiropor Birgu e depois pelos campos em re<strong>do</strong>r.Fora aí que tu<strong>do</strong> se p<strong>as</strong>sara, recordara Thom<strong>as</strong>, enquanto o seu pulsoacelerara. À sombra de uma d<strong>as</strong> rar<strong>as</strong> árvores da ilha, no alto de Sta. Margarida,de onde se tinha uma bela vista sobre Birgu e o porto. Ao tropeçar,ela tinha-se encosta<strong>do</strong> a ele, e a testa dela r<strong>as</strong>para-lhe na face quan<strong>do</strong> elelhe segurara o braço, para impedir que ela caísse. Maria olhara para cima,sorrira, e tinham-se beija<strong>do</strong>. Fora um ato instintivo, e Thom<strong>as</strong> sentira-sechoca<strong>do</strong> perante aquele seu gesto impulsivo, até que ela pusera a mão portrás <strong>do</strong> pescoço <strong>do</strong> jovem e o puxara para ela, para um novo beijo. Tinhamprocura<strong>do</strong> um canto escondi<strong>do</strong> no meio d<strong>as</strong> muralh<strong>as</strong>, onde Thom<strong>as</strong> lançaraa sua capa pelo solo, e ali tinham p<strong>as</strong>sa<strong>do</strong> o resto da tarde, antes deregressarem a Birgu ainda afoguea<strong>do</strong>s de paixão e trepidantes. Era uma ligaçãoperigosa, e ambos o sabiam. M<strong>as</strong> nada podiam e nada fariam paracontrariar o calor que lhes corria pel<strong>as</strong> vei<strong>as</strong>.Isso sucedera vários di<strong>as</strong> antes <strong>do</strong> aviso de La Valette. Di<strong>as</strong> em queThom<strong>as</strong> sofrera <strong>as</strong> pen<strong>as</strong> <strong>do</strong>s seus deveres quotidianos como se fossemuma eternidade no purgatório. Depois corria para se encontrar com elano local combina<strong>do</strong>, um pequeno jardim junto aos portões da cidade.Fora em tempos pertença de um merca<strong>do</strong>r veneziano, que o legara aosilhéus. O jardim fornecia aos visitantes sombr<strong>as</strong> e a <strong>do</strong>ce fragrância d<strong>as</strong>flores e d<strong>as</strong> erv<strong>as</strong>. Não havia em toda a ilha local mais propício para umencontro de amantes. E era lá que estavam, à sombra de uns arbustos,quan<strong>do</strong> Stokely surgira e parara a pé firme no caminho, sob o brilho inclemente<strong>do</strong> Sol. Fitara-os em silêncio enquanto os <strong>do</strong>is se af<strong>as</strong>tavam um<strong>do</strong> outro, surpresos. A cicatriz no rosto de Stokely ainda estava lívida,40
e a pele esticada ao canto da boca desenhava-lhe um ar de permanenteescárnio.— Oliver. — Maria sorrira. — Assust<strong>as</strong>tes-nos.— Isso vejo eu — ripostara ele, friamente. — É portanto para aqui quetendes fugi<strong>do</strong> a correr, Thom<strong>as</strong>.Thom<strong>as</strong> levantara-se <strong>do</strong> banco que tinha partilha<strong>do</strong> com Maria.— Escutai, este é o nosso segre<strong>do</strong>. Gostaria de vos pedir que não ocontásseis a ninguém.— Pedi à vontade, maldito — retorquira Stokely, furibun<strong>do</strong>. — Isto nãoestá certo. Thom<strong>as</strong>, fizestes um voto de c<strong>as</strong>tidade. Como to<strong>do</strong>s os cavaleiros.Thom<strong>as</strong> fungara com desprezo.— Esse voto não tem senti<strong>do</strong>. Mais atenção lhe é dada na fuga <strong>do</strong> quena obrigação, como bem sabeis. O Grão-Mestre d’Omedes não se importanada de fechar os olhos, quan<strong>do</strong> lhe convém.— Ainda <strong>as</strong>sim, é um voto. O meu dever é relatar isto.Os <strong>do</strong>is tinham-se confronta<strong>do</strong>, e Thom<strong>as</strong> ficara espanta<strong>do</strong> ao descobrira cólera e mesmo o ódio que ardia nos olhos <strong>do</strong> amigo.— Oliver, não podeis fazer isso. Se não pela nossa amizade, então porcavalheirismo para com Maria.— Não me dais lições de cavalheirismo! — cuspira Stokely. Thom<strong>as</strong>rangera os dentes e cerrara os lábios, enquanto <strong>as</strong> mãos se tinham fecha<strong>do</strong>em punhos. M<strong>as</strong> antes que o confronto se tivesse torna<strong>do</strong> mais sério, sentiraque Maria lhe puxava gentilmente o braço. Ela colocara-se entre os <strong>do</strong>ise sorrira nervosamente a Stokely.— Não há necessidade disto. Sobretu<strong>do</strong> entre amigos.— Não vejo aqui quaisquer amigos meus — respondera Stokely, numavoz esforçada.Maria franzira o sobrolho.— Oliver, considero-vos um amigo, e tereis para sempre a minha sinceragratidão por me salvardes <strong>do</strong>s turcos, tal como sucede com o Thom<strong>as</strong>.— E é <strong>as</strong>sim que um amigo mostra a sua gratidão?— Não vos zangueis comigo. — Ela tentara pegar-lhe na mão, m<strong>as</strong>Stokely dera um brusco p<strong>as</strong>so atrás. Maria soltara um pequeno grito. —Oliver… É <strong>do</strong> mais fun<strong>do</strong> <strong>do</strong> meu coração que vos falo quan<strong>do</strong> vos chamomeu amigo. Meu queri<strong>do</strong> amigo.— Então porque traís desta forma a minha amizade? Como fazeis os<strong>do</strong>is, aliás.— De que forma vos traí? Alguma vez vos menti? — lançara ela.Quan<strong>do</strong> ele não respondera, ela baixara a cabeça, contristada.— Considerava-vos meu benfeitor e amigo, como considero o Tho-41
- Page 1: A presente obra respeita as regrasd
- Page 5 and 6: da mente. Se La Valette tivesse sid
- Page 7 and 8: ordens a serem transmitidas, e um g
- Page 9 and 10: — Sim, senhor — esclareceu Thom
- Page 11 and 12: Um estrondo soou de repente, e Thom
- Page 13 and 14: to, e ouviu-se um estalo quando uma
- Page 15 and 16: Um movimento atraiu-lhe o olhar, pe
- Page 17 and 18: equipagem de um dos canhões. Thoma
- Page 19 and 20: avançou, atacando o pique e fazend
- Page 21 and 22: tendão dos seus braços, continuou
- Page 23 and 24: Thomas anuiu.— Senhor, compreendo
- Page 25 and 26: Alguns limitaram-se a tombar e chor
- Page 27 and 28: sentado no convés. Thomas contempl
- Page 29 and 30: Stokely espreitou para a escotilha.
- Page 31: 5Malta, dois meses depoisOcrescente
- Page 35 and 36: Uma mudança de ideias, ou outra ca
- Page 37 and 38: desespero e angústia enquanto as t
- Page 39 and 40: — Pergunto-me se será esse o cas
- Page 41 and 42: — Como vos atreveis? — lançou
- Page 43 and 44: leveza. Tinha já alguns traços de
- Page 45 and 46: De tempos a tempos alguns amigos do
- Page 47 and 48: John resmungou, mas sabia perfeitam
- Page 49 and 50: abrir o fecho. Procurou no interior
- Page 51 and 52: citar-lhe detalhes que a prudência
- Page 53 and 54: tre ouviram-no dos lábios do próp
- Page 55 and 56: para o silenciar, e depois de uma b
- Page 57 and 58: — Homem, o teu senhor está? Avis
- Page 59 and 60: 9LondresAescuridão crescia à medi
- Page 61 and 62: a percorrer. A coluna desordenada d
- Page 63 and 64: — Hidromel? — As sobrancelhas d
- Page 65 and 66: — Ao que vejo. Chegastes a Londre
- Page 67 and 68: 10Portanto, e tal como suspeitara j
- Page 69 and 70: mundo está repleto de pecadores qu
- Page 71 and 72: haveis criticado Sir Robert e a mim
- Page 73 and 74: — Sim — admitiu Cecil, sem hesi
- Page 75 and 76: terá de se tornar a tua segunda na
- Page 77 and 78: vento que se levantava em rajadas.
- Page 79 and 80: esponder não apenas ao seu rei, ma
- Page 81 and 82: — Não. Do que sei de vós, Sir T
- Page 83 and 84:
nhecer melhor o jovem. Sabia bem, p
- Page 85 and 86:
12Ocaminho pelo Norte de Espanha pa
- Page 87 and 88:
coluna e chegar antes dela ao port
- Page 89 and 90:
de gaivotas, pontos negros contra o
- Page 91 and 92:
— Glória, pois, é para isso que
- Page 93 and 94:
quenta e muitos anos. O cabelo era
- Page 95 and 96:
mou as outras potências europeias
- Page 97 and 98:
13Aflotilha tinha deixado o porto d
- Page 99 and 100:
chard assentiu e apressou-se a desc
- Page 101 and 102:
elmo. Richard usava um modelo comum
- Page 103 and 104:
ferro penetrou no casco da galera e