Ciências Humanas1 O golpe civil-militar de 1964e as mudanças na sociedade102Uniram-se então a espada, a cruz e o vil metal– as botas e as batinas e as moedas, numapoderosa coalizão: homens de alta qualidadee delinqüentes de toda laia, cidadãos acimade qualquer suspeita e personagens objetosde todas as suspeitas; os incapazes e oscapazes de tudo; democratas genealógicose candidatos a ditadores; liberais e fascistas,militares, políticos, homens de negócio,profissionais liberais. E em nome da Lei, doCristo, da Ordem, da Família, da Democraciae da Honestidade essa multidão heteróclita,numa frente ampla, diversa e contraditória,deu o golpe. (REIS FILHO, 1960, p. 437).A denominação aqui adotada, de golpe civil-militarde 1964, busca ressaltar a participação dos civis naditadura que se seguiu ao movimento. Para o historiador,uma das questões recorrentes é buscar diferenciarseu trabalho da memória. Nesse sentido, as expressõesconsagradas “golpe militar” e “ditadura militar” mascaramo fato de que os militares não teriam ascendidoao poder e lá ficado por tanto tempo não fosse a defesados interesses dos grandes grupos econômicos nacionaise multinacionais. A memória construída em tornodo evento, que salienta a participação dos militares e“esquece” a participação dos civis, precisa ser revista edebatida.Os desdobramentos desse período na sociedadeatual estão muito presentes, notadamente no campo daeducação, nosso objeto de análise. O modelo desenhadoa partir de então foi o que prevaleceu em relação aoensino e isso marcou a vivência de todos que passarampela escola, especialmente dos anos 1970 em diante.Fernando Novais e João Manuel Cardoso de Mello,ao se referirem a 1964, mostram que o “capitalismo dosvencedores”, que predominou a partir daí, representaa imposição de um modelo ante as duas possibilidadesexistentes na sociedade brasileira: um deles seriaum capitalismo humanizado, marcado pelos valoresmodernos da sociedade 1 ; o outro, o vencedor, acentuariaas desigualdades:1 Para os autores, os valores modernos emergem “[…] de um lado, daReforma protestante e da Igreja católica, e, de outro, do racionalismoilustrado especialmente nas suas vertentes radicais. Pensamos,sobretudo, de um lado, no valor do trabalho como um fim em si mesmo,do respeito pelo próprio corpo, da família fundada no companheirismoe na educação dos filhos, da moral sexual rigorista; e, de outro, novalor da autonomia, dos direitos do cidadão, da igualdade real, daeducação republicana, do desenvolvimento espiritual, da criatividadee da autenticidade. […] são os valores modernos não mercantis, nãocapitalistas que, corporificados em instituições (a democracia demassas, a escola republicana, as igrejas, a família cristã etc.), põemA “Revolução de 64”, ao banir, pela violência,as forças do igualitarismo e dademocracia, produziu, ao longo de seus 21anos de vigência, uma sociedade deformadae plutocrática, isto é, regida pelos detentoresda riqueza. No final do período de crescimentoeconômico rápido, em 1980, asrelações concretas entre as classes sociaisguardavam uma semelhança apenas formalcom aquelas observadas nos paísesdesenvolvidos. As desigualdades relativasem termos de renda e de riqueza eram muitíssimomaiores no Brasil.(Novais; Mello,1998, p. 618).Essa deformação da renda na sociedade vaimanifestar-se na educação. Há, segundo os autores,uma chegada dos filhos dos trabalhadores à escola,e de forma massiva. No entanto, à ampliação da redede escolas públicas não correspondeu a manutençãode um padrão de ensino, e ela passa a oferecer umaeducação de péssima qualidade, que acaba por gerarevasão e repetência; de outro lado, as classes médiaslevam seus filhos para os colégios particulares, que vãocrescer no período. Em outras palavras, universalizaseum ensino esvaziado, que não rompe com a nossahistórica desigualdade social e dualidade de ensino.Os valores que são passados nessa escolarização tambémsão marcados por essa nova cultura de massas:como as vozes discordantes foram caladas pela ditadura,o modelo de ensino perpetua a dominação dosricos sobre os pobres por meio da indústria cultural,baseada no modelo americano.Essa falta de diálogo, de confronto de idéias, essedeclínio do espaço público, enfim, também se fez presentena educação, o que, da mesma forma, deixou dese pautar pelos conteúdos humanistas, por uma posturamais aberta e franca, para se atrelar aos modelosprofissionalizantes e privilegiar os saberes técnicos emdetrimento de uma cultura mais universalista. Essamudança de perspectiva na educação transparece noperíodo e foi a forma utilizada para educar diversascrianças e jovens. Assim, de alguma forma, as geraçõesatuais são tributárias desde modelo escolar.2 A educação brasileiranos anos 1960/70Os anos 1960, na educação, foram marcados no seuinício pela promulgação da primeira Lei de Diretrizese Bases da Educação (1961), após um longo período defreios ao funcionamento desregulado e socialmente destrutivo docapitalismo.” (Novais; Mello, 1998, p. 607).III Seminário Nacional de Pesquisa, 2009.
Ciências Humanasdebates no Congresso Nacional. O documento aprovadogarantia o interesse dos grupos privados na educação eque atuavam lado a lado com o setor público.A legislação de 1961 consagra a ajuda financeiraao setor particular não só na forma de bolsas, mas tambémde financiamentos a serem utilizados para compra,reforma e construção de prédios escolares (cf. Art. 95).Para Romanelli (2002), isso é inaceitável, uma vez que osrecursos existentes já eram insuficientes para manter eampliar a rede de ensino. (p. 182-183).A legislação de 1961 ainda previa a obrigatoriedadedo ensino primário no seu artigo 27, mas este setornava nulo pelo parágrafo 30, que previa que a obrigatoriedadenão se aplicava aos casos de “comprovadoestado de pobreza dos pais ou responsáveis, insuficiênciade escolas, matrículas encerradas ou doenças eanomalias grave da criança”. Aqui se vê que o avançorepresentado pela obrigatoriedade do ensino é anuladopelas próprias exceções previstas na lei. Mais doque isso, a insuficiência de escolas justifica a não matrículadas crianças, o que nos remete de novo ao temalevantado: se faltam escolas, por que investir dinheiropúblico na iniciativa privada?Bárbara Freitag (1979) apresenta um quadro aindamais trágico para o período. Segundo ela, “o direito e odever” da educação não se concretizavam porque a seletividadeoperava antes, na falta de escolas, tanto que, noperíodo estudado, apenas 4/5 das crianças conseguiammatrícula. Depois disso, as poucas que entravam entrareram excluídas ao longo do processo:De 1000 crianças que em 1960 ingressaramno primeiro ano primário, somente 466 atingirama segunda série primária. Na quartasérie ainda restavam 239. Dessas, somente152 ingressaram em 1964 no ensino ginasial,91 alcançaram a quarta série e 84 o últimoano do colégio. Dos 1000 alunos iniciaisde 1960, somente 56 conseguiram alcançaro primeiro ano universitário em 1973.[…] Esta alta seletividade do sistema nãoé produzida pela severidade dos critériosde avaliação dos alunos. Muitas criançasabandonam a escola antes de prestar osexames de fim de ano. As dificuldades queas crianças encontram na escola se deviam,por um lado, a currículos inadequados,professores mal qualificados, equipamentodeficiente, etc., por outro lado, como apontoudetalhadamente o censo escolar de 64,à distância de casa à escola, falta de transporte,necessidade de trabalho das criançaspara o sustento da família, falta de roupas,material de trabalho, má alimentação, etc.(FREITAG, 1979, p. 58-59).É certo considerar então que, se a legislação nãoé capaz de alterar a realidade, ela tem o poder de suscitarquestões que não se resolverão em decorrênciadas condições existentes na sociedade. No caso daobrigatoriedade/direito/dever da educação, a emendaà Constituição de 1969, já na ditadura civil-militar, foiainda mais longe e estendeu a obrigatoriedade dos 7aos 14 anos. Se considerarmos que a lei 5692/71, editadadois anos depois, acabou com a diferença entre primárioe ginásio, com um exame de admissão no meio, eunificou tudo como 1 o grau, a escolaridadevai-se estender por toda essa sequência. O que asestatísticas vão mostrar é que gradativamente a populaçãoescolar cresce, ainda que em menor ritmo do queo previsto. O problema da exclusão e da seletividade,contudo, não será resolvido nessa década, e isso estavapresente nas reflexões dos grupos de trabalho que elaboraramas reformas de ensino no fim dos anos 1960 e1970 e nas próprias leis aprovadas.Há duas questões no panorama educacional dosanos 1960 que preocupam as autoridades e que serãotratadas nas reformas educacionais do ensino superiore da escola básica: os “excedentes” dos vestibulares,que obtinham nota para aprovação mas não logravamingressar no ensino superior por falta de vagas, e asuposta falta de profissionais técnicos de nível médio.O que se procurou, então, foi a profissionalização noensino médio, denominado de 2 o grau, que seria umaforma de conter os excedentes e de resolver a questãoda mão de obra.Em um estudo que se tornou clássico, chamado“Política educacional: contenção e liberação”, LuizAntonio Cunha discute esses temas (CUNHA, 1988).Para ele, a questão da contenção refere-se ao ensinosuperior e médio. O que se procura é, por meio da profissionalização,criar alternativas que façam com que osjovens não busquem o ensino superior. Isso seria umarecomendação tanto do Grupo de Trabalho que discutiua reforma universitária, em 1968, quanto da agêncianorte-americana USAID, 2 que avaliara esse tema. Areforma do ensino superior busca, assim, uma racionalizaçãodo sistema, como forma de garantir que tal2 Os acordos entre o Ministério da Educação e Cultura (Brasil) e aAgency for International Development (AID), conhecidos como MEC-USAID, ocorrem entre 1964 e 1968 e se caracterizam pela prestaçãode assessoria e auxílio a quadros intermediários da burocraciaeducacional. De acordo com Otaíza Romanelli, os objetivos práticosda AID seriam: “1. estabelecer uma relação de eficácia entre recursosaplicados e produtividade do sistema escolar; 2. atuar sobre o processoescolar em nível de microssistema, no sentido de se ‘melhorarem’conteúdos, métodos e técnicas de ensino; 3. atuar diretamente sobre asinstituições escolares, no sentido de conseguir delas uma ‘função maiseficaz para o desenvolvimento’; 4. modernizar os meios de comunicaçãode massas, com vistas à melhoria da ‘informação nos domínios daeducação extra-escolar’; reforçar o ensino superior, ‘com vistas aodesenvolvimento nacional’” (2002, p. 210). Essas ideias aparecerão emvários momentos nas reformas do ensino superior e da escola básica,especialmente a de racionalização e eficiência, tal como demonstra aterceira epígrafe deste título, e a própria ideia da educação como umcompartimento da sociedade, que pode se desenvolver a despeito denão haver mudanças nesta.III Seminário Nacional de Pesquisa, 2009. 103
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