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pesque-pague - Uninove

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Ciências Humanas1 IntroduçãoA partida de futebol transcorre sem grandesproblemas. De repente, quase “por brincadeira”, umatleta cai em campo. Por trinta segundos, ninguémse apercebe das dimensões do problema: logo, umcompanheiro grita desesperadamente. Correria e apreensão.As torcidas silenciam. Em campo, jogadores,comissões técnicas, árbitro e auxiliares dão as mãos,pedindo uma intervenção divina. Moribundo, o atletamorre pouco depois de dar entrada em uma UTI. Essa,de forma singela, é a descrição da morte de PauloSérgio da Silva, conhecido como Serginho, jogador doSão Caetano, que tinha 30 anos e participava de umapartida contra a equipe do São Paulo pelo CampeonatoBrasileiro de 2004.O fato ocorreu no dia 27 de outubro, poucos diasantes de outra situação dramática ligada a um jogadorde futebol: o sequestro de Marina Souza da Silva, mãedo jogador Robinho, hoje atleta do Manchester City, daInglaterra, mas que, na época, atuava no Santos FutebolClube. O craque, que tinha propostas para se transferirao futebol europeu, tomou um cruel “carrinho” da vidaque, como dizemos na gíria, “quebrou-lhe as pernas”.As situações descritas são um indício importante;poderiam ocorrer, sem dúvida, em outros contextos,com pessoas de outros segmentos profissionais. Nofutebol, porém, parecem denotar algo diferente: noprimeiro caso, um jogador com conhecido potencialde risco cardíaco opta por continuar correndo atrás dabola, tentando driblar o próprio coração; no segundo,um garoto talentoso foge da pobreza fazendo “diabruras”em campo; é um vencedor – alguém que “assumiuo risco de ser grande” – que não consegue escapar daviolenta “marcação” da sociedade brasileira.Os dois casos são emblemáticos do risco extremoassumido por uma categoria profissional cujos integrantesse assemelham, simbolicamente, aos gladiadoresromanos. “Vencer, vencer, vencer, uma vez Flamengo,Flamengo até morrer…”, sentencia o refrão do hino deum dos mais importantes clubes de futebol do Brasil;é a nota perfeita daquilo a que estamos nos referindo.Nesse percurso, observamos que o futebol profissionalé, provavelmente, o espetáculo mais querido pelohomem em todos os tempos; aproxima-se do “sagrado”,cria deuses e demônios, arremessa anjos do céu para,em seguida, resgatá-los do inferno. Por conta disso éuma verdadeira “panela de pressão”, cujo conteúdoprincipal é o risco. A propósito dessa questão, CésarSampaio, ex-atleta e atualmente dirigente esportivo, emuma entrevista, comparou a reta final de um campeonatoà “lei da selva”: “Quando amanhece na floresta écorreria geral. O leão corre para comer (seriam os timesque almejam algo); o veadinho foge para não ser comido112(lembra a luta contra o rebaixamento)”. 1 Para ele, riscoexiste em todos os lugares: “Risco há onde quer que apessoa esteja. Nossa vida está nas mãos de Deus”. 2Concordamos com a opinião de César Sampaio deque riscos há em qualquer lugar, mas no futebol profissionaleles são maiores, vão muito além de uma reta finalde campeonato, seja ele qual for. A saber, para ingressarnesse esporte, é preciso assumir o próprio instinto desobrevivência, alimentá-lo com velocidade, visão periféricae malandragem; caso contrário, seguir por essasenda será algo muito difícil. Além dos riscos ambientais(torcida, imprensa, fatores físico, técnico, tático e emocional,entre outros), os “gladiadores” estarão expostos aosmesmos riscos sociais da maioria da população (falta deescolaridade, empregos precários, exclusão social, entreoutros), se suas carreiras não “decolarem”.Aliás, não é necessário abrir muito o “leque” paraperceber os riscos inseridos na sociedade e no esporte,mas o futebol registra várias histórias de atletas quetiveram problemas de saúde – ou com bebida, drogas,desentendimentos em família etc. –, mas que puderamcontinuar sua carreira após tratamento adequado.Podemos citar Washington, atualmente atleta do SãoPaulo Futebol Clube, que teve problema de coração, foisubmetido a uma angioplastia, voltou a jogar futebol ea fazer gols – para jogar, teve de assinar um termo decompromisso assumindo riscos. O nigeriano Kanu tambémpassou por problema coronariano e, com o devidoacompanhamento, pôde prosseguir em sua carreira(LEITE, 2004). Outros não tiveram a mesma sorte; enenhum caso se compara ao de Serginho, que nos permitefazer uma leitura interessante.Lembramos que era um jogo entre dois times batizadoscom nomes de santos: São Paulo x São Caetano,traço religioso comum no Brasil e que não deixa de serassociado a um jogo milagroso. No caso desta partida,porém, o milagre parece ter ficado no vestiário ou, então,ter sido expresso por meio dos “misteriosos caminhos doSenhor” (a fatalidade parece ter chamado a atenção daopinião pública para o potencial risco de vida em campo,o que talvez permita salvar outras vidas no futuro pormeio de reforço do apoio em atendimento médico deemergência). Outro “milagre”, sem dúvida, foi a uniãodas torcidas, perplexas diante de um fato que não escolhetime ou pessoa (lembrando uma imagem popular,podemos dizer que a morte se veste de negro, cor queestá sendo abandonada até pelos “famigerados” árbitros).Retomando a tragédia, não importa se a morte foiacidental, se havia sido “escrita por Deus”, se o atendimentofoi adequado ou não, se houve falhas na avaliaçãomédica ou se o uso do desfibrilador teria revertido aparada cardiorrespiratória. São relevantes, sim, algu-1 Cf. HECICO, F. Sampaio elogia: “São Paulo tem volantes para 10anos”. O Estado de São Paulo. 15 de outubro de 2004. E2.2 Ibid.III Seminário Nacional de Pesquisa, 2009.

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