Trabalho e saúde mental dos profissionais da saúde
Trabalho_e_saude_mental_dos_profissionais_da_saude
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tempo impostos; o sofrimento proveniente <strong>da</strong> repetição contínua e do aborrecimento;<br />
o receio <strong>da</strong> dominação e <strong>da</strong> autori<strong>da</strong>de exerci<strong>da</strong>s pela hierarquia,<br />
entre tantos outros.<br />
Dessa maneira, pode-se inferir que não são as estruturas psíquicas individuais<br />
que estão mais frágeis do que outrora, mas é a erosão <strong>da</strong>s estratégias coletivas<br />
de defesa que constitui uma per<strong>da</strong> considerável de recursos para a <strong>saúde</strong><br />
do trabalhador. Afinal, a proteção <strong>da</strong> <strong>saúde</strong> <strong>mental</strong> não depende apenas do<br />
talento de ca<strong>da</strong> indivíduo, por meio de suas defesas maleáveis e eficientes; essa<br />
proteção passa também por estratégias coletivas de defesa, que visam garantir<br />
resistência aos efeitos psiquicamente desestabilizadores do trabalho.<br />
Aproveitando-se do pensamento difundido por Hannah Arendt em seu<br />
livro As origens do totalitarismo, pode-se intuir que as novas patologias relaciona<strong>da</strong>s<br />
ao trabalho são, antes, patologias <strong>da</strong> solidão. O assédio moral, por<br />
exemplo, não pode ser considerado uma questão nova, afinal, sempre houve<br />
a perseguição aos trabalhadores subordina<strong>dos</strong>. O que tem mu<strong>da</strong>do é como se<br />
reage diante destas perseguições, pois ca<strong>da</strong> vez menos há soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong>de. A solidão<br />
e o abandono fazem crescer demasia<strong>da</strong>mente as patologias decorrentes do<br />
trabalho, pois se torna psicologicamente muito mais difícil suportar a injustiça<br />
do que quando se pode contar com a cumplici<strong>da</strong>de <strong>dos</strong> colegas.<br />
Entender a influência <strong>da</strong> organização do trabalho na quali<strong>da</strong>de de vi<strong>da</strong>,<br />
na <strong>saúde</strong> <strong>mental</strong>, na geração de sofrimento psíquico, no desgaste e no adoecimento<br />
<strong>dos</strong> trabalhadores é de fun<strong>da</strong><strong>mental</strong> importância não somente para a<br />
compreensão e para a intervenção em situações de trabalho que possam acarretar<br />
diversas formas de sofrimento, mas para a superação e a transformação<br />
dessas organizações. 16<br />
6 A <strong>saúde</strong> <strong>mental</strong> do médico jovem<br />
Início <strong>da</strong> prática profissional e vulnerabili<strong>da</strong>de psíquica do médico jovem<br />
Há no inconsciente coletivo <strong>da</strong> população médica a expectativa de que o<br />
profissional de <strong>saúde</strong> seja psiquicamente inabalável. Qualquer sinal de fraquejo<br />
pode sugerir a fragili<strong>da</strong>de de acesso aos recursos necessários para o adequado<br />
tratamento de seus clientes. Buscando romper com essa crença, Carl Gustav<br />
Jung, psiquiatra do início do século XX, descreve o conceito do arquétipo do<br />
curador ferido na busca de explicações para o mistério <strong>da</strong> cura. Apropria-se<br />
do mito de Esculápio – o paradigma do médico ferido – e Quíron, para desenvolver<br />
a ideia paradoxal de que para que o tratamento de fato aconteça, o<br />
curador acabará permanecendo doente ou ferido. 17 De posse desse paradigma<br />
e com o seu desenvolvimento por sucessivos outros autores, torna-se atualmente<br />
bastante relativiza<strong>da</strong> a concepção <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de de impermeabili<strong>da</strong>de<br />
psíquica do médico como atributo fun<strong>da</strong><strong>mental</strong> para a prática médica, ain<strong>da</strong><br />
que alguns <strong>profissionais</strong> teimem em sustentá-la.<br />
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