vera dantas guerrilha tecnológica - MCI
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Além do SNI, também no Ministério das Relações Exteriores cresciam as<br />
peocupações quanto à integridade e segurança dos sistemas de informação. A falta de<br />
segurança nas ligações com as representações diplomáticas no exterior era tal que,<br />
muitas vezes, parceiros comerciais do Brasil tinham acesso ao conteúdo de algumas<br />
mensagens antes das próprias autoridades brasileiras. Uma situação tão alarmante<br />
que, sobre ela, já se falava abertamente nos corredores do ministério. Daí chegou<br />
ao conhecimento de um grupo de pesquisadores do Laboratório de Instrumentação<br />
Científica da Universidade de Brasília, através de um aluno do curso de engenharia<br />
que estagiava no Itamaraty, cuidando justamente da manutenção de suas máquinas<br />
telegráficas e criptográficas. Os professores Katuchi Techima – chefe do<br />
Laboratório e antigo colega de Cláudio Mammana e Sílvio Paciornick no ITA e no<br />
Instituto de Física da USP, Paulo César Bezerra, Paulo Esteves e Ademar Aragão<br />
decidiram tentar resolvê-lo. Estavam dispostos a desenvolver um sistema de alta<br />
confiabilidade.<br />
Era um projeto novo e desafiador. Em vez de emular uma máquina já existente,<br />
como - sem que eles soubessem — faziam os engenheiros da Esni, o grupo da UnB<br />
decidiu se concentrar no software. Eles concluíram ser impossível chegar a um<br />
resultado que garantisse segurança máxima ao processo de cifração: nenhum país do<br />
mundo conseguira tal feito e até mesmo o padrão criptográfico norte-americano era<br />
vulnerável, como já o haviam provado alguns estudos. Logo, a única chance de o<br />
Brasil sentir-se seguro seria definindo o seu próprio algoritmo de cifração - sobre<br />
o qual poderia modificar constantemente os programas - ao invés de obtê-lo de<br />
terceiros.<br />
Foi quando chegou à chefia do Departamento de Comunicações e Documentação do<br />
Itamaraty o embaixador Cotrim. Dinâmico e bastante interessado por tudo o que se<br />
relacionasse à tecnologia, Cotrim decidira dotar o ministério de uma rede de<br />
comunicações eficiente, moderna e, principalmente, confiável. Por isso, tomando<br />
conhecimento do projeto da UnB, resolveu viabilizá-lo. Afinal, raciocinava ele, se<br />
bem-sucedido, o projeto poderia se desdobrar em algo muito mais amplo que a<br />
garantia da segurança das comunicações do Itamaraty. Poderia ser o ponto de partida<br />
para um empreendimento industrial. Homem prático, Cotrim propôs ao grupo da UnB que<br />
se transferisse para o Itamaraty e, lá, desse continuidade ao trabalho, de olho na<br />
possibilidade de se vir a fabricar máquinas criptográficas no país. De arrumar<br />
compradores para essas máquinas, que certamente não seriam poucos, ele se<br />
encarregaria. Em setembro de 1975, Ademar Aragão e Paulo Esteves, à frente de<br />
outros pesquisadores, mudaram de endereço.<br />
Ademar e Paulo trabalharam com entusiasmo. Tinham deixado a Universidade, onde<br />
o marasmo e os escassos recursos faziam com que as coisas demorassem a acontecer, e<br />
entrado para um ambiente completamente diferente: lá não faltavam dinheiro e<br />
dinamismo. O embaixador Cotrim nunca aceitava um "não" como resposta. "Quero<br />
resultados", era a sua afirmação mais freqüente. Uma disposição que o fazia agir<br />
passando por cima de limitações burocráticas, como naquela vez em que Ademar e<br />
Paulo lhe disseram estar com problemas porque o computador do laboratório da UnB —<br />
por eles utilizado para processar grande parte das informações do projeto - sofrera<br />
um defeito e faltavam verbas à Universidade para consertá-lo. Cotrim sequer admitiu<br />
o problema. "Telefonem para a Digital, peçam providências e digam para que mandem a<br />
conta para o Itamaraty", ordenou. Nesse clima, em um ano o projeto ficou pronto. Em<br />
novembro de 1976 - enquanto entre os técnicos do governo e a comunidade acadêmica<br />
crescia a polêmica em torno do /32 da IBM - Cotrim conseguiu que Ademar e Paulo<br />
Esteves o apresentassem a um grupo de oficiais ligados à Presidência da República,<br />
entre os quais Edison Dytz. O trabalho agradou e os pesquisadores receberam sinal<br />
verde para implementar a máquina que, até então, ainda estava no papel.