vera dantas guerrilha tecnológica - MCI
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Arthur chegara recentemente de Paris, onde fez sua pós-graduação em<br />
administração pública. Não só os estudos o levaram à capital francesa: Paris foi a<br />
única opção que lhe restou em 1970, quando o auge da violência da ditadura atingiu<br />
todos os que, na arbitrária ótica dos aparelhos de repressão, pudessem representar<br />
alguma oposição ao regime. Ex-presidente, de 1967 a 1968, do Diretório Acadêmico da<br />
Escola de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas — Ebap —, Arthur, embora<br />
não respondesse a qualquer processo e tampouco estivesse ligado a qualquer<br />
organização política, não duvidava de que precisaria desaparecer, para não se<br />
arriscar a ser desaparecido. Em boa hora, prestou concurso para uma bolsa de<br />
estudos em Paris, com a polícia já no seu encalço. De maio, quando fez as provas,<br />
até julho, quando embarcou, não teve endereço fixo, vivendo semiclandestino. Graças<br />
a tais cuidados, pôde passar dois anos na capital francesa, sobrevivendo de bicos e<br />
de muita malandragem aprendida nos tempos de juventude, vividos no subúrbio carioca<br />
do Rocha.<br />
Certa vez, conseguiu um emprego de porteiro em um pequeno cinema do Quartier<br />
Latin. Um trabalho aparentemente fácil, não fosse um problema: era comum aparecer<br />
por lá um grupo de parrudos negros americanos, carapinhas altas e punhos cerrados à<br />
la black-power, que entravam na sala de projeção na marra, depois de muita<br />
pancadaria e quebra-quebra. Nenhum porteiro durava muito tempo no posto. Sabendo<br />
disso mas precisando do dinheiro, Arthur aceitou o desafio. E não demorou a se<br />
defrontar com os crioulões. Começa o bate-boca, é brother para cá, mái frêndi para<br />
lá, Arthur identifica um que parecia o líder, chama-o em um canto e propõe um<br />
acordo: "Eu também sou um latino-americano explorado, estou garantindo o meu<br />
dinheiro, sei que vocês não querem me prejudicar, vamos fazer o seguinte: deixa<br />
começar a sessão, as luzes se apagarem e entra todo o mundo, sem fazer barulho..."<br />
Camuflados na escuridão, entraram todos e, por um bom tempo, o patrão francês ficou<br />
satisfeito com o brésilien que parecia ter dado um jeito nos créoles.<br />
Enquanto sobrevivia, Arthur aprofundou seus conhecimentos sobre computadores,<br />
aos quais foi apresentado ainda quando estudante, na Ebap. Visitando empresas e<br />
órgãos públicos que estavam implantando seus centros de processamento de dados, não<br />
lhe passou desapercebida a conotação política que os franceses davam ao assunto.<br />
Testemunhou a execução do Plano Cálculo (Plan Calcul), um programa do governo De<br />
Gaulle, destinado a tornar a França menos dependente econômica e tecnologicamente<br />
das multinacionais norte-americanas de processamento de dados, especialmente da<br />
IBM. Mas, nem de longe, imaginava o tanto que os computadores seriam importantes na<br />
sua vida. Quando voltou ao Rio, a informática poderia representar para ele, no<br />
máximo, uma oportunidade para obter um bom emprego.<br />
Ao voltar, a situação política ainda estava difícil. Muitos de seus amigos<br />
tinham sido presos e alguns, desaparecidos. Mas os órgãos de segurança pareciam<br />
ter-se esquecido dele.<br />
Foi trabalhar na Cia. Telefônica do Rio de Janeiro - Telerj -, então<br />
reformulando todo o seu CPD. Trabalhar com informática era agradável, remunerava<br />
muito bem, oferecia um ambiente descontraído. Mas não estava satisfeito. Depois que<br />
o sistema de pessoal que ajudava a desenvolver começasse a rodar, sua perspectiva<br />
seria seguir implantando sistemas de contabilidade, de controle de materiais e<br />
outros que se fizessem necessários. Ou, então, buscar algo mais atraente. Foi assim<br />
que, depois da entrevista com Saur, em maio de 1973, mudou-se para a Capre.<br />
Sem se preocupar com a informática enquanto prática política, sobretudo no<br />
Brasil dos militares, difusamente começou a visualizar as conseqüências sociais da<br />
disseminação dos computadores. Um sistema de pessoal, como aquele que ajudara a<br />
desenvolver e a instalar na Telerj, resultaria na supressão de postos de trabalho<br />
de um bom número de funcionários. Empolgava-se, também, com a imagem de uma grande