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vera dantas guerrilha tecnológica - MCI

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O alto e magro Saur e o baixo e roliço Guaranys se entenderam de imediato.<br />

Havia total liberdade de discussão entre eles. Muitas vezes, a secretária Astrid<br />

assustou-se com os berros que ouvia através das paredes. "Eles vão se sopapar",<br />

temia ela. Mas justamente no momento em que o pior poderia acontecer, um deles<br />

olhava o relógio, lembrava que era hora do almoço e saíam assobiando. Na volta,<br />

retomavam a discussão em termos bastante amáveis: "Seu porcaria, você não entende<br />

nada!" O sofrimento de Astrid recomeçava.<br />

No primeiro dia de trabalho no GTE, os dois decidiram visitar o Congresso da<br />

Sociedade dos Usuários de Computadores e Equipamentos Subsidiários - Sucesu -, que<br />

se realizava em São Paulo. A Sucesu foi criada em 1967, reunindo os primeiros<br />

grandes usuários de computadores do país, para trocar idéias e experiências entre<br />

si e promover a defesa de seus interesses frente aos fornecedores. Até 1971, todos<br />

os seus congressos foram realizados no Rio. Depois, passaram a se fazer,<br />

alternadamente, no Rio e em São Paulo. Aproveitando a oportunidade da reunião dos<br />

usuários, os fornecedores multinacionais começaram a montar estandes para exibir<br />

seus mais recentes lançamentos, originando-se as feiras da Sucesu, eventos<br />

paralelos aos congressos. Com o tempo, ambos se transformaram em acontecimentos<br />

monumentais. Mas quando Saur e Guaranys resol<strong>vera</strong>m aparecer no que se realizava em<br />

São Paulo, eram ainda tão limitados à pequena comunidade de usuários e fornecedores<br />

que a inesperada presença dos dois funcionários do governo causou uma surpresa<br />

geral.<br />

A notícia correu rápido. Saur e Guaranys não sabiam quem estava mais<br />

espantado: se eles com o que estavam vendo ou se os participantes com eles. Muita<br />

paparicação, a imprensa querendo a todo custo uma entrevista e as empresas se<br />

oferecendo para fabricar o futuro computador. Guaranys e Saur desconversavam,<br />

diziam que iam pensar. Sim, mas em planos bem diferentes do que podiam imaginar<br />

aquelas pessoas. Não iam pensar, apenas, na fabricação de um equipamento. Mas no<br />

projeto.<br />

Ao colocar dinheiro no projeto, o BNDE decidiu gerar o que os meios<br />

científicos gostam de chamar de massa crítica de cérebros. Isto é, um razoável<br />

conjunto de pessoas capazes de entender de pesquisa e desenvolvimento - no caso,<br />

referentes a computadores. Saur e Guaranys, em vez de se tornar meros<br />

intermediários e repassadores de recursos para uma empresa privada, decidiram, em<br />

primeiro lugar, contratar, na universidade, a especificação do projeto, depois a<br />

construção do protótipo e, só então, selecionar a empresa fabricante. Fazer o<br />

desenvolvimento antes. Definir a industrialização, depois.<br />

Apesar da antiga e estreita relação, tanto de Saur quanto de Guaranys, com a<br />

PUC carioca, o GTE não levou muito tempo para identificar a Escola Politécnica da<br />

USP como a mais qualificada para construir o protótipo do computador, graças a duas<br />

importantes credenciais. Em primeiro lugar, uma ligação bastante estreita com a<br />

Marinha, que enviava para lá os oficiais que iriam se especializar em engenharia<br />

eletrônica. A Poli, como sempre foi carinhosamente chamada por seus professores e<br />

alunos, estava para a Marinha assim como o IME para o Exército e o ITA para a<br />

Aeronáutica. Além disso, seus alunos e professores do curso de pós-graduação em<br />

eletrônica digital estavam concluindo a construção de um computador de oito bits.<br />

Por fim, a Escola decidira lutar firmemente pelo projeto do GTE. Este seria o<br />

coroamento natural de um processo de capacitação na área eletrônico-digital,<br />

iniciado quatro anos antes.<br />

Em 1968, quando o movimento estudantil levou ao seu ponto mais alto as lutas<br />

de rua contra o regime militar, um grupo de professores e alunos da Escola<br />

Politécnica da USP tinha outras prioridades. Em vez de sair às ruas desafiando a

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