13.05.2013 Views

Anais do I- EEL - Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

Anais do I- EEL - Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

Anais do I- EEL - Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

REVELL – Revista <strong>de</strong> Estu<strong>do</strong>s Literários da UEMS, Ano 01, número 1. ISSN: 2179-4456<br />

literatura <strong>de</strong> Clarice Lispector. Em termos wittgenstenianos, encontrar o que resta <strong>do</strong> homem,<br />

quan<strong>do</strong> a linguagem se esgota, seria o <strong>de</strong>svelamento <strong>do</strong> inefável, o incessante esforço da<br />

linguagem para captar aquilo que lhe foge. Para ilustrar o que acabamos <strong>de</strong> dizer vejamos mais<br />

uma passagem <strong>do</strong> livro em questão:<br />

Ah, mas para se chegar à mu<strong>de</strong>z, que gran<strong>de</strong> esforço da voz. Minha voz é o mo<strong>do</strong><br />

como vou buscar a realida<strong>de</strong>; a realida<strong>de</strong>, antes da minha linguagem, existe como um<br />

pensamento que não se pensa, mas por fatalida<strong>de</strong> fui e sou impelida a precisar saber o<br />

que o pensamento pensa. A realida<strong>de</strong> antece<strong>de</strong> a voz que a procura, mas como a terra<br />

antece<strong>de</strong> a árvore, mas como o mun<strong>do</strong> antece<strong>de</strong> o homem, mas como o mar antece<strong>de</strong><br />

a visão <strong>de</strong> mar, a vida antece<strong>de</strong> o amor, a matéria <strong>do</strong> corpo antece<strong>de</strong> o corpo, e por<br />

sua vez a linguagem um dia terá antecedi<strong>do</strong> a posse <strong>do</strong> silêncio. Eu tenho à medida<br />

que <strong>de</strong>signo – e este é o esplen<strong>do</strong>r <strong>de</strong> se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais<br />

à medida que não consigo <strong>de</strong>signar. (LISPECTOR, 1988, p.112-113)<br />

O romance A paixão segun<strong>do</strong> G.H. é, para Benedito Nunes, um <strong>do</strong>s textos mais<br />

originais da ficção brasileira e também, como escreve na introdução da Edição Crítica <strong>do</strong><br />

romance coor<strong>de</strong>nada por ele, ‘o livro maior <strong>de</strong> Clarice Lispector’, por abrir para o leitor, pelo<br />

envolvimento <strong>de</strong> sua narrativa, “a fronteira entre o real e o imaginário, entre a linguagem e o<br />

mun<strong>do</strong>, por on<strong>de</strong> jorra a fonte poética <strong>de</strong> toda ficção”. (NUNES, 1988, p. XXIV)<br />

Segun<strong>do</strong> Benedito Nunes, por um la<strong>do</strong>, A paixão segun<strong>do</strong> G.H. faz parte da linha<br />

ficcional <strong>de</strong> criação que Clarice Lispector a<strong>do</strong>tou <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu primeiro romance, Perto <strong>do</strong><br />

Coração Selvagem, <strong>de</strong> 1944; por outro la<strong>do</strong>, ele diz, tratar-se <strong>de</strong> um romance singular, “não<br />

tanto em função <strong>de</strong> sua história quanto pela introspecção exacerbada, que condiciona o ato <strong>de</strong><br />

contá-la”. (NUNES, 1988, p.XXIV),que se transforma, segun<strong>do</strong> o filósofo, no embate da<br />

narra<strong>do</strong>ra com a linguagem, levada a <strong>do</strong>mínios que ultrapassam o limite da expressão verbal.<br />

Sobre isso afirma:<br />

Em a paixão segun<strong>do</strong> G.H., a consciência da linguagem enquanto simbolização <strong>do</strong><br />

que não po<strong>de</strong> ser inteiramente verbaliza<strong>do</strong>, incorpora-se à ficção regida pelo<br />

movimento da escrita, que arrasta consigo os vetígios <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> pré-verbal e as<br />

marcas “arqueológicas” <strong>do</strong> imaginário até on<strong>de</strong> <strong>de</strong>sceu. G.H. tenta dizer a coisa sem<br />

nome, <strong>de</strong>scortinada no instante <strong>do</strong> êxtase, e que se entremostra no silêncio intervalar<br />

das palavras. Mas o que ela enuncia não po<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> simbolizar o substrato<br />

inconsciente da narração que, matéria comum aos sonhos e aos mitos, sobe das<br />

camadas profundas <strong>do</strong> imaginário que constituem o subsolo da ficção. (NUNES,<br />

1988, p.XXVII)<br />

Nessa perspectiva, para Nunes extrema-se o drama da linguagem, e este é o momento<br />

em que a narrativa torna-se: “o espaço agônico <strong>de</strong> quem narra e <strong>do</strong> senti<strong>do</strong> <strong>de</strong> sua narração – o<br />

espaço on<strong>de</strong> a narra<strong>do</strong>ra erra, isto é, on<strong>de</strong> ela se busca, buscan<strong>do</strong> o senti<strong>do</strong> <strong>do</strong> real, que só<br />

atinge quan<strong>do</strong> a linguagem fracassa em dizê-lo”. (Nunes 1988, p. XXVIII). Em uma<br />

passagem <strong>de</strong> O Dorso <strong>do</strong> tigre, pertinente a esse momento, Nunes afirma:<br />

A mensagem <strong>de</strong> G.H., no fim <strong>de</strong> seu calvário, compreen<strong>de</strong>n<strong>do</strong> que a existência em si<br />

é não-humana, e que toda linguagem tem no silêncio a sua origem e seu fim, é, no<br />

102

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!