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Anais do I- EEL - Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul

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REVELL – Revista <strong>de</strong> Estu<strong>do</strong>s Literários da UEMS, Ano 01, número 1. ISSN: 2179-4456<br />

Aos quitutes <strong>de</strong> Beirute. (NAVEIRA, 1994, p.79)<br />

O eu-lírico se reporta a uma das mais basilares tradições culturais <strong>do</strong>s<br />

imigrantes árabes: a preparação da comida. De acor<strong>do</strong> com as pesquisas <strong>de</strong> Cecília Kemel<br />

(2000, p.58, 65-67), o preparo da comida chega a ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> um rito, que não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

hora nem <strong>de</strong> lugar para que seja pratica<strong>do</strong>. Apesar disso, alerta a estudiosa, cada <strong>de</strong>talhe <strong>de</strong>sse<br />

rito “conduz à terra <strong>do</strong>s ancestrais”, pois, na reprodução <strong>de</strong> cada prato típico é renovada a<br />

alimentação <strong>do</strong>s antepassa<strong>do</strong>s, por meio da qual “os seus familiares reviverão a terra <strong>de</strong><br />

origem.” Por ser basicamente artesanal, a preparação das refeições é morosa, mesmo na<br />

atualida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> que a mulher é a responsável por essa ativida<strong>de</strong>.<br />

Nota-se que muitos <strong>do</strong>s elementos da tradição culinária árabe, mais<br />

especificamente da libanesa, presentes na primeira estrofe (“Quibe <strong>de</strong> carne crua / E trigo<br />

moí<strong>do</strong>”, “Pasta <strong>de</strong> grão <strong>de</strong> bico”, “Doces oleosos”), estão em consonância com os estu<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

Kemel. 23 Essa observação é útil para en<strong>do</strong>ssar o que as pesquisa<strong>do</strong>ras Chisini (2004) e Rosa<br />

(1994) assinalaram em seus estu<strong>do</strong>s: na produção literária naveiriana a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> pesquisa<br />

histórica prece<strong>de</strong> a composição da obra artística. Chisini (2000) apontou esse aspecto ao se<br />

referir à elaboração <strong>de</strong> Guerra entre irmãos (1997) 24 , e Rosa à <strong>de</strong> Sob os cedros <strong>do</strong> Senhor<br />

(1994). Ao fazê-lo, Rosa afirmou:<br />

Para transformar em poesia to<strong>do</strong> esse complexo <strong>de</strong> costumes, crenças, religão (sic),<br />

que constitui a cultura <strong>de</strong> árabes e armênios a autora fez cuida<strong>do</strong>sa pesquisa em<br />

livros <strong>de</strong> história e geografia, o que lhe permitiu navegar com segurança nos<br />

assuntos aborda<strong>do</strong>s. (ROSA, 1994, p.5)<br />

Feita essa observação, e voltan<strong>do</strong> nossa atenção para o poema “Dona Tita”,<br />

asseveramos que o eu-lírico se mostra acultura<strong>do</strong> por meio da alimentação típica <strong>do</strong> Líbano.<br />

Há um redimensionamento <strong>do</strong>s espaços: a culinária típica da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Beirute, a capital <strong>do</strong><br />

Líbano, passa a ser apreciada pela população da cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Campo Gran<strong>de</strong>. Assim, cabe dizer<br />

que os conteú<strong>do</strong>s poéticos comportam importantes questões pertinentes à cultura, nas quais<br />

repousam noções indispensáveis ao estu<strong>do</strong> e à compreensão <strong>do</strong>s “fenômenos” culturais<br />

globais: 1) “Por to<strong>do</strong> o globo, os processos das chamadas migrações livres e forçadas estão<br />

mudan<strong>do</strong> <strong>de</strong> composição, diversifican<strong>do</strong> as culturas e pluralizan<strong>do</strong> as i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s culturais”<br />

(HALL, 2003, p. 44-45). “As socieda<strong>de</strong>s multiculturais não são algo novo. [...] a migração e<br />

23 Essas observações da autora, das quais nos utilizamos, não estão restritas aos núcleos imigrantes da capital<br />

gaúcha, mas estão relacionadas aos imigrantes árabes <strong>de</strong> um mo<strong>do</strong> geral.<br />

24 Nesse ensaio, a estudiosa da obra naveiriana assevera que a “inclinação para a reconstituição da História é uma<br />

marca <strong>do</strong> amadurecimento artístico da escritora”. (CHISINI, 2000, p. 27).<br />

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