Dissertação completa - Programa de Pós-Graduação em Letras
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Deste modo, vê-se que não só as cartas à esposa, mas também os diários são<br />
fontes subliminares da fragmentação <strong>de</strong> Hamilton, que mostram que <strong>em</strong> meio à trama<br />
estampada <strong>de</strong> mal, há fios humanizados que ficam b<strong>em</strong> expostos <strong>em</strong> suas cartas <strong>de</strong><br />
amor.<br />
Opondo-se à objetificação, observa-se a resistência. É importante ressaltar a<br />
subversão, já que este é o caminho para a subjetivida<strong>de</strong> e para a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. Meios<br />
violentos, como motins, eram <strong>em</strong>preendidos contra o subjugo da escravidão. No dia 20<br />
<strong>de</strong> maio, por ex<strong>em</strong>plo, já prestes a partir, o capitão “<strong>de</strong>scobriu uma conspiração<br />
organizada pelos homens escravos contra nós. (...) e puniu os lí<strong>de</strong>res” [discovered a<br />
conspiracy among the men slaves to rise upon us. (...) and punished the ringlea<strong>de</strong>rs<br />
(PHILLIPS, 1993, p. 124, grifo nosso)]. O fato <strong>de</strong> haver lí<strong>de</strong>res mostra a organização<br />
<strong>de</strong> suas rebeliões, b<strong>em</strong> como a união entre os escravos contra Hamilton (ou o que ele<br />
representava), resistindo à opressão.<br />
Os negros também tentavam escapar, como mostra, entre outras no texto, a<br />
seguinte passag<strong>em</strong>: “quatro tentaram se livrar dos ferros e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma busca <strong>em</strong> seus<br />
cômodos, algumas facas e pedras etc. foram encontradas” [4 att<strong>em</strong>pting to get off their<br />
Irons, and upon further search in their rooms found some knives, stones etc.<br />
(PHILLIPS, 1993, p. 114)].<br />
Também para obstar o sujeito <strong>de</strong>monizado <strong>de</strong> Hamilton, os escravos bebiam e<br />
cantavam suas canções, provavelmente <strong>em</strong> sua língua, que r<strong>em</strong>etiam ao seu país e suas<br />
recordações: “Eles se juntam e cantam suas melancólicas lamentações” [They huddle<br />
together, and sing their melancoly lamentations (PHILLIPS, 1993, p. 124)]. Isso mostra<br />
a busca pela sobrevivência <strong>de</strong> sua cultura e tradição, aspectos que compõe a<br />
subjetivida<strong>de</strong> e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, respirando quietas <strong>em</strong> meio à invasão imperial.<br />
3.4.4 Hamilton humanizado – Cartas à Esposa<br />
Em primeiro lugar, é interessante notar a <strong>de</strong>dicatória <strong>em</strong> seu livro: “For those<br />
who crossed the river” (ou o Middle Passage, “a viag<strong>em</strong> dos doze milhões <strong>de</strong> escravos a<br />
partir dos portos da África aos portos brasileiros, norte-americanos e caribenhos nos<br />
navios tumbeiros, entre os séculos 16 e 19” (BONNICI, 2005, p. 38). Como já foi<br />
falado anteriormente, cruzar o rio significa ir para o outro lado e, não só os escravos o<br />
fizeram, mas também todos aqueles envolvidos neste processo, como a personag<strong>em</strong> sob<br />
estudo.<br />
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