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FILHO DO FOGO volume 1 - suelymmarvulle

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— Sei, mas onde é que eu vou andar de bicicleta se a rua é deles e a vila é de vocês?<br />

O do estilingue falou pela primeira vez, segurando minha camiseta pelo colarinho:<br />

acho que a boa vontade deles comigo tinha acabado.<br />

— Olha aqui, guri, a paciência já esgotou! O problema é seu, te vira e não apareça<br />

mais por aqui! Você mora lá na rua! Vai se entender por lá! Agora! — Deu-me um<br />

peteleco na ponta da orelha e eu sabia que aquilo era somente um “amigável” aviso.<br />

— Vai carregando o teu bagulho embora senão vai sobrar, heim? Ninguém precisa<br />

de almofadinha filhinho-de-papai por aqui! — Retomou o Zeca.<br />

— Tchauzinho, seu laranja!<br />

Eu havia sido escorraçado. Sem dó. Voltei pedalando pela ruazinha, injuriado. Passei<br />

por baixo da minha própria janela. E tão entretido estava em meus próprios pensamentos<br />

que me esqueci da molecada da rua...<br />

— Olha lá, pessoal!!! — Eles quase foram a delírio. — Olha só a bicicleta do bacana!<br />

Eles já vinham todos correndo para mim. Caí na realidade de repente.<br />

— Olá, pessoal.<br />

— Olá! Vamos dividir a magrela um pouco? Deixa a gente dar uma voltinha?<br />

— Depois eu!<br />

— E eu!!<br />

— Você nada, eu falei primeiro!<br />

Pelo visto eu era o único que tinha uma bicicleta no pedaço. E não havia o que<br />

fazer. Agora eles já haviam visto! Que coisa. Depois daquele episódio eu não podia sair<br />

com a bike porque, sempre que o fazia, todos a usavam menos eu!<br />

Aos poucos fui me cansando. Estava cheio de tanto abuso! Agora nem pipa e nem<br />

bike, aquilo já estava mesmo sem graça.<br />

Um dia eu estava ali catando aranhas num terreno baldio e o grupinho jogava bola<br />

em meio a urros, como sempre. Acabei me entretendo e esqueci deles. Quando passei de<br />

volta eles já não estavam mais lá, haviam debandado rua abaixo para o passatempo de final<br />

de tarde: jogar cascas de laranja, ovos e restos de comida na turma que passava pendurada<br />

nos trens e que ia para casa. Naquele trecho a linha de trem passava bem pertinho e era<br />

um alvoroço para a molecada. Eu só ficava olhando, com semblante meio entristecido.<br />

Vinha me sentindo muito só desde que havíamos nos mudado para o apartamento.<br />

Eles voltaram aos pulos, rindo e falando alto, comentando quem acertou o quê.<br />

Hoje em dia há um muro alto separando a rua dos trilhos mas, na época, nada havia que<br />

os impedisse.

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