20.04.2013 Views

ontem e hoje - Repositório Aberto da Universidade do Porto

ontem e hoje - Repositório Aberto da Universidade do Porto

ontem e hoje - Repositório Aberto da Universidade do Porto

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

demarcação de grupos sociais (Xitu, s.d.: 163) e pela distância social entre os noivos,<br />

que, no fun<strong>do</strong>, tenta ser nivela<strong>da</strong> pelo Carnaval. O sal<strong>do</strong> que duas personagens<br />

inomina<strong>da</strong>s fazem deste teatro respeita aos pais de Arlete, com uma extensão à<br />

socie<strong>da</strong>de colonial angolana, onde o preconceito é <strong>do</strong>minante, sen<strong>do</strong> este casamento<br />

considera<strong>do</strong> uma "boa parti<strong>da</strong>" ou "uma cátedra a to<strong>do</strong>s os presentes, sobretu<strong>do</strong> aos<br />

não-me-toques" (Xitu, s.d.: 169), à burguesia colonial luandense e às suas relações<br />

com os indígenas. O Camaval é um rito calen<strong>da</strong>riza<strong>do</strong> e o casamento de Arlete e<br />

Marajá é a concretização de uma imprevisibili<strong>da</strong>de numa <strong>da</strong>ta precisa e consagra<strong>da</strong><br />

que se distancia de uma ordem institucionaliza<strong>da</strong>, por ser Carnaval, por ser livre,<br />

mas onde acaba por se sentir uma dinâmica própria <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de colonial luandense,<br />

que é o motivo <strong>da</strong> utopia com que caracterizei inicialmente este episódio. Como se<br />

interroga Amal<strong>do</strong> Santos, "mas, não se alimentarão também as utopias, hora a hora,<br />

dia a dia, de tantas coisas frágeis e efémeras que ligam os homens à vi<strong>da</strong> de to<strong>do</strong>s os<br />

seres e <strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de?" (2002: 112).<br />

A construção de uma nação a-racial (cf. Venâncio, 2002: 33) faz-se ao longo <strong>da</strong>s<br />

páginas de vários textos de Uanhenga Xitu (com destaque para o romance agora em<br />

causa e para Mi~ngo, Os Solireviuentes dn Mdquinn Colonial Depóem.. .), cuja manifestação<br />

de utopia entronca neste exemplo <strong>do</strong> Carnaval <strong>da</strong> vitória <strong>da</strong> amizade de Arlete e<br />

Marajá. Porém, a morte deRicar<strong>do</strong> não deixa deser uma evidência <strong>do</strong> poder castra<strong>do</strong>r<br />

<strong>da</strong> socie<strong>da</strong>de colonial, que não deixa entrever a utopia, que não deixa de consignar a<br />

utopia enquanto tal e não enquanto concretização a ser.<br />

As personagens <strong>do</strong>s mun<strong>do</strong>s literários de Uanhenga Xitu e de Luandino Vieira<br />

representam agentes de elaboração de factos sociais e são, por isso, "simultaneamente,<br />

estruturantes e estrutura<strong>do</strong>s, símbolos e funções" (Gonçalves, 1997: 30). Neste senti<strong>do</strong>,<br />

observaram-se categorias que estão presentes nestas particulares tematizações <strong>da</strong>s<br />

relações inter-rácicas nos textos escolhi<strong>do</strong>s <strong>do</strong>s autores, nos quais a discriminação<br />

assenta especialmente em questões dérmicas, que acabam por arrastar outras formas<br />

de discrimimação, que dizem respeito, por exemplo, ao acesso a determina<strong>do</strong>s espaGos.<br />

Uanhenga Xitu descreve de um mo<strong>do</strong> bastante explícito o que representa o<br />

fenómeno <strong>do</strong> racismo, e passo a citar: "O fenómeno racismo não é estático. Ele a<strong>da</strong>ptase<br />

às circunstâncias, ao meio, aos fins políticos, económicos, sociais. É manipula<strong>do</strong><br />

para se atingirem os mais varia<strong>do</strong>s objectivos, sejam eles nobres ou obscuros. É uma<br />

arma que alguns utilizam <strong>da</strong>s mais diversas maneiras e até para simples deleite"<br />

(Xitu, 1991: 228).<br />

Na manipulação e invocação <strong>da</strong>s diferenças dérmicas através <strong>da</strong>s páginas de"A<br />

fronteira de asfalto" e Os Discursos <strong>do</strong> "Mestre" Tnniodn, as consequências <strong>da</strong> tramgressão<br />

<strong>da</strong>s fronteiras instituí<strong>da</strong>s são a morte e o casamento carnavaliza<strong>do</strong>. O que<br />

será, então, o racismo nestes <strong>do</strong>is textos? Acaba por ser o que institui a fronteira, ou<br />

seja, o racismo é, em si, e essencialmente, a fronteira artificial, a margem de ruptura<br />

<strong>da</strong> harmonia. Em suma, e invocan<strong>do</strong> uma afirmação de Michel Wieviorka (2002: 73),<br />

O racismo, em qualquer circunstância, nunca deixa de ser uma violência simbólicn.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!