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memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC

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preocupações se originam <strong>de</strong> experiências <strong>de</strong> abuso real, naturalmente <strong>da</strong> falta <strong>de</strong><br />

ética, cometi<strong>da</strong> por profissionais que trabalham no setor saú<strong>de</strong>. (LIMA, 2001, p.03)<br />

Uma outra questão importante que está presente nas narrativas e que a meu ver<br />

representam um gran<strong>de</strong> impasse nesse mundo globalizado, tendo fortes conotações na área <strong>da</strong><br />

saú<strong>de</strong>, é a valorização em termos efetivos <strong>de</strong> remuneração do trabalho <strong>de</strong> cui<strong>da</strong>r numa<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> paradigmática <strong>de</strong> troca, em que as metáforas sobre cui<strong>da</strong>do se incompatibilizam<br />

com os objetivos <strong>de</strong> uma socie<strong>da</strong><strong>de</strong> mercantil. A metáfora mais importante estaria liga<strong>da</strong><br />

mesmo à abnegação, uma vez que para cui<strong>da</strong>r bem <strong>de</strong> outro, quem cui<strong>da</strong> renunciaria aos seus<br />

próprios interesses como primeiros. Como compatibilizar essa perspectiva com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

mo<strong>de</strong>rna <strong>de</strong> primazia do indivíduo? Como diz TRONTO (1988, p.193), “Para que alguém<br />

possa cui<strong>da</strong>r do outro, é necessário uma ligação entre o ser e o outro e a natureza <strong>de</strong>ssa<br />

ligação constitui um problema para qualquer ética do cui<strong>da</strong>r”. Aqui, ética, gênero e cui<strong>da</strong>do se<br />

entrelaçam <strong>de</strong> maneira marcante porque não se po<strong>de</strong> negar a dimensão política e social do ato<br />

<strong>de</strong> cui<strong>da</strong>r. Tentemos fazer uma leitura do que isso significa a partir <strong>de</strong> alguns trechos <strong>da</strong>s<br />

narrativas:<br />

154<br />

Eu cobrava <strong>de</strong> quem podia pagar. Eu cobrava um tanto que a gente hoje não sabe<br />

nem dizer o quanto valia. Aquele tempo era um valor que a gente calculava, baseado<br />

em quem tinha porcos, quando vendia o porco ou a banha. Por exemplo: uma lata <strong>de</strong><br />

banha era o que eu cobrava, o equivalente, mas aquele dinheiro era pouco, aqueles<br />

cem “réizinhos”, aquela nota vermelhinha, que eu nem sei quanto é que vale se<br />

comparar com o dinheiro <strong>de</strong> agora. Era pouca coisa que eu cobrava e muitos partos<br />

eu fazia <strong>de</strong> graça. Não podia pagar como é que eu ia cobrar? Eu tinha que aju<strong>da</strong>r. (D.<br />

Deta)<br />

Muitos milhares <strong>de</strong> partos eu fiz sem cobrar, porque a pessoa não tinha condições <strong>de</strong><br />

pagar. O médico me dizia: vocês são obriga<strong>da</strong>s a ir ao chamado porque se acontecer<br />

alguma coisa, vocês são responsáveis. Eu um dia falei para ele: como é que nós<br />

somos responsáveis e o Sr. não é responsável? Porque se fosse uma pessoa que não<br />

pu<strong>de</strong>sse pagar eles não atendiam mesmo, os médicos não atendiam. Uma vez uma<br />

mulher que veio lá <strong>de</strong> Buritis foi para o hospital e não aten<strong>de</strong>ram. Ela então veio<br />

para a minha casa e passou uma meia hora ela teve a criança. Ela não ficou no<br />

hospital porque não tinha dinheiro para fazer o <strong>de</strong>pósito que era obrigatório. Elas<br />

não tinham dinheiro para pagar o parto. (D. Geral<strong>da</strong>)<br />

Naquele tempo não tinha apartamento, era complementado muitas vezes pelo<br />

instituto, ou muitos pagavam particular a parte exce<strong>de</strong>nte. Mesmo essas particulares<br />

a gente atendia, esporadicamente o médico atendia. Os médicos faziam poucos,<br />

muito poucos partos. Também eles não tinham tempo para isso não é? Não tinham<br />

tempo porque eles atendiam os consultórios particulares em coisas que rendiam<br />

mais. (D. Army)<br />

Mesmo paciente particular a gente não recebia por esse trabalho. Não, só a parte <strong>da</strong><br />

materni<strong>da</strong><strong>de</strong> mesmo. Os médicos às vezes no final do mês <strong>da</strong>vam uma contribuição,<br />

um presente, uma contribuiçãozinha assim, coisa pouca, não era fixo, não era na<strong>da</strong>.

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