memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Eu trabalhei mais <strong>de</strong> cinqüenta anos como parteira, e o<br />
primeiro parto que eu fiz foi em São Paulo. Eu morava com a<br />
minha cunha<strong>da</strong> e ela estava esperando neném. Quando ela começou<br />
a sentir mal, não tinha ninguém, era eu mesma. Nasceram duas<br />
meninas: uma e logo após nasceu a outra. Aí eu fiquei sem<br />
saber o que fazer, eu nunca tinha feito isso. Chamei uma<br />
vizinha e cortamos o umbiguinho <strong>da</strong>s meninas. Depois eu fui<br />
apren<strong>de</strong>r comigo mesma. Quando eu tive o meu primeiro menino,<br />
eu passei muito mal, eu mesma fiz o meu parto. Depois que eu<br />
fiz o parto <strong>de</strong>ssa minha cunha<strong>da</strong> a vizinhança ficou me chamando<br />
para fazer parto. Eu dizia: gente eu não sou parteira! Mas a<br />
mulher está passando muito mal, vai lá. Gente eu nunca tinha<br />
feito um parto, não sabia na<strong>da</strong>. Então outra ganhou uma menina.<br />
Aí lá foi dona Geral<strong>da</strong> “tirar visto” direitinho. Então fui<br />
continuando. Eu tive seis filhos sozinha! Aí eu fui apren<strong>de</strong>ndo<br />
comigo mesma. E criança veio e nunca <strong>de</strong>u problema nenhum. Eu<br />
aprendi comigo mesma, porque quando eu tive o meu primeiro<br />
menino, naquele tempo, a gente casava muito boba, as mães<br />
tinham aquela reserva, ninguém falava na<strong>da</strong> com os filhos, não<br />
fazia na<strong>da</strong>. Quando eu tive o primeiro menino, eu ficava assim,<br />
olhando[...]<strong>de</strong> on<strong>de</strong> esse menino passou? Eu ficava olhando ele<br />
num cantinho, imaginando: como tem lugar para esse menino<br />
passar? A vasilha tá cheia <strong>de</strong> sangue[...] Então quando eu tive<br />
a outra filha já trouxe água quente e pensei: agora eu vou ver<br />
como é que é. Quando eu toquei a bolsa eu assustei, porque eu<br />
não esperava aquilo, mas continuei, e quando foram chamar a<br />
parteira ela já tinha nascido. Essa foi a segun<strong>da</strong>, <strong>de</strong>pois a<br />
terceira eu tive só, com Deus, eu tive sozinha a minha menina!<br />
Eu mesmo cortei o umbiguinho, eu mesmo arrumei tudo. E assim<br />
continuei a trabalhar lá em São Paulo. Depois eu aprendi a<br />
fazer toque, man<strong>de</strong>i comprar luvas, comprei tudo e fui fazendo.<br />
Quando cheguei aqui em Várzea <strong>da</strong> Palma continuei. Fazia na<br />
ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, às vezes junto com os médicos, com o Dr. Sérgio, que<br />
inclusive <strong>de</strong>u aula para mim. Cheguei aqui e continuei a mesma<br />
coisa, fazendo partos.<br />
O primeiro parto que eu fiz aqui, foi <strong>da</strong> entea<strong>da</strong> do Edson<br />
<strong>da</strong> senhora Nadir. No começo aqui não tinha hospital. Eram as<br />
<strong>parteiras</strong> que trabalhavam. Eu sempre tive mais cotação, o povo<br />
tinha mais fé em mim, e assim eu fui criando aquele ambiente,<br />
as pessoas me procuravam muito.<br />
Foi então que começaram as reuniões to<strong>da</strong> quinta feira com<br />
a Nei<strong>de</strong>. Ela trabalhava no posto <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, era enfermeira.<br />
Depois um outro doutor veio <strong>da</strong>r aula pra gente: ele trazia uma<br />
boneca , fazia todo aquele movimento com a boneca ensinando<br />
to<strong>da</strong>s as posições que a criança podia nascer, como é que não<br />
podia nascer, o que impedia. Então a gente prestava muita<br />
atenção, e ia apren<strong>de</strong>ndo muito. Quando eu fazia um toque e<br />
notava que não era capaz, eu já levava para o hospital. Porque<br />
logo <strong>de</strong>pois que eu vim para cá abriu o hospital. Deve ter uns<br />
quarenta e nove anos mais ou menos que começou a funcionar o<br />
54