memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
emédio manipulado. Eu tinha uma menina pequena, com oito<br />
meses, e ela só mamava no peito, não queria comer. Eu queria<br />
tirar ela do peito para eu po<strong>de</strong>r ficar um mês em<br />
Florianópolis, para po<strong>de</strong>r apren<strong>de</strong>r a fazer manipulação. Eu<br />
aprendi a fazer manipulação no Hospital <strong>de</strong> Cari<strong>da</strong><strong>de</strong>. Lá eram<br />
as irmãs que dirigiam o hospital e naquele tempo os remédios<br />
<strong>de</strong> lá eram quase todos manipulados. Paguei uma emprega<strong>da</strong> que<br />
cuidou <strong>da</strong> menina, para eu po<strong>de</strong>r apren<strong>de</strong>r fazer essa<br />
manipulação. Voltei para casa e continuei trabalhando em<br />
parto.<br />
E muito aqui também eu fiz, quando eu cheguei, que não era<br />
relacionado ao parto: havia muita difteria, crupe e eu sabia<br />
que Florianópolis tinha vacina. Eu ia à Florianópolis, trazia<br />
vacina, fazia a lista <strong>da</strong>s crianças, marcava no domingo numa<br />
escola ou numa igreja ia lá e fazia to<strong>da</strong> a vacinação completa<br />
<strong>da</strong> difteria, <strong>da</strong> crupe. Aqui não tinha médico, tudo eu<br />
resolvia, médico mais próximo só tinha em Tubarão. Depois em<br />
Braço do Norte abriu um hospital, mas às vezes tinha médico,<br />
outra vezes não tinha. Era assim, uma coisa precária.<br />
O hospital <strong>da</strong>qui foi aberto em setenta e um, maio <strong>de</strong><br />
setenta e um, e começou a funcionar um hospitalzinho pequeno<br />
que era do FUNRURAL. Depois foi feito um hospital maior também<br />
do FUNRURAL, porque aquele ali era muito precário, era muito<br />
ruim, <strong>da</strong>í foi feito um outro hospital. Eu comecei a trabalhar<br />
no hospital, a fazer partos no hospital. Mas eu trabalhei<br />
fazendo parto.domiciliar durante vinte anos “<strong>de</strong> à cavalo”. Eu<br />
fazia os partos no hospital mesmo tendo médico porque os<br />
médicos só examinavam se eu precisasse, se eu chamasse o<br />
médico, para o caso <strong>de</strong> uma cesariana por exemplo. Imagina que<br />
eu às vezes fazia cem partos sem levar uma parturiente para o<br />
médico. Às vezes passava até <strong>de</strong> cem porque passava quase um<br />
ano, sem eu levar uma parturiente para o hospital quando fazia<br />
esses partos em casa.<br />
Quando comecei no hospital eu recebia o meu or<strong>de</strong>nado que<br />
eram dois salários, dois salários mínimos. Depois passaram<br />
para três salários, porque eu trabalhava quase dia e noite. Às<br />
vezes passava três dias e três noites sem chegar em casa. Eu<br />
não tinha horário <strong>de</strong> serviço e trabalhava on<strong>de</strong> fosse preciso,<br />
do raio X até a sala <strong>de</strong> cirurgia, lavan<strong>de</strong>ria, até na costura,<br />
em tudo. Tinha que trabalhar em qualquer dos serviços que<br />
precisasse <strong>de</strong> alguém.<br />
Mas eram os médicos que recebiam os partos mesmo sem<br />
fazer. Porque era a parteira quem fazia, só que eles recebiam<br />
porque eles eram os responsáveis, são formados, claro, são<br />
liberais, são livres. Era muito raro eles fazerem parto. Só se<br />
viesse uma pessoa escolhi<strong>da</strong>, assim, que queria que fosse um<br />
médico. Mas era muito difícil porque elas preferiam que eu<br />
fizesse o parto do que o médico. Então no começo quando foi<br />
para o hospital, foi assim, uma greve, uma guerra! Não, não<br />
queriam! Queriam que eu fosse aten<strong>de</strong>r em casa mas eu não podia<br />
trabalhar no hospital e aten<strong>de</strong>r fora, então ou tem um ou tem<br />
96