memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
agra<strong>da</strong>r do teu trabalho, se vê que tu tá competente, eu mando<br />
tu bater o ponto, e vais ficar na enfermagem. E assim foi: com<br />
15 dias ela disse pra eu começar a bater ponto que estava<br />
agra<strong>da</strong>ndo muito a ela.<br />
Comecei a trabalhar nos postos <strong>de</strong> enfermagem: era <strong>da</strong>r banho<br />
em paciente, tudo coisa assim sem compromisso nenhum. Dar<br />
banho, trocar leito, trocar cama, <strong>da</strong>r alimentação para a<br />
paciente na cama, botar um termômetro para ver a temperatura,<br />
ver pressão, até aí era só esse serviço. Então ela foi me<br />
ensinando a fazer injeção e <strong>de</strong>pois passei a <strong>da</strong>r medicação. Foi<br />
quando precisaram na sala <strong>de</strong> parto, ela me mandou para a sala<br />
e eu adorei, adorei! Não queria mais sair <strong>de</strong> lá. Se precisavam<br />
por causa <strong>de</strong> escala e me tiravam por um mês pra substituir uma<br />
outra num posto, eu pedia que fosse só um mês mesmo. Queria<br />
voltar pra sala <strong>de</strong> parto, achava lindo aquilo ali. Era<br />
gratificante! Na área <strong>da</strong> enfermagem, a gente cui<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />
paciente, e vê o sofrimento, às vezes piorando ca<strong>da</strong> vez mais<br />
até que chega o dia em que morre. Isso é bem doído, a gente<br />
pega carinho pelo paciente e <strong>de</strong>pois sabe que morreu, é como se<br />
fosse parente nosso. Na materni<strong>da</strong><strong>de</strong> é diferente, a gente vê o<br />
resultado do trabalho: é gratificante porque a mãe chega com<br />
dor, com sofrimento e tudo, mas <strong>da</strong>í a pouco tudo passa. No<br />
mesmo dia ganha, ou então no outro dia a gente chegava para<br />
trabalhar e perguntava: aquela paciente <strong>de</strong> ontem como está?<br />
Ah! Já ganhou ! A gente ficava naquela alegria to<strong>da</strong>, e por<br />
isto eu gostava muito. Assim, nas outras uni<strong>da</strong><strong>de</strong>s eu ficava<br />
com pena, a gente pegava carinho pela paciente <strong>de</strong>pois via<br />
piorar, não to<strong>da</strong>s não é, mas a gente via muita coisa, assim<br />
muito quadro difícil, às vezes a morte. E ali na materni<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
não, porque ali é difícil morrer <strong>de</strong> parto, é muito raro morrer<br />
uma paciente <strong>de</strong> parto, morre mais <strong>de</strong> aborto que <strong>de</strong> parto.<br />
Eu fui apren<strong>de</strong>ndo a fazer parto ali no dia a dia, com<br />
aquele corre-corre, com aquela movimentação, muito serviço,<br />
muita coisa mesmo: uma estava ganhando na cama, não chegava o<br />
médico, a outra parteira estava fazendo um outro parto, não<br />
podia aten<strong>de</strong>r. Então eu era obriga<strong>da</strong> a botar uma luva e puxar<br />
o neném porque eu não ia <strong>de</strong>ixar que ele não tivesse atenção,<br />
afinal estava nascendo. Às vezes até o narizinho estava<br />
“trancado”, cabecinha já saindo então nesses casos eu era<br />
obriga<strong>da</strong> a botar uma luva e já puxava o neném. E ali já<br />
pinçava direitinho, já cortava o umbigo, já levava para o<br />
berçário: assim foi que eu comecei. Às vezes ganhava no<br />
“bacio”, já aconteceu, paciente que é teimosa, às vezes quer<br />
ir ao banheiro. Não vá ao banheiro agora, mas não obe<strong>de</strong>cia, e<br />
quando a gente escutava aquele grito já ia lá e o neném às<br />
vezes já estava nascendo ou já tinha nascido ali, então eu era<br />
obriga<strong>da</strong> a botar mão nisso aí. Com isso eu fui apren<strong>de</strong>ndo.<br />
A maioria <strong>da</strong>s <strong>parteiras</strong> que trabalharam lá era a mesma<br />
coisa que eu, apren<strong>de</strong>ram assim no dia a dia do hospital. Não<br />
tinham curso também não. Não tinham facul<strong>da</strong><strong>de</strong>, facul<strong>da</strong><strong>de</strong>, não<br />
66