memórias de parteiras - Repositório Institucional da UFSC
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questionamento <strong>da</strong>s fontes orais enquanto registros, documentos que falam por si só, remetem<br />
invariavelmente à questão <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, porque o que é mais constitutivo <strong>da</strong> ciência que o<br />
<strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scobrir a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>? Paul Thompson (1998, P.197) continua dizendo que “to<strong>da</strong><br />
fonte histórica <strong>de</strong>riva<strong>da</strong> <strong>da</strong> percepção humana é subjetiva, mas apenas a fonte oral permite-<br />
nos <strong>de</strong>safiar essa subjetivi<strong>da</strong><strong>de</strong>: <strong>de</strong>scolar as cama<strong>da</strong>s <strong>da</strong> memória, cavar fundo em suas<br />
sombras, na expectativa <strong>de</strong> atingir a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> oculta” e ain<strong>da</strong> mais: “A lição importante é<br />
apren<strong>de</strong>r a estar atento àquilo que não está sendo dito, e a consi<strong>de</strong>rar o que significam<br />
os silêncios. Os significados mais simples são provavelmente os mais convincentes”.<br />
(THOMPSON, 1998, p. 204-205) (grifos meus).<br />
Estas entrevistas são carrega<strong>da</strong>s <strong>de</strong> silêncios e confidências não grava<strong>da</strong>s que remetem a<br />
um significado mais amplo <strong>da</strong> dimensão <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> no caso aqui, dos fazeres <strong>de</strong>stas mulheres.<br />
São a meu ver silêncios e confidências que negam, fazem calar os discursos hegemônicos<br />
construídos sobre o que se espera <strong>de</strong> nós atrizes/sujeitos na construção <strong>da</strong> história e <strong>da</strong> cultura<br />
humanas, e que não refletem o que efetivamente fazemos. No caso específico <strong>da</strong>s <strong>parteiras</strong>,<br />
seus discursos, silêncios, interditos, <strong>de</strong>ixam claro que muito do que se diz sobre elas são<br />
generalizações que não correspon<strong>de</strong>m à complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> seus fazeres saberes. Estes discursos<br />
construídos são incorporados pelo senso comum como ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s absolutas, o que tem<br />
contribuído sobremaneira para a manutenção <strong>da</strong> hegemonia do po<strong>de</strong>r/saber médico na área <strong>da</strong><br />
saú<strong>de</strong> E esta é uma construção histórica que espalhou-se pelo mundo oci<strong>de</strong>ntal <strong>de</strong>s<strong>de</strong> as<br />
chamas <strong>da</strong>s fogueiras <strong>da</strong> inquisição[...]<br />
E quanto a atingir a ver<strong>da</strong><strong>de</strong> oculta, que esta expectativa não nos <strong>de</strong>ixe cegas/os diante<br />
do fato <strong>de</strong> que ver<strong>da</strong><strong>de</strong>s também são construções históricas e temporais, não passíveis <strong>de</strong><br />
generalizações apriorísticas que nos <strong>de</strong>ixam prisioneiras/os <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ologias que perpetuam a<br />
manutenção do status quo.<br />
Creio que problematizar a questão <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong> na pesquisa científica e nos resultados<br />
obtidos através do <strong>de</strong>svelamento <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> não po<strong>de</strong> nem <strong>de</strong>ve <strong>de</strong>ixar dúvi<strong>da</strong>s a/ao<br />
pesquisadora/or <strong>de</strong> que é necessário um rigor metodológico e um distanciamento crítico<br />
acerca do que se está produzindo. Ao contrário, estes questionamentos nos encaminham no<br />
sentido <strong>de</strong> concor<strong>da</strong>r com Minayo que coloca o seguinte ao comentar a objetivi<strong>da</strong><strong>de</strong> científica<br />
em Demo:<br />
Da<strong>da</strong> à especifici<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s ciências sociais, a objetivi<strong>da</strong><strong>de</strong> não é realizável. Mas é<br />
possível a objetivação que inclui o rigor no uso do instrumental teórico e técnico<br />
a<strong>de</strong>quado, num processo interminável e necessário <strong>de</strong> atingir a reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. O que se<br />
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