<strong>Direitos</strong> Hu m a n o s n o Br a s i l <strong>2010</strong>Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) 12 . O Parlamento deu <strong>no</strong>va redação ao artigo 149do Código Penal <strong>Brasil</strong>eiro (CPB) 13 . E foram incrementadas, pelos signatários do PactoNacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, restrições comerciais às empresas queconstassem <strong>no</strong> cadastro do MTE como envolvidas <strong>no</strong> crime 14 . Assim, como o problema daescravidão persistiu? Onde falharam o Estado e a sociedade civil?Ao ouvir setores da sociedade civil, como a CPT, surgiram algumas ponderações. OPoder Executivo federal, afirmaram, agiu de forma incoerente. Setores do Estado, comoa SDH e do MTE, atuaram a favor da erradicação; outros setores, como o Ministérioda Agricultura, contra. Não houve a concretização da reforma agrária; diversos projetoseconômicos foram impostos e estes privilegiaram a concentração da riqueza e do poder.A falta de coerência nas medidas tomadas seria uma das razões da persistência do crime.Além de tendências contraditórias, as ações eram insuficientes. A metade das denúnciasde trabalho escravo não produziu fiscalização, pois faltavam dados nas peças das denúncias,porque o Estado não foi capaz de agir com a rapidez necessária ou por outra razão.Um dos motivos alegados foi de responsabilidade da PF, que exigiu um prazo mínimode um mês para se organizar e participar das operações coordenadas pelos auditores dotrabalho. E isso causou indignação e perplexidade naqueles que formularam as denúncias,pois, explicaram, crime não marca hora e, para o flagrante, é necessário agilidade.E, apesar de numerosos casos reconhecidos do crime, houve poucas condenações penaise nenhum dos condenados permaneceu preso. A respeito da ação do Peti, por exemplo,segundo estimativa do Instituto <strong>Brasil</strong>eiro de Geografia e Estatística (IBGE), haveria <strong>no</strong>país, em 2008, em tor<strong>no</strong> de 2,1 milhões de crianças entre cinco e quinze a<strong>no</strong>s exercendoatividades laborais. Destas, o programa estaria atendendo apenas 40% em <strong>2010</strong>.Segundo um funcionário do MTE 15 , a promessa do ministro Nilmário Miranda, em2003, “não passou de uma atitude midiática, uma bravata”. As causas do trabalho escravo“são profundas e não é possível, num toque de caixa, resolver o problema”. Ou Nilmário,ponderou o informante, “quis dar uma ênfase maior ao problema, colocar todo o Estadonessa luta”. A seguir, enumerou alguns problemas:12http://<strong>no</strong>ticias.r7.com/brasil/<strong>no</strong>ticias/programa-contra-trabalho-infantil-atende-so-40-de-criancas-em-atividade-<strong>no</strong>pais-<strong>2010</strong>0621.html.Notícia de 21/6/<strong>2010</strong> às 17h06, acessado em 2/10/<strong>2010</strong>.13Esta é a redação, após a alteração feita pela L-010.803-2003: Art. 149 - Reduzir alguém a condição análoga à deescravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantesde trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregadorou preposto: Pena - reclusão, de dois a oito a<strong>no</strong>s, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1º Nas mesmaspenas incorre quem: I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo<strong>no</strong> local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva <strong>no</strong> local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetospessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo <strong>no</strong> local de trabalho. § 2º A pena é aumentada de metade, se o crime écometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.14As empresas signatárias do pacto representariam cerca de 20% do Produto Inter<strong>no</strong> Bruto (PIB) brasileiro.15O servidor público preferiu não se identificar.76<strong>Direitos</strong> huma<strong>no</strong>s.indd 7611/18/10 12:15:36 PM
Ap ó s o i t o a n o s: c o m o f i c o u a “e r r a d i c a ç ã o” d o t r a b a l h o e s c r av o?1. Não foi implementada a reforma agrária. Uma reforma ampla daria consistência a<strong>no</strong>vas relações <strong>no</strong> campo e evitaria a escravidão e o alto grau de exploração contra ostrabalhadores rurais.2. Os aparelhos repressores do Estado precisam de maior eficiência. A PF, por exemplo,deveria instaurar os inquéritos que levariam às ações penais, e não restringir suaatividade à proteção dos servidores públicos nas operações de fiscalização. O pretextoapresentado “está na conceituação do que é trabalho escravo, quando os demais(auditores fiscais e procuradores) consideram superada a dúvida” a partir da <strong>no</strong>varedação do artigo 140 do CPB. Por isso, os procuradores da República, quando decidemdenunciar, precisam se basear <strong>no</strong>s relatórios de fiscalização.3. A SDH, através de seus titulares, não conseguiu estabelecer um diálogo com oMinistério da Justiça, <strong>no</strong>s oito a<strong>no</strong>s do gover<strong>no</strong> Lula, que produzisse uma mudançana compreensão da PF.4. Entre 2009 e <strong>2010</strong>, em tor<strong>no</strong> de cinquenta condenações foram feitas pela Justiça Federalpor crimes de redução ao trabalho escravo. Contudo, a maioria das ações teve umsó ator, o juiz de Marabá Carlos Henrique Borlido Haddad 16 . O que demonstravaa timidez e ineficiência da Justiça. Só na “lista suja” atualizada em julho de <strong>2010</strong>constavam 149 empregadores; na lista parcial das empresas e empregadores <strong>no</strong> Paráacusados de usar trabalho escravo, constavam, de 1969 a 2009, 844 unidades de produçãoacusadas do crime 17 .5. Não houve por parte dos membros da Procuradoria e do Judiciário um levantamento deinformações sobre as ações e as sentenças relativas ao crime. O levantamento de dadospossibilitaria subsidiar autoridades nas ações e formar uma jurisprudência mais robusta.6. O MPT propôs o TAC em situações nem sempre adequadas. Assinar um TAC,por exemplo, a respeito de algo já definido na Consolidação das Leis do Trabalho(CLT), além de incoerente – o empregador é obrigado a obedecer, independentementede qualquer outro compromisso –, torna-se um complicador. O TAC é alegadona defesa de crimi<strong>no</strong>sos, que o apresentam como prova de boa vontade e disposiçãode mudança, para serem retirados da “lista suja” e para fugirem de outras açõesjudiciais, inclusive, de âmbito coletivo. E haveria juízes “mais conservadores” queacolheriam tais argumentos. Uma alternativa ao TAC, para aspectos não previstos16Em março de 2009, por exemplo, ele concluiu o julgamento de 32 processos referentes a trabalho escravo. Em 26 deles,as sentenças do magistrado condenaram 28 pessoas e absolveram seis da acusação de reduzir trabalhadores à condiçãoanáloga à de escravo, mas foram condenados por outras infrações.17Veja em: http://www.gptec.cfch.ufrj.br/Relatorio-versao-02-abril.pdf77<strong>Direitos</strong> huma<strong>no</strong>s.indd 7711/18/10 12:15:36 PM