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Dissertação completa - Programa de Pós-Graduação em Letras - UEM

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81crianças, / B<strong>em</strong> raramente encerra uma mulher <strong>de</strong> “dom”!”. O <strong>de</strong>sejo absurdo <strong>de</strong> sofrer<strong>de</strong>spertado pela soturnida<strong>de</strong> e pela melancolia do anoitecer nas ruas <strong>de</strong> Lisboa t<strong>em</strong> umparalelo nas loucuras mansas dos sons que anunciam a noite nas celas da prisão, oAljube <strong>de</strong> Lisboa que funcionou anteriormente como prisão eclesiástica, passando aespaço <strong>de</strong> mulheres e crianças que vêm das classes populares. A <strong>de</strong>scrição da escuridãodas celas contrasta com a luz dos hotéis da moda, configurando a linguag<strong>em</strong> visualista eplástica <strong>de</strong> Cesário e o objetivo <strong>de</strong> apresentar uma crítica social implícita. Com oacen<strong>de</strong>r das luzes nas ruas, o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> sofrer acentua-se numa melancolia tão profundaque o sujeito lírico chega a suspeitar <strong>de</strong> que pa<strong>de</strong>ce <strong>de</strong> uma doença mortal, o aneurisma,na estrofe 13: “E eu <strong>de</strong>sconfio, até, <strong>de</strong> um aneurisma/ Tão mórbido me sinto, ao acen<strong>de</strong>rdas luzes; (...) Chora-me o coração que se enche e que se abisma”. Essa <strong>de</strong>pressão tãovisível e <strong>de</strong>scrita fisiologicamente está ligada às prisões, à Sé, às cruzes.Na continuação <strong>de</strong> sua <strong>de</strong>scrição da cida<strong>de</strong>, Cesário refere-se às tascas, aoscafés, às tendas, mas acida<strong>de</strong> do presente ainda está dominada pelo negro e pelo fúnebredo passado. Na segunda parte do po<strong>em</strong>a, quinta estrofe “Na parte que abateu noterr<strong>em</strong>oto, / Muram-me as construções retas, iguais, crescidas; / Afrontam-me, no resto,as íngr<strong>em</strong>es subidas, / E os sinos dum tanger monástico e <strong>de</strong>voto.”. Os prédios qu<strong>em</strong>uram e oprim<strong>em</strong> o sujeito lírico são os que se ergueram sobre os corpos soterrados dogran<strong>de</strong> terr<strong>em</strong>oto ocorrido <strong>em</strong> 1755, e o tanger monástico e <strong>de</strong>voto dos sinos marca,psicologicamente, a distância dos séculos. Volta Camões na sexta estrofe,”Mas, numrecinto público e vulgar, / Com bancos <strong>de</strong> namoro e exíguas pimenteiras, / Brônzeo,monumental, <strong>de</strong> proporções guerreiras/ Um épico doutrora ascen<strong>de</strong>, num pilar!”. Essaestátua assim revelada é para l<strong>em</strong>brar que houve um outro passado, associado ao povo eao mar, diferente daquele referido sinistramente ao terr<strong>em</strong>oto e à Inquisição, associado àcida<strong>de</strong>, ao clero e às prisões (quarta estrofe) “Duas igrejas, num saudoso largo, /Lançam a nódoa negra e fúnebre do clero: / Nelas esfumo <strong>em</strong> ermo inquisidor severo,Assim que pela História eu me aventuro e alargo.” . Depreen<strong>de</strong>-se que o passado épicocantado por Camões não é o mesmo do presente e, sim, o seu oposto.A realida<strong>de</strong> melancólica da cida<strong>de</strong> – Triste cida<strong>de</strong>! – apresenta um contrasteacentuado pela diferença entre as nobres proporções guerreiras da estátua monumentale a massa acumulada <strong>de</strong> corpos enfezados na cida<strong>de</strong> (segunda parte do po<strong>em</strong>a, sétimaestrofe). A ronda da cida<strong>de</strong> é inabalável – a recolha dos soldados (os <strong>de</strong>fensores

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