82sombrios da or<strong>de</strong>m social) é seguida pela partida das patrulhas <strong>de</strong> cavalaria. Esta seçãodo po<strong>em</strong>a termina com o autorretrato irônico <strong>de</strong> Cesário e do seu método poético:E eu, <strong>de</strong> luneta <strong>de</strong> uma lente só,Eu acho s<strong>em</strong>pre assunto a quadros revoltados:Entro na brasserie; às mesas <strong>de</strong> <strong>em</strong>igrados,Ao riso e à crua luz joga-se o dominó.Na terceira seção do po<strong>em</strong>a, Ao Gás, há uma opressão que cresce <strong>de</strong>s<strong>de</strong> oprimeiro verso: “Eu saio. A noite pesa, esmaga.” O sujeito lírico cria uma atmosfera <strong>de</strong>alucinação e <strong>de</strong> atordoamento <strong>em</strong> que a realida<strong>de</strong> externa e a sua interpretação subjetivase fun<strong>de</strong>m.O t<strong>em</strong>a da doença das duas primeiras seções reaparece como um significantesocial: a melancolia e a náusea, o <strong>de</strong>sejo absurdo <strong>de</strong> sofrer, a morbi<strong>de</strong>z <strong>de</strong> sentir umaneurisma, o peixe podre <strong>em</strong> focos <strong>de</strong> infecção (terceira parte do po<strong>em</strong>a, primeiraestrofe) “E saio. A noite pesa, esmaga. Nos / Passeios <strong>de</strong> lajedo arrastam-se as impuras./ Ó moles hospitais! Sai das <strong>em</strong>bocaduras / Um sopro que arrepia os ombros quasenus.”. Na segunda estrofe cercado por lojas tépidas, o sujeito lírico, numa espécie <strong>de</strong>alucinação, pensa estar numa imensa catedral profana: “Eu penso/ Ver círios laterias,ver filas <strong>de</strong> capelas, / com santos e fiéis, andores, ramos, velas,/ Em uma catedral <strong>de</strong> umcomprimento imenso.”. Ao afirmar que “pensa” e vê, l<strong>em</strong>bra Fernando Pessoa e ointerseccionismo. O último verso <strong>de</strong>ssa estrofe, ao referir-se à catedral <strong>de</strong> umcomprimento imenso ocorre pela subjetivida<strong>de</strong> do sujeito lírico, apresenta a misturasimultânea <strong>de</strong> imagens <strong>em</strong> uma cena abordada pelo pensamento vindo para a realida<strong>de</strong>,assim adianta o surrealismo que ocorreu anos <strong>de</strong>pois na Europa.O sujeito lírico continua <strong>de</strong>ambulando pela cida<strong>de</strong>: “Longas <strong>de</strong>scidas!”.cida<strong>de</strong>, aos poucos, vai se tornando sepulcral: as longas <strong>de</strong>scidas das suas ruas íngr<strong>em</strong>esopõ<strong>em</strong>-se às íngr<strong>em</strong>es subidas da seção anterior, afrontando e cansando; “Mas tudocansa!Apagam-se nas frentes / Os can<strong>de</strong>labros, como estrelas, pouco a pouco; / Dasolidão regouga um cauteleiro rouco; Tornam-se mausoléus as armações fulgentes.”. Acida<strong>de</strong> é abandonada à sua escuridão.Na décima primeira estrofe, nos dois últimos versos: “Pe<strong>de</strong>-me s<strong>em</strong>pre esmolaum homenzinho idoso, / Meu velho professor nas aulas <strong>de</strong> latim!”, o eu-lírico apresentacom ironia o seu velho professor <strong>de</strong> latim, pedindo-lhe esmolas, o passado pedindoajuda ao presente. No entanto, há uma inversão <strong>de</strong> papéis: é o presente que está<strong>de</strong>ca<strong>de</strong>nte e precisando <strong>de</strong> ajuda.A
83Na seção final do po<strong>em</strong>a, Horas Mortas, a viag<strong>em</strong> noturna do sujeito líricolevou-o até o momento da escuridão mais profunda. As luzes da cida<strong>de</strong> já se apagaramtodas. A noite da cida<strong>de</strong> já não o esmaga <strong>em</strong>bora ainda se sinta enclausurado:O teto fundo <strong>de</strong> oxigênio, <strong>de</strong> ar,Esten<strong>de</strong>-se ao comprido, ao meio das trapeiras;Vêm lágrimas <strong>de</strong> luz dos astros com olheiras,Enleva-se a quimera azul <strong>de</strong> transmigrar.O visualismo da linguag<strong>em</strong> poética intensifica-se e antropomorfiza-se: os astrostêm olheiras e estão cansados <strong>de</strong> chorar lágrimas <strong>de</strong> luz. O <strong>de</strong>sejo do eu-lírico <strong>de</strong> fugirno espaço geográfico <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a primeira seção: Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, omundo - ou no t<strong>em</strong>po histórico – o passado heróico das crônicas navais, acentua-senuma ânsia metafísica <strong>de</strong> quebrar os limites do próprio ser e nas exclamações do poeta:“Por baixo, que portões! Que arruamentos!” É a cida<strong>de</strong> da sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> bloqueada(segunda estrofe) “Um parafuso cai nas lajes, às escuras: / Colocam-se taipais, rang<strong>em</strong>as fechaduras, / E os olhos dum caleche espantam-me, sangrentos.”. Os <strong>de</strong>maispormenores da realida<strong>de</strong> observada confirmam a prisão fantasmagórica da cida<strong>de</strong>, numclima <strong>de</strong> terror. Clima que se quebra ao ouvir o som <strong>de</strong> uma flauta distante, que l<strong>em</strong>braa libertação associada ao campo (quarta estrofe), “Se eu não morresse, nunca! Eeternamente / Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas! / Esqueço-me a prevercastíssimas esposas, / Que aninh<strong>em</strong> <strong>em</strong> mansões <strong>de</strong> vidro transparente!”, levando-o àânsia espiritual da eternida<strong>de</strong> – a libertação da prisão final da morte: Se eu nãomorresse, nunca! E eternamente, / Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!.Na última estrofe da seção: “E, enorme, nesta massa irregular / De prédiossepulcrais, com dimensões <strong>de</strong> montes, / A Dor humana busca os amplos horizontes, / Et<strong>em</strong> marés, <strong>de</strong> fel, como um sinistro mar!”, o eu-lírico está perante o povo, a cida<strong>de</strong>massa irregular, os prédios sepulcrais e o mar. A Dor humana v<strong>em</strong> personificada,procurando saída para a situação. No horizonte o mar também é sinistro, uma saídanebulosa e incerta. Esse anseio da liberda<strong>de</strong>, t<strong>em</strong>a recorrente do po<strong>em</strong>a, é transformadonum programa <strong>de</strong> ação cujo caráter coletivo é acentuado pelo uso enfático do pronomenós. Dentro da cida<strong>de</strong> (ou da estrutura social), a renovação da vitalida<strong>de</strong> criadora é umaesperança imaginária. Cesário Ver<strong>de</strong> no século XIX vê o presente, o mundo que o cerca,e busca no passado inspiração, força para resgatar o momento presente <strong>em</strong> que estáimerso o hom<strong>em</strong> oci<strong>de</strong>ntal ao longo do po<strong>em</strong>a. Assim, o posicionamento <strong>de</strong> Cesário
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