Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste
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sobretudo, o. sentimento de compaixão, a retornar à caverna do inconsciente. Deste modo se reprime a<br />
influência reguladora, não, porém, a reação secreta do inconsciente, que desde então se faz sentir<br />
claramente nos escritos do Filósofo. Primeiramente ele procura seu adversário em Wagner, ao qual ele<br />
não pode perdoar por ter produzido o "Parsifal". Em breve, porém, sua ira se concentra sobre o<br />
Cristianismo e de modo particular sobre Paulo que, sob certos aspectos, passou por semelhante<br />
experiência. Como se sabe, sua psicose o fez identificar-se primeiramente com "Cristo Crucificado" e<br />
depois com o Zagreu esquartejado. Com esta catástrofe, a reação chega até à superfície.<br />
[163] Um outro exemplo é o caso clássico de megalomania que o capítulo quarto do Livro de<br />
Daniel nos conservou. No auge de seu poder, Nabucodonosor teve um sonho que lhe prognosticava<br />
desgraça se não se humilhasse. Daniel interpreta o sonho com consuma<strong>da</strong> perícia, mas o monarca não lhe<br />
dá ouvidos. Os acontecimentos subseqüentes confirmaram sua interpretação, pois Nabucodonosor, depois<br />
de reprimir a influência reguladora do inconsciente, foi vítima de uma psicose que continha precisamente<br />
a reação que ele queria evitar: ele, o senhor do mundo, foi rebaixado à condição de animal.<br />
[164] Um conhecido meu contou-me, certa vez, um sonho que tivera e no qual ele se despenhava<br />
do alto de uma montanha no espaço vazio. Eu lhe dei algumas explicações sobre a influência do<br />
inconsciente e adverti-o de que evitasse qualquer subi<strong>da</strong> perigosa a montanhas. Ele riu-se de minha<br />
observação, e o resultado foi, meses mais tarde, que ele despencou no vazio, sofrendo que<strong>da</strong> mortal.<br />
[165] As pessoas que presenciam estes fatos acontecerem repeti<strong>da</strong>mente sob to<strong>da</strong>s as formas e<br />
gra<strong>da</strong>ções possíveis são obriga<strong>da</strong>s a refletir. Percebem claramente como é fácil ignorar as influências<br />
reguladoras e, por isso, deveriam preocupar-se em não perder de vista a regulação inconsciente, tão<br />
necessária à nossa saúde mental e física. Devem, portanto, procurar aju<strong>da</strong>r-se a si próprias, mediante a<br />
auto-observação e autocrítica; mas a simples auto-observação e a auto-análise intelectual são meios<br />
inteiramente inadequados para estabelecer o contato com o inconsciente. Embora nenhum ser humano<br />
possa poupar-se às experiências más, todos nós temos medo de nos arriscar nelas, especialmente quando<br />
acreditamos vislumbrar uma possibili<strong>da</strong>de de evitá-las. A tendência a evitar prontamente tudo o que nos é<br />
desagradável é de todo legítima. O conhecimento <strong>da</strong>s influências reguladoras pode nos aju<strong>da</strong>r a evitar as<br />
experiências dolorosas que não são necessárias. Não há necessi<strong>da</strong>de de praticar muitos desvios, que se<br />
distinguem, não por uma atração especial, mas por conflitos extenuantes. Cometer erros e desvios em<br />
terreno desconhecido e inexplorado ain<strong>da</strong> se admite, mas extraviar-se em região habita<strong>da</strong> e em plena via é<br />
simplesmente irritante. Alguém pode poupar-se a isto, desde que conheça os fatores reguladores. A<br />
pergunta que se faz aqui é, então: Quais os caminhos e as possibili<strong>da</strong>des de que dispomos para identificar<br />
o inconsciente?<br />
[166] Quando não há produção de fantasias, precisamos apelar para a aju<strong>da</strong> artificial. A razão para<br />
este procedimento é, em geral, um estado de ânimo deprimido ou perturbado para o qual não encontramos<br />
explicação satisfatória. O mau tempo já é suficiente como causa provocadora <strong>da</strong> situação. Mas nenhuma<br />
destas razões apresenta<strong>da</strong>s satisfazem como explicação, pois a explicação causal destes estados na<br />
maioria dos casos só é satisfatória para quem está de fora, e mesmo assim só até certo ponto. Quem está<br />
de fora, contenta-se quando sua necessi<strong>da</strong>de interior de explicação causal é satisfeita. Basta-lhe saber de<br />
onde provém a coisa em questão, pois esta pessoa não sente o desafio que, para o paciente, é a sua<br />
depressão. O paciente gostaria muito mais de que lhe respondessem a questão de como obter a aju<strong>da</strong>, do<br />
que a questão <strong>da</strong> origem ou <strong>da</strong> finali<strong>da</strong>de de seu mal. É na intensi<strong>da</strong>de do distúrbio emocional que<br />
consiste o valor, isto é, a energia que o paciente deveria ter a seu dispor, para sanar o seu estado de<br />
a<strong>da</strong>ptação reduzi<strong>da</strong>. Na<strong>da</strong> conseguimos, reprimindo este estado de depressão ou depreciando-o<br />
racionalmente.<br />
[167] Deve-se tomar, portanto, o estado afetivo inicial como ponto de parti<strong>da</strong> do procedimento, a<br />
fim de que se possa fazer uso <strong>da</strong> energia que se acha no lugar errado. O indivíduo torna-se consciente do<br />
estado de ânimo em que se encontra, nele mergulhando sem reservas e registrando por escrito to<strong>da</strong>s as<br />
fantasias e demais associações que lhe ocorrem. Deve permitir que a fantasia se expan<strong>da</strong> o mais<br />
livremente possível, mas não a tal ponto que fuja <strong>da</strong> órbita de seu objeto, isto é, do afeto, realizando, por<br />
assim dizer, uma interminável cadeia de associações ca<strong>da</strong> vez mais ampla. Esta assim chama<strong>da</strong><br />
"associação livre" desvia o indivíduo de seu objeto, conduzindo-o a todos os tipos de complexos a<br />
respeito dos quais nunca se tem certeza se estão relacionados com o afeto e não são deslocamentos que<br />
surgiram em lugar dele. É desta preocupação com o objeto que provém uma expressão mais ou menos<br />
completa do estado de ânimo que reproduz, de maneira um tanto quanto concreta e simbólica, o conteúdo