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Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

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XIV – PSICOLOGIA ANALÍTICA E COSMOVISÃO 207<br />

[689] É quase impossível traduzir a palavra alemã Weltanschauung em outra língua [em vernáculo<br />

significa aproxima<strong>da</strong>mente cosmovisão ou visão do mundo, que adotaremos na presente seção — N. do<br />

T.]. Isto nos indica que esta palavra possui um caráter psicológico todo próprio: expressa não somente<br />

uma concepção do mundo — significado este fácil de traduzir — mas também o modo como se considera<br />

[anschaut] o mundo [Welt]. A palavra "Filosofia" significa algo de parecido com o conceito de<br />

Weltanschauung, mas é limitado ao campo <strong>da</strong> inteligência, ao passo que Weltanschauung abrange to<strong>da</strong>s<br />

as espécies de atitude em relação ao mundo, inclusive a filosófica. Assim, há Weltanschauungen<br />

(cosmovisões) estéticas, religiosas, idealistas, realistas, românticas, práticas, para só mencionarmos<br />

apenas algumas possíveis. Neste sentido, o conceito expresso por Weltanschauung tem muitos aspectos<br />

em comum com o conceito de "atitude", por isto poderíamos definir Weltanschauung como uma atitude<br />

expressa em conceitos.<br />

[690] Que se deve entender, então, por atitudes? Atitude é um conceito psicológico que designa<br />

uma constelação especial de conteúdos psíquicos, orienta<strong>da</strong> para um fim ou dirigi<strong>da</strong> por uma idéiamestra.<br />

Se compararmos nossos conteúdos psíquicos com um exército, e exprimirmos as várias formas de<br />

atitudes mediante disposições especiais desse mesmo exército, a atenção, por exemplo, seria representa<strong>da</strong><br />

por tropas concentra<strong>da</strong>s em estado de prontidão e cerca<strong>da</strong>s por grupos de reconhecimento. Logo que se<br />

tenha suficiente conhecimento <strong>da</strong> força e <strong>da</strong> posição do inimigo, a disposição <strong>da</strong>s tropas se altera: o<br />

exército começa a se movimentar em direção a um determinado objetivo a ser atacado. A atitude psíquica<br />

se modifica de maneira análoga. Durante o estado de simples atenção a idéia dominante é a alerta: a<br />

própria ativi<strong>da</strong>de mental é reprimi<strong>da</strong> ao máximo, juntamente com outros conteúdos subjetivos. Mas ao se<br />

fazer a passagem para uma atitude ativa, os conteúdos subjetivos aparecem na consciência — conteúdos<br />

estes que consistem em idéias finalistas e impulsos a agir. E <strong>da</strong> mesma forma que um exército tem um<br />

coman<strong>da</strong>nte e seu estado-maior, também a atitude psíquica tem uma idéia-mestra geral que é reforça<strong>da</strong> e<br />

fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong> por um vasto material de experiências, princípios, afetos e outros mais <strong>da</strong> mesma natureza.<br />

[691] Quer dizer, nossas ações não são inteiramente simples, reações isola<strong>da</strong>s, para assim<br />

dizermos, a um determinado estímulo. Pelo contrário, ca<strong>da</strong> uma de nossas reações e ações se processa sob<br />

a influência de fatores psíquicos complicados. Utilizando, de novo, a analogia militar, poderíamos<br />

comparar estes processos com a situação de um quartel-general. Para o sol<strong>da</strong>do ordinário, pareceria que o<br />

exército bateu em retira<strong>da</strong> por ter sido atacado, ou que se lançou um ataque, porque se avistou o inimigo.<br />

Nossa consciência está sempre disposta a desempenhar o papel do sol<strong>da</strong>do comum e a acreditar na<br />

simplici<strong>da</strong>de de suas ações. Na reali<strong>da</strong>de, porém, a luta foi trava<strong>da</strong> neste determinado lugar e neste <strong>da</strong>do<br />

momento, porque havia, já com vários dias de antecedência, um plano geral de ataque que deslocou o<br />

sol<strong>da</strong>do comum para este ponto. E este plano geral, por sua vez, não é simplesmente uma reação a<br />

informes de reconhecimento, mas uma iniciativa criadora do coman<strong>da</strong>nte, condiciona<strong>da</strong> também pela<br />

ação do inimigo e talvez também por considerações políticas inteiramente de natureza não militar e<br />

desconheci<strong>da</strong>s totalmente do sol<strong>da</strong>do comum. Estes últimos fatores são muito complexos e escapam<br />

quase de todo à compreensão do sol<strong>da</strong>do comum, embora possam ser totalmente claros para o<br />

coman<strong>da</strong>nte do exército. Mas há também certos fatores que este último desconhece, quais sejam os seus<br />

condicionamentos pessoais e seus complicados pressupostos. Assim o exército se acha sob um comando<br />

simples e unificado, que é, porém, o resultado <strong>da</strong> operação coordena<strong>da</strong> de fatores infinitamente<br />

complicados.<br />

[692] A ação psíquica se processa também sobre uma base semelhantemente complica<strong>da</strong>. Apesar<br />

<strong>da</strong> aparente simplici<strong>da</strong>de do impulso, ca<strong>da</strong> nuança de seu caráter particular, sua força e sua direção, seu<br />

curso no tempo e no espaço, sua finali<strong>da</strong>de etc, dependem de condições psíquicas especiais, isto é, de uma<br />

atitude que, por sua vez, é constituí<strong>da</strong> por uma constelação de conteúdos cuja multiplici<strong>da</strong>de é quase<br />

incalculável. O eu é o coman<strong>da</strong>nte do exército; suas reflexões e decisões, suas razões e dúvi<strong>da</strong>s, suas<br />

intenções e expectativas são seu estado maior, e sua dependência em relação a fatores externos<br />

corresponde à dependência do coman<strong>da</strong>nte em relação às influências quase incalculáveis do quartelgeneral<br />

e <strong>da</strong>s maquinações políticas que se travam por trás dos bastidores.<br />

207<br />

Conferência pronuncia<strong>da</strong> em Karlsruhe, no ano de 1927. Nova re<strong>da</strong>ção publica<strong>da</strong> em Seelenprobleme der Gegenwart, Psychologische<br />

Abhandlungen III (1931).

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