Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste
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[407] Os opostos são quali<strong>da</strong>des extremas de um determinado estado, graças às quais este estado pode<br />
ser percebido como algo de real, pois formam um potencial energético. A psique consiste em processos<br />
cuja energia pode se originar do equilíbrio entre os mais diversos tipos de opostos. A antítese espíritoinstinto<br />
representa apenas uma <strong>da</strong>s formulações mais comuns que têm a vantagem de reduzir o maior<br />
número possível dos processos psíquicos mais importantes e mais complicados a um denominador<br />
comum. Considerados sob este ângulo, os processos psíquicos parecem ser equilíbrios energéticos entre o<br />
espírito e o instinto, embora a questão de saber se um processo pode ser descrito como espiritual ou<br />
instintivo permaneça totalmente envolta em obscuri<strong>da</strong>de. Esta avaliação ou interpretação depende<br />
inteiramente do ponto de vista ou do estado <strong>da</strong> consciência. Uma consciência pouco desenvolvi<strong>da</strong>, por<br />
ex., que, por causa <strong>da</strong> grande massa de projeções, se acha predominantemente sob a impressão de coisas e<br />
de estados concretos ou aparentemente concretos, considerará os instintos, naturalmente, como fonte <strong>da</strong><br />
reali<strong>da</strong>de. Nesta situação, ela se acha inteiramente inconsciente do caráter espiritual de sua constatação<br />
filosófica e está convenci<strong>da</strong> de que, com sua opinião, determinou a instintivi<strong>da</strong>de essencial dos processos<br />
psíquicos. Inversamente, uma consciência que se acha de algum modo em oposição com os instintos<br />
pode, em conseqüência de uma influência enorme, exerci<strong>da</strong> pelos arquétipos, considerar os instintos de tal<br />
modo subordinados ao espírito, que as mais grotescas complicações "espirituais" podem surgir <strong>da</strong>quilo<br />
que são, indubitavelmente, processos biológicos. Aqui se ignora completamente a instintivi<strong>da</strong>de do<br />
fanatismo necessário para uma operação desta espécie.<br />
[408] Os processos psíquicos, portanto, se comportam como uma escala ao longo <strong>da</strong> qual "desliza" a<br />
consciência. Às vezes a consciência se acha na proximi<strong>da</strong>de dos processos instintivos, e cai sob sua<br />
influência; outras vezes ela se aproxima do outro extremo onde o espírito predomina e até mesmo<br />
assimila os processos instintivos opostos a ele. Estas contraposições não são, de forma alguma,<br />
fenômenos anormais. Pelo contrário, elas formam os dois pólos <strong>da</strong> unilaterali<strong>da</strong>de típica do homem<br />
normal de hoje. Naturalmente, esta unilaterali<strong>da</strong>de se manifesta não só na antítese espírito-instinto, mas<br />
também ain<strong>da</strong> sob muitas outras formas descritas parcialmente em meus “Tipos Psicológicos”.<br />
[409] Esta consciência "deslizante" é inteiramente característica também do homem moderno. A<br />
unilaterali<strong>da</strong>de, porém, que ela provoca é removi<strong>da</strong> por aquilo que eu chamei de "percepção <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de<br />
<strong>da</strong> sombra". Teria sido possível construir facilmente um híbrido greco-latino menos "poético" e de<br />
aspecto mais científico para esta operação. Mas, na Psicologia se desaconselha tal empreendimento por<br />
motivos de ordem prática, pelo menos quando se trata de problemas eminentemente práticos. Entre estes<br />
se inclui a "percepção <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de <strong>da</strong> sombra", um processo de toma<strong>da</strong> de consciência <strong>da</strong> parte inferior<br />
<strong>da</strong> personali<strong>da</strong>de, processo este que não deve ser entendido falsamente no sentido de um fenômeno de<br />
natureza intelectual, porque se trata de uma vivência e de uma experiência que envolvem a pessoa to<strong>da</strong>. A<br />
natureza <strong>da</strong>quilo que se deve tomar consciência e se assimilar, foi expressa muito bem e com tanta<br />
plastici<strong>da</strong>de na linguagem poética pela palavra "sombra", que seria quase presunção não recorrermos a<br />
este patrimônio lingüístico. A própria locução "parte inferior <strong>da</strong> personali<strong>da</strong>de" é inadequa<strong>da</strong> e pode<br />
induzir em erro, ao passo que o termo "sombra" não pressupõe na<strong>da</strong> que determine rigi<strong>da</strong>mente o seu<br />
conteúdo. O "homem sem sombra", com efeito, é o tipo humano estatisticamente mais comum, alguém<br />
que acredita ser apenas aquilo que gostaria de saber a respeito de si mesmo. Infelizmente, nem o chamado<br />
homem religioso nem o homem de mentali<strong>da</strong>de científica constituem exceção a esta regra.<br />
[410] A confrontação com o arquétipo ou com o instinto é um problema ético de primeira ordem,<br />
cuja urgência, porém, só é senti<strong>da</strong> por aquelas pessoas que se vêem em face <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong>de de tomar uma<br />
decisão quanto à assimilação do inconsciente e à integração de sua personali<strong>da</strong>de. Mas esta necessi<strong>da</strong>de<br />
só acomete aqueles que se dão conta de estarem com uma neurose ou de que nem tudo vai bem com sua<br />
constituição psíquica. Mas estes, certamente, não são a maioria. O homem comum, que é<br />
predominantemente o homem <strong>da</strong> massa, em princípio não toma consciência de na<strong>da</strong> nem precisa fazê-lo,<br />
porque, na sua opinião, o único que pode realmente cometer faltas é o grande anônimo,<br />
convencionalmente conhecido como "Estado" ou "Socie<strong>da</strong>de". Mas aquele que tem consciência de que<br />
algo depende de sua pessoa ou pelo menos deveria depender, sente-se responsável por sua própria<br />
constituição psíquica, e tanto mais fortemente, quanto mais claramente se dá conta de como deveria ser,<br />
para se tornar mais saudável, mais estável e mais eficiente. Mas a partir do momento em que se achar a<br />
caminho <strong>da</strong> assimilação do inconsciente, pode ficar certo de que não escapará a nenhuma dificul<strong>da</strong>de que<br />
é uma componente imprescindível de sua natureza. O homem <strong>da</strong> massa, pelo contrário, tem o privilégio<br />
de nunca ser culpado <strong>da</strong>s grandes catástrofes políticas e sociais em que o mundo inteiro se acha