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Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

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quase infinita. Estas imagens reflexas têm o caráter de consciência. A natureza <strong>da</strong> consciência é um<br />

enigma cuja solução eu desconheço. Do ponto de vista puramente formal, contudo, podemos dizer que<br />

um fator psíquico assume a quali<strong>da</strong>de de consciência quando entra em relação com o eu. Se não há esta<br />

relação, o fator permanece inconsciente. O esquecimento nos mostra muito bem quantas vezes e com que<br />

facili<strong>da</strong>de os conteúdos perdem sua ligação com o eu. Por isto, poderíamos comparar a consciência ao<br />

jato de luz emitido por um refletor. Só os objetos situados sob o cone de luz é que entram no campo de<br />

minha percepção. Um objeto que se acha casualmente na escuridão, não deixou de existir; apenas não é<br />

visto. Assim, o fator psíquico de que eu não tenho consciência existe em alguma parte, num estado que,<br />

com to<strong>da</strong> probabili<strong>da</strong>de, não difere essencialmente <strong>da</strong>quele em que é visto pelo eu.<br />

[611] A consciência, portanto, pode ser muito bem entendi<strong>da</strong> como um estado de associação com<br />

o eu. Mas o ponto crítico é o eu. Que entendemos por eu? Apesar <strong>da</strong> aparente uni<strong>da</strong>de do eu, trata-se<br />

evidentemente de um fator altamente compósito e variado, constituído de imagens provin<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s funções<br />

sensoriais que transmitem os estímulos tanto de dentro como de fora; consiste igualmente em um imenso<br />

aglomerado de imagens resultantes de processos anteriores. To<strong>da</strong>s estas componentes sumamente<br />

varia<strong>da</strong>s necessitam de um fator dotado de forte poder de coesão, quali<strong>da</strong>de esta que já identificamos na<br />

consciência. Por isto, parece-me que a consciência é o requisito essencial para o eu. Mas sem o eu, é<br />

impossível pensar em consciência. Esta aparente contradição se resolve, se considerarmos o eu como o<br />

reflexo, não de um só, mas de muitos e variados processos e suas interações, ou seja, <strong>da</strong>queles processos e<br />

conteúdos que compõem a consciência do eu. A sua diversi<strong>da</strong>de forma realmente uma uni<strong>da</strong>de porque a<br />

sua relação com a consciência atua como uma espécie de força gravitacional, atraindo as várias partes na<br />

direção <strong>da</strong>quilo que poderíamos chamar de centro virtual. Por esta razão não falo simplesmente do eu,<br />

mas de um complexo do eu, na suposição fun<strong>da</strong>menta<strong>da</strong> de que o eu tem uma composição flutuante e por<br />

isto é mutável e conseqüentemente não pode ser simplesmente o eu. Infelizmente não posso discutir aqui<br />

as mu<strong>da</strong>nças clássicas do eu que encontramos nos doentes mentais ou nos sonhos.<br />

[612] Esta concepção do eu como um composto de elementos psíquicos nos leva logicamente à<br />

questão: É o eu a imagem central, o representante exclusivo do ser humano global? Todos os conteúdos e<br />

funções estão relacionados com ele e expressos através dele?<br />

[613] Devemos responder negativamente a esta pergunta. A consciência do eu é um complexo que<br />

não abrange o ser humano em sua globali<strong>da</strong>de: ela esqueceu infinitamente mais do que sabe. Ouviu e viu<br />

uma infini<strong>da</strong>de de coisas <strong>da</strong>s quais nunca tomou consciência. Há pensamentos que se desenvolvem à<br />

margem <strong>da</strong> consciência, plenamente configurados e completos, e a consciência os ignora totalmente. O eu<br />

sequer tem uma páli<strong>da</strong> idéia <strong>da</strong> função reguladora e incrivelmente importante dos processos orgânicos<br />

internos a serviço <strong>da</strong> qual está o sistema nervoso simpático. O que o eu compreende talvez seja a menor<br />

parte <strong>da</strong>quilo que uma consciência completa deveria compreender.<br />

[614] O eu, portanto, só pode ser um complexo parcelar. Talvez seja ele aquele complexo singular<br />

e único cuja coesão interior significa a consciência. Mas qualquer coesão <strong>da</strong>s partes psíquicas não é em si<br />

mesma a consciência? Não se vê claramente a razão pela qual a coesão de uma certa parte <strong>da</strong>s funções<br />

sensoriais e de uma certa parte do material de nossa memória deve formar a consciência, enquanto a<br />

coesão de outras partes <strong>da</strong> psique não a forma. O complexo <strong>da</strong> função <strong>da</strong> vista, <strong>da</strong> audição, etc, apresenta<br />

uma forte e bem organiza<strong>da</strong> uni<strong>da</strong>de interior. Não há razão para supor que esta uni<strong>da</strong>de não possa ser<br />

também uma consciência. Como bem nos mostra o caso <strong>da</strong> sur<strong>da</strong>-mu<strong>da</strong> e cega Helen Keller, bastam o<br />

sentido do tato e a sensação corporal para tornar possível a consciência e fazê-la funcionar, embora se<br />

trate de uma consciência limita<strong>da</strong> a estes dois sentidos. Por isto eu acho que a consciência do eu é uma<br />

síntese de várias "consciências sensoriais", na qual a autonomia de ca<strong>da</strong> consciência individual fundiu-se<br />

na uni<strong>da</strong>de do eu dominante.<br />

[615] Como a consciência do eu não abrange to<strong>da</strong>s as ativi<strong>da</strong>des e fenômenos psíquicos, isto é,<br />

não conserva to<strong>da</strong>s as imagens nela registra<strong>da</strong>s, e como a vontade, apesar de todo o seu esforço, não<br />

consegue penetrar em certas regiões fecha<strong>da</strong>s <strong>da</strong> psique, surge-nos naturalmente a questão se não existiria<br />

uma coesão de to<strong>da</strong>s as ativi<strong>da</strong>des psíquicas semelhante à consciência do eu, uma espécie de consciência<br />

superior e mais ampla na qual o nosso eu seria um conteúdo objetivo, como, por exemplo, o ato de ver,<br />

em minha consciência, fundido, como esta, com as outras ativi<strong>da</strong>des inconscientes em uma uni<strong>da</strong>de<br />

superior. A consciência de nosso eu poderia certamente estar encerra<strong>da</strong> numa consciência completa, como<br />

um círculo menor encerrado em um maior.

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