19.05.2013 Views

Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

[585] Sob o ponto de vista psicológico, os espíritos são, portanto, complexos inconscientes<br />

autônomos que aparecem em forma de projeção, porque, em geral, não apresentam nenhuma associação<br />

direta com o eu. 192<br />

[586] Expliquei acima que a crença nas almas é um correlato necessário <strong>da</strong> crença nos espíritos.<br />

Enquanto os espíritos são considerados como estranhos e não fazendo parte do eu, o mesmo não sucede<br />

com relação à alma ou às almas. O primitivo considera como incômo<strong>da</strong> ou perigosa a proximi<strong>da</strong>de ou a<br />

influência de um espírito, e se sente aliviado quando consegue exorcizar o espírito. Por outro lado, porém,<br />

o primitivo considera a per<strong>da</strong> de uma alma como uma doença grave e atribui também qualquer<br />

enfermi<strong>da</strong>de física grave à per<strong>da</strong> <strong>da</strong> alma. Há inúmeros ritos que servem para chamar o pássaro-alma de<br />

volta ao corpo do doente. Não se deve bater nas crianças, porque, do contrário, sua alma poderia ficar<br />

ofendi<strong>da</strong> e retirar-se delas. Para o primitivo, portanto, a alma é algo que lhe pertence e normalmente<br />

deveria estar presente, ao passo que os espíritos lhe parecem estranhos, e normalmente não deveriam ficar<br />

perto dele. Por isto ele evita os lugares freqüentados por espíritos, e quando os visita, é com temor e por<br />

motivos religiosos ou mágicos.<br />

[587] A plurali<strong>da</strong>de <strong>da</strong>s almas implica também uma plurali<strong>da</strong>de de complexos relativamente<br />

autônomos, que podem comportar-se como espíritos. Mas o eu vê os complexos <strong>da</strong>s almas como<br />

formando parte de si próprio, e a per<strong>da</strong> <strong>da</strong> alma como patológica, ao contrário dos complexos dos<br />

espíritos, cuja ligação com o eu provoca a doença, e sua dissociação o restabelecimento. Por isto é que a<br />

patologia primitiva reconhece como fontes <strong>da</strong>s doenças tanto a per<strong>da</strong> <strong>da</strong> alma como a possessão por<br />

espírito. As duas teorias se equivalem mais ou menos. Deveríamos, por conseguinte, postular a existência<br />

de complexos inconscientes que normalmente pertencem ao eu e de complexos que normalmente não<br />

deveriam estar ligados ao eu. Os primeiros são os complexos <strong>da</strong>s almas, e os segundos os complexos dos<br />

espíritos.<br />

[588] Esta distinção familiar à crença primitiva corresponde exatamente ao meu conceito de<br />

inconsciente. Segundo meu ponto de vista, o inconsciente se divide em duas partes rigorosamente<br />

distintas. Uma delas é o chamado inconsciente pessoal, que encerra todos aqueles conteúdos psíquicos<br />

esquecidos no correr <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>. O inconsciente ain<strong>da</strong> conserva traços desses conteúdos, mesmo depois que<br />

se perdeu qualquer lembrança consciente dos mesmos. O inconsciente contém igualmente to<strong>da</strong>s as<br />

impressões ou percepções subliminares que não possuem energia suficiente para alcançar a consciência.<br />

A isto se acrescentam ain<strong>da</strong> as combinações de idéias inconscientes que são muito fracas e por demais<br />

imprecisas para transporem o limiar <strong>da</strong> consciência. Por fim, o inconsciente pessoal abrange também<br />

aqueles conteúdos incompatíveis com a atitude consciente. Trata-se, o mais <strong>da</strong>s vezes, de um grupo<br />

inteiro de conteúdos que nos parecem moral, estética ou intelectualmente inadmissíveis, e que são<br />

reprimidos por causa de sua incompatibili<strong>da</strong>de. Como sabemos, o homem nunca pensa ou sente senão o<br />

que é belo, bom e ver<strong>da</strong>deiro. Mas quando se procura manter uma atitude ideal, reprime-se<br />

automaticamente tudo o que é incompatível com esta atitude. Se, como acontece quase sempre com o<br />

indivíduo diferenciado, uma função, como, por exemplo, o pensamento, se acha particularmente<br />

desenvolvi<strong>da</strong> e, deste modo, domina a consciência, o sentimento é relegado ao segundo plano e em<br />

grande parte mergulha no inconsciente.<br />

[589] O inconsciente pessoal é constituído deste material. A outra parte do inconsciente é o que<br />

chamo de inconsciente impessoal ou coletivo. Como o próprio nome indica, este inconsciente não inclui<br />

nenhum conteúdo pessoal mas apenas conteúdos coletivos, ou aqueles conteúdos que não pertencem<br />

apenas a determinado indivíduo, mas a um grupo de indivíduos e, em geral, a uma nação inteira ou<br />

mesmo to<strong>da</strong> a humani<strong>da</strong>de. Estes conteúdos não foram adquiridos durante a vi<strong>da</strong> do indivíduo; são<br />

produtos de formas inatas e dos instintos. Embora a criança não tenha idéias inatas, possui, contudo, um<br />

cérebro altamente desenvolvido, com possibili<strong>da</strong>des de funcionamento bem defini<strong>da</strong>s. Este cérebro é<br />

her<strong>da</strong>do de seus antepassados. É a sedimentação <strong>da</strong> função psíquica de todos os seus ancestrais. A criança<br />

nasce, portanto, com um órgão que está pronto a funcionar pelo menos <strong>da</strong> mesma maneira como<br />

funcionou através <strong>da</strong> história <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de. É no cérebro que foram pré-formados os instintos e to<strong>da</strong>s as<br />

imagens primordiais que sempre foram a base do pensamento humano, ou seja, portanto, to<strong>da</strong> a riqueza<br />

192 Isto não deve ser entendido como uma afirmação metafísica. Estamos ain<strong>da</strong> bem longe de resolver a questão se os espíritos existem em si<br />

mesmos. A Psicologia não se ocupa com as coisas como elas são em "si mesmas", mas exclusivamente com a maneira como os indivíduos<br />

as imaginam.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!