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Carl Gustav Jung - A Natureza da Psique.pdf - Agricultura Celeste

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sua forma, a função é posta a serviço de outras determinantes ou motivações que aparentemente não têm<br />

mais na<strong>da</strong> a ver com os instintos. O que estou pretendendo explicar é o fato notável de que a vontade não<br />

pode transgredir os limites <strong>da</strong> esfera psíquica: ela não pode coagir o instinto nem tem poder sobre o<br />

espírito, pois por espírito entendemos muito mais do que apenas o intelecto. O espírito e o instinto são<br />

autônomos, ca<strong>da</strong> um segundo sua natureza, e os dois limitam em igual medi<strong>da</strong> o campo de aplicação <strong>da</strong><br />

vontade. Mais adiante mostrarei o que me parece constituir a relação entre o espírito e o instinto.<br />

[380] Da mesma forma que a alma se perde, em seu substrato orgânico e material, em seu domínio<br />

interior, assim também se transmite em uma forma "espiritual" cuja natureza nos é tão pouco conheci<strong>da</strong>,<br />

quanto a base orgânica dos instintos. O que eu chamaria de psique em sentido próprio se estende até<br />

àquele limite em que as funções podem ser influencia<strong>da</strong>s por uma vontade. A pura instintivi<strong>da</strong>de não<br />

permite pensar em consciência, nem precisa de consciência mas, por causa de sua liber<strong>da</strong>de de escolha<br />

empírica, a vontade precisa de uma instância superior, algo semelhante a uma consciência de si mesmo,<br />

para modificar a função. Deve "conhecer" um objetivo diferente <strong>da</strong>quele <strong>da</strong> função, do contrário, ela<br />

coincidiria com a força propulsora <strong>da</strong> função. Driesch enfatiza, com razão: "Não há querer sem o<br />

saber" 63 . A violação pressupõe um sujeito que escolhe e que vê diversas possibili<strong>da</strong>des diante de si.<br />

Encara<strong>da</strong> sob este ângulo, a psique é essencialmente um conflito entre o instinto cego e a vontade (ou<br />

liber<strong>da</strong>de de escolha). Onde predomina o instinto, começam os processos psicóides que pertencem à<br />

esfera do inconsciente como elementos capazes de atingirem o nível <strong>da</strong> consciência. O processo psicóide,<br />

pelo contrário, não se identifica com o inconsciente em si, porque este último tem uma extensão<br />

consideravelmente maior. Além dos processos psicóides, existem no inconsciente representações e atos<br />

volitivos, ou seja, algo parecido com os processos conscientes 64 ; mas na esfera dos instintos estes<br />

fenômenos se retiram tão profun<strong>da</strong>mente para os desvãos <strong>da</strong> psique, que o termo "psicóide"<br />

provavelmente se justifica. Mas se restringirmos a psique aos atos de vontade, chegaremos primeiramente<br />

à conclusão de que a psique se identifica mais ou menos com a consciência, pois dificilmente podemos<br />

conceber uma vontade e uma liber<strong>da</strong>de de escolha sem uma consciência. Isto aparentemente nos leva de<br />

volta ao ponto em que sempre estivemos, ou ao axioma: psique = consciência. Mas onde ficou a natureza<br />

psíquica postula<strong>da</strong> do inconsciente?<br />

E. CONSCIÊNCIA E INCONSCIENTE<br />

[381] Com esta questão relativa à natureza do inconsciente começam as extraordinárias<br />

dificul<strong>da</strong>des intelectuais que a psicologia dos processos inconscientes coloca em nosso caminho. Estas<br />

dificul<strong>da</strong>des surgem inevitavelmente to<strong>da</strong>s as vezes que a mente tenta au<strong>da</strong>ciosamente penetrar no mundo<br />

do desconhecido e do invisível. Nosso Filósofo evitou, com muita habili<strong>da</strong>de, to<strong>da</strong>s as complicações,<br />

simplesmente negando a existência do inconsciente. A mesma coisa se passou também com o físico <strong>da</strong><br />

antiga escola, que acreditava exclusivamente em a natureza ondulatória <strong>da</strong> luz e acabou por descobrir que<br />

existem fenômenos os quais só podem ser explicados pela teoria corpuscular <strong>da</strong> luz. Felizmente, a Física<br />

mostrou aos psicólogos que podemos conviver com uma aparente contradictio in adiecto [contradição nos<br />

termos]. Encorajado por este exemplo, o psicólogo pode, portanto, lançar-se corajosamente à procura <strong>da</strong><br />

solução deste problema controvertido, sem ter a sensação de saltar fora dos trilhos do mundo <strong>da</strong>s Ciências<br />

naturais. Não se trata, evidentemente, de afirmar alguma coisa, mas de construir um modelo que prometa<br />

um questionamento mais ou menos proveitoso. Um modelo não nos diz que uma coisa seja assim ou<br />

assim; ele apenas ilustra um determinado modo de observação.<br />

[382] Antes de examinar mais de perto nosso dilema, eu gostaria de esclarecer um aspecto do<br />

conceito de inconsciente. O inconsciente não se identifica simplesmente com o desconhecido; é antes o<br />

psíquico desconhecido, ou seja, tudo aquilo que, supostamente, não se distinguiria dos conteúdos<br />

psíquicos conhecidos, quando se chegasse à consciência. Além disso, é preciso acrescentar aqui também o<br />

sistema psicóide a respeito do qual na<strong>da</strong> sabemos diretamente. Assim definido, o inconsciente retrata um<br />

estado de coisas extremamente fluido: tudo o que eu sei, mas em que não estou pensando no momento;<br />

tudo aquilo de que um dia eu estava consciente, mas de que atualmente estou esquecido; tudo o que meus<br />

sentidos percebem, mas minha mente consciente não considera; tudo o que sinto, penso, recordo, desejo e<br />

63 Die "Seele" als elementarer Naturfaktor, p. 80. "Estímulos individualizados comunicam... o estado anormal a este 'conhecedor primário',<br />

e então este 'conhecedor' não somente 'quer' uma aju<strong>da</strong>, mas 'conhece' também o que ela seja" (p. 82).<br />

64 Neste contexto eu gostaria de remeter meu leitor à secção F do presente capítulo: "O inconsciente como consciência múltipla".

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