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Roma e as sociedades - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ

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Os <strong>as</strong>pectos sociais e i<strong>de</strong>ológicos <strong>de</strong>st<strong>as</strong> medid<strong>as</strong> se encontram largamente envolvidos na<br />

conquista expansionista romana e caracterizaram elementos fun<strong>da</strong>mentais para compreensão do processo<br />

<strong>de</strong> romanização e, por conseguinte, <strong>da</strong> “escola” <strong>de</strong> romani<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Posto isso, Sertório, <strong>de</strong> acordo com Plutarco e com os registros arqueológicos, reuniu na ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>nomina<strong>da</strong> Huesca (na Hispania Citerior) uma gama <strong>de</strong> professores formados em conhecimentos grecoromanos,<br />

com o discurso <strong>de</strong> formar “os filhos dos personagens mais distintos” para futuramente ingressarem<br />

na política, o que nem sempre acontecia com tanta facili<strong>da</strong><strong>de</strong>. O resultado <strong>de</strong>sta política era um gran<strong>de</strong><br />

numero <strong>de</strong> pais satisfeitos com o “bom trato” <strong>de</strong> seus filhos, facilitando <strong>as</strong>sim <strong>as</strong> relações e negociações<br />

culturais e i<strong>de</strong>ológic<strong>as</strong>: El trato <strong>da</strong>do a los niños fue <strong>de</strong>cisivo para captar su voluntad. Pues, reuniendo en<br />

Huesca, gran ciu<strong>da</strong>d, a los hijos <strong>de</strong> los personajes más distinguidos, les puso maestros expertos en todo tipo<br />

<strong>de</strong> conocimientos giegos y romanos; en la práctia, los mantenía como rehenes. Decía que eran instruidos<br />

para que participaran en la política y en el gobierno cuando llegaran a ser mayores(i<strong>de</strong>m).<br />

Dessa forma, a criação <strong>de</strong> uma “escola” <strong>de</strong> romani<strong>da</strong><strong>de</strong> perp<strong>as</strong>sa por vários ângulos e mecanismos<br />

<strong>de</strong>ste processo. Primeiramente, po<strong>de</strong>-se ressaltar a própria organização social dos nativos, uma vez que<br />

quem provavelmente possuía acesso a esta instituição era a elite provincial; evi<strong>de</strong>nciando um fenômeno<br />

expressivamente heterogêneo. Além disso, códigos culturais distintos são postos em contato, ain<strong>da</strong> que haja<br />

um enaltecimento d<strong>as</strong> virtu<strong>de</strong>s e <strong>da</strong> civit<strong>as</strong> romana. I<strong>de</strong>ntificamos, então, alguns elementos <strong>de</strong> romanização<br />

presentes na dinâmica <strong>de</strong>sta “escola”, tais como: a produção intelectual, a própria educação greco-romana,<br />

alianç<strong>as</strong> polític<strong>as</strong>, a organização administrativa, a religião, <strong>as</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s locais e sua relação com a romana,<br />

o surgimento <strong>de</strong> novos grupos sociais e a propagan<strong>da</strong> política presente n<strong>as</strong> moed<strong>as</strong>.<br />

A relevância <strong>da</strong> moe<strong>da</strong> <strong>de</strong> Sertório encontra<strong>da</strong> próximo à ci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Huesca é <strong>de</strong>stacável. Sabe-se<br />

que <strong>as</strong> moed<strong>as</strong> constituíam um dos principais veículos <strong>de</strong> propagan<strong>da</strong> política na antigui<strong>da</strong><strong>de</strong>. Sendo <strong>as</strong>sim,<br />

a representação do nosso personagem em mol<strong>de</strong>s romanos, faz-nos pensar na postura <strong>de</strong>scrita por Plutarco:<br />

o patriota disposto a retornar a <strong>Roma</strong> e a adotar <strong>da</strong>d<strong>as</strong> lógic<strong>as</strong> <strong>de</strong> fins <strong>da</strong> República <strong>Roma</strong>na. Por outro lado,<br />

esta cunhagem po<strong>de</strong> expressar po<strong>de</strong>r, resistência e força contra um inimigo comum, <strong>Roma</strong>.<br />

Assim, Plutarco nos chama a atenção para <strong>as</strong> já tão falad<strong>as</strong> troc<strong>as</strong> culturais que po<strong>de</strong>m ser<br />

percebid<strong>as</strong> em du<strong>as</strong> manifestações muito significativ<strong>as</strong>, que consagravam os dois lados <strong>de</strong>ssa relação<br />

bilateral. Por um lado, Sertório transmitia traços do “ser romano” por via do adornamento dos escudos, do<br />

oferecimento <strong>de</strong> túnic<strong>as</strong> púrpur<strong>as</strong> e <strong>de</strong> bul<strong>as</strong> roman<strong>as</strong>, além <strong>da</strong> entrega do ouro como recompensa aos<br />

melhores. Por outro lado, <strong>as</strong> tradições ibéric<strong>as</strong> também foram muito marcantes, <strong>de</strong>stacando-se<br />

principalmente a consagração coletiva dos chefes <strong>de</strong>votos a Sertório, sendo este escolhido como o chefe<br />

hispano. Se conta que ao dirigir-se a uma ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, buscando um confronto com um inimigo muito próximo, os<br />

hispanos salvaram Sertorio, sem p<strong>as</strong>sar em si mesmos, p<strong>as</strong>sando-o <strong>de</strong> um para outro sobre seus ombros até<br />

coloca-lo sobre a muralha. Quando seu chefe estava seguro, ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>les correu(i<strong>de</strong>m).<br />

Portanto, a escola <strong>de</strong> romani<strong>da</strong><strong>de</strong> sertoriana constituiu-se em um forte discurso frente aos hispanos,<br />

possibilitando um maior controle social e a diminuição <strong>de</strong> resistência graç<strong>as</strong> à elaboração <strong>de</strong> um sentimento<br />

<strong>de</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> calcado na luta contra um inimigo comum. Com isso, a criação <strong>de</strong> tal escola, em um contexto<br />

<strong>de</strong> guerrilha, <strong>as</strong>sumiu um papel chave no transcorrer <strong>as</strong> <strong>de</strong>cisões polític<strong>as</strong>, militares, econômic<strong>as</strong> e<br />

simbólic<strong>as</strong>; favorecendo uma dominação consenti<strong>da</strong>, <strong>de</strong> acordo com os pressupostos <strong>de</strong> Gramsci.<br />

O setor político foi alvo <strong>de</strong> inúmer<strong>as</strong> modificações, <strong>as</strong> quais foram negociad<strong>as</strong> entre Sertório e os<br />

nativos. A formação do Senado com senadores fugidos <strong>de</strong> <strong>Roma</strong>, “conforme a normativa <strong>de</strong> sua pátria” foi um<br />

dos <strong>as</strong>pectos mais marcantes <strong>de</strong>sta relação. Um ponto muito notável <strong>de</strong> tal negociação é a carga i<strong>de</strong>ológica<br />

que ela carrega, uma vez que uma mu<strong>da</strong>nça como esta é vista como fruto <strong>da</strong> “magnanimi<strong>da</strong><strong>de</strong>” do homem<br />

que, por um lado, enaltece a civit<strong>as</strong> e <strong>as</strong> virtu<strong>de</strong>s roman<strong>as</strong> em oposição à “barbárie”. Por outro lado, compõe<br />

a figura que agora luta ao lado dos hispanos contra <strong>Roma</strong>, ain<strong>da</strong> que os interesses sejam diversos e que o<br />

patriotismo <strong>de</strong> Sertório seja algo patente.<br />

Já a formação do exercito fora altera<strong>da</strong>, p<strong>as</strong>sando-se <strong>de</strong> um grupo, segundo Plutarco, <strong>de</strong><br />

“bandoleiros”, “bárbaros”, “furiosos” e “selvagens” à formação arma<strong>da</strong> e organiza<strong>da</strong> semelhante à romana.<br />

Ressalto que a alteração na estrutura do exercito é b<strong>as</strong>tante significativa, uma vez que em muitos povos <strong>da</strong><br />

Hispania a formação do governo era um reflexo d<strong>as</strong> formações tribais e <strong>de</strong> guerrilha.<br />

O setor econômico, por sua vez, também foi alvo <strong>de</strong>ste “romanizador” e “patriota”. Isto porque ele se<br />

serviu <strong>de</strong> arm<strong>as</strong>, riquez<strong>as</strong> e ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s dos nativos, sem permitir a eles alt<strong>as</strong> ou <strong>de</strong>stacad<strong>as</strong> responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s.

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