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Roma e as sociedades - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ

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A PRESENÇA DA PAIDEÍA HELENÍSTICA NA EDUCAÇÃO ROMANA.<br />

Vanessa Ferreira <strong>de</strong> Sá Co<strong>de</strong>ço - UFRJ/ FCS/LHIA<br />

Esta comunicação objetiva-se a analisar <strong>as</strong> presenç<strong>as</strong> <strong>da</strong> pai<strong>de</strong>ía helenística na educação romana.<br />

Procuraremos <strong>de</strong>monstrar, <strong>de</strong> forma sucinta, <strong>as</strong> principais aproximações e distanciamentos entre os dois<br />

sistem<strong>as</strong> <strong>de</strong> instrução e <strong>de</strong> que forma a pai<strong>de</strong>ía helênica contribuiu <strong>de</strong>cisivamente para mu<strong>da</strong>nç<strong>as</strong> na<br />

educação romana.<br />

A palavra grega utiliza<strong>da</strong> para <strong>de</strong>signar educação ou instrução é pai<strong>de</strong>ía que significa “criação <strong>de</strong><br />

meninos”. Os gregos <strong>de</strong>ram o nome <strong>de</strong> pai<strong>de</strong>ía a tod<strong>as</strong> <strong>as</strong> form<strong>as</strong>, criações espirituais e ao tesouro completo<br />

<strong>da</strong> sua tradição. Traduzimos o termo pai<strong>de</strong>ía com o emprego <strong>de</strong> expressões mo<strong>de</strong>rn<strong>as</strong> como civilização,<br />

tradição, literatura, ou educação; nenhuma <strong>de</strong>l<strong>as</strong> coincidindo, porém, com o que os gregos entendiam por<br />

pai<strong>de</strong>ía. O termo é atrelado a tod<strong>as</strong> ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s ligad<strong>as</strong> à cultura helênica num modo geral(JAEGER, 1995,<br />

p.1).<br />

Segundo Marrou, mais do que um processo educacional realizado em espaços próprios e em um<br />

<strong>de</strong>terminado tempo <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> do ci<strong>da</strong>dão, pai<strong>de</strong>ía estaria <strong>as</strong>sociado para muito além. Neste c<strong>as</strong>o, seria mais do<br />

que os anos tidos como escolares, se esten<strong>de</strong>ndo para to<strong>da</strong> a vi<strong>da</strong> <strong>da</strong>quele ci<strong>da</strong>dão. Na sua abrangência, o<br />

conceito <strong>de</strong> pai<strong>de</strong>ía não <strong>de</strong>signa unicamente a técnica própria para, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> cedo, preparar a criança para a<br />

vi<strong>da</strong> adulta. A ampliação do conceito fez com que ele p<strong>as</strong>s<strong>as</strong>se também a <strong>de</strong>signar o resultado do processo<br />

educativo que se prolonga por to<strong>da</strong> vi<strong>da</strong> (MARROU, 1966, p.158).<br />

Dentro <strong>de</strong>sta vertente <strong>de</strong> Marrou, interessa-nos aqui não só a educação entendi<strong>da</strong> num sentido<br />

estrito, que ocorre n<strong>as</strong> instituições escolares especific<strong>as</strong> dos atenienses (ginásios, palestr<strong>as</strong>, estádios), com a<br />

finali<strong>da</strong><strong>de</strong> explícita <strong>de</strong> instrução e ensino. M<strong>as</strong>, também, <strong>as</strong> prátic<strong>as</strong> cívic<strong>as</strong> que em muito são em certa<br />

medi<strong>da</strong> educativ<strong>as</strong>. Neste sentido, esten<strong>de</strong>mos os lugares <strong>de</strong> instrução aos espaços <strong>da</strong> agorá (a praça<br />

pública), ao banquete, ao teatro, a pnýx, a <strong>as</strong>sembléia, aos festivais religiosos e <strong>as</strong> competições esportiv<strong>as</strong>.<br />

N<strong>as</strong> obr<strong>as</strong> <strong>de</strong> Aristóteles e Platão, escrit<strong>as</strong> no final do Período Clássico (ou seja, num momento <strong>de</strong><br />

crise dos valores polía<strong>de</strong>s) percebemos que tanto a educação, quanto a ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia, eram prerrogativ<strong>as</strong> <strong>de</strong><br />

poucos. Por um extenso e completo processo educacional, <strong>de</strong>scrito pelos autores, teríamos a formação <strong>de</strong><br />

um ci<strong>da</strong>dão virtuoso, capaz do exercício político e social na pólis. O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong>lineado <strong>de</strong> ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia estava<br />

diretamente ligado ao conceito do que era a própria pólis, uma koinonía politiké, como Aristóteles nos mostra<br />

(ARISTÓTELES. Política. I, 1252 a). Essa ligação com a coisa pública <strong>da</strong> pólis refletia-se no i<strong>de</strong>al dos filhos<br />

dos ci<strong>da</strong>dãos, que tinham em mente que ser homem significava ser marido e pai, m<strong>as</strong>, sobretudo ser um<br />

(futuro) ci<strong>da</strong>dão capaz <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r sua pólis e <strong>de</strong> conduzi-la politicamente.<br />

O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> educação ateniense supunha um conjunto complexo <strong>de</strong> estudos que iriam <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os<br />

sete aos vinte anos, consistindo em prátic<strong>as</strong> intelectuais (como escrita e leitura), prátic<strong>as</strong> físic<strong>as</strong> (esportes e<br />

caça), militares (efebia), além dos valores éticos que eram necessários à convivência na pólis (MOSSÉ, 2004,<br />

pp.107-108). O objetivo <strong>da</strong> pai<strong>de</strong>ía ateniense era alcançar um i<strong>de</strong>al, buscando a harmonia entre o corpo e a<br />

mente e levando o ci<strong>da</strong>dão a alcançar a areté (excelência, virtu<strong>de</strong>).<br />

O processo <strong>de</strong> instrução ático procurava respeitar <strong>de</strong>terminad<strong>as</strong> etap<strong>as</strong>, tais como: o ensino dos<br />

mitos, d<strong>as</strong> letr<strong>as</strong>, <strong>da</strong> matemática, <strong>da</strong> música e, minimamente, d<strong>as</strong> prátic<strong>as</strong> esportiv<strong>as</strong>, durante a infância. Já<br />

na adolescência, encontramos um aprofun<strong>da</strong>mento no ensino d<strong>as</strong> letr<strong>as</strong>, <strong>da</strong> música, <strong>da</strong> matemática e uma<br />

ênf<strong>as</strong>e nos esportes, sendo estes <strong>as</strong>sociados a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciação numa vi<strong>da</strong> civiliza<strong>da</strong>, separando os<br />

gregos dos bárbaros pelos seus valores éticos, como a força, a virili<strong>da</strong><strong>de</strong>, a coragem, a nu<strong>de</strong>z, a agili<strong>da</strong><strong>de</strong>, a<br />

honra e o próprio exercício d<strong>as</strong> mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s esportiv<strong>as</strong> (LESSA, 2001, p.22).<br />

Esta instrução, que era ci<strong>da</strong>dã, ocorria nos ginásios. Ela colocava o jovem em contato com outros<br />

adolescentes e com atlet<strong>as</strong> mais velhos. Dest<strong>as</strong> relações adviria não só <strong>as</strong> prátic<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> a própria tradição<br />

perp<strong>as</strong>sa<strong>da</strong> para além <strong>de</strong> pai para filho, m<strong>as</strong> entre isoí, colocando o jovem em contato com to<strong>da</strong> a cultura<br />

polía<strong>de</strong> e acarretando num <strong>de</strong>senvolvimento sócio-cultural do adolescente.<br />

Todo o mo<strong>de</strong>lo educacional ateniense visava à construção e manutenção <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> do ci<strong>da</strong>dão<br />

grego e ático <strong>de</strong> uma forma específica. Neste sentido, temos o que seria um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> educação<br />

configurado pelos filósofos e que visava aten<strong>de</strong>r às necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong>sses valores <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

helênica/ática.

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