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Roma e as sociedades - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ

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cima tanto dos gigantes quanto <strong>de</strong> Loge, empunhando sua mortífera arma, sendo <strong>de</strong>tido por Wotan, que por<br />

sua vez é obrigado a cumprir seus acordos <strong>de</strong> paz, como atestam <strong>as</strong> run<strong>as</strong> gravad<strong>as</strong> em sua lança.<br />

Odin/Wotan é o lí<strong>de</strong>r do panteão, sendo portanto a divin<strong>da</strong><strong>de</strong> mais importante. Juntamente com seus<br />

irmãos Vili e Vé (todos filhos <strong>de</strong> Bor, o homem que surgiu <strong>da</strong> neve), após matar e esquartejar o gigante<br />

primordial Ymir, construiu o universo com su<strong>as</strong> partes. Eles criaram também o primeiro homem e a primeira<br />

mulher após terem formado o mundo, como po<strong>de</strong> ser verificado na Ed<strong>da</strong> em prosa: "quando costeavam os<br />

mares, os filhos <strong>de</strong> Bor encontraram e cortaram du<strong>as</strong> árvores, criando <strong>as</strong>sim os homens. O primeiro [dos<br />

filhos <strong>de</strong> Bor] <strong>de</strong>u-lhes espírito e vi<strong>da</strong>; o segundo, conhecimento e movimento; e o terceiro, forma, fala,<br />

audição e visão. Eles <strong>de</strong>ram-lhes também nomes e vestiment<strong>as</strong>. O homem foi chamado Ask e a mulher,<br />

Embla. Deles proveio a raça dos homens, a qual fora <strong>da</strong><strong>da</strong> Midgard como mora<strong>da</strong>."( STURLUSON, S. Op.<br />

cit., p. 58. )<br />

Um fato interessante é que na própria forja do homem a guerra está presente. Ask significa freixo,<br />

uma árvore cuja ma<strong>de</strong>ira era largamente utiliza<strong>da</strong> na construção <strong>de</strong> arm<strong>as</strong>, como por exemplo o arco longo e<br />

o cabo d<strong>as</strong> lanç<strong>as</strong>. Na mitologia grega, a natureza bélica do homem po<strong>de</strong> ser vista no mito d<strong>as</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong>s,<br />

narrado por Hesíodo em Os trabalhos e os di<strong>as</strong>: "E Zeus Pai, terceira, outra raça <strong>de</strong> homens mortais criou<br />

em na<strong>da</strong> se <strong>as</strong>semelhando à argêntea; era do freixo, terrível e forte, e lhe importavam <strong>de</strong> Ares obr<strong>as</strong><br />

gementes e violênci<strong>as</strong>."(HESÍODO. 1996, p.33.) Aqui Hesíodo se refere à raça <strong>de</strong> bronze, a terceira estirpe<br />

humana. Esses homens eram extremamente violentos, acometidos pela hýbris bélica: "os homens <strong>da</strong> i<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> bronze pertencem a uma raça que não come pão, quer dizer, são <strong>de</strong> uma i<strong>da</strong><strong>de</strong> que não se ocupa com o<br />

trabalho <strong>da</strong> terra. Não são aniquilados por Zeus, m<strong>as</strong> sucumbem na guerra, uns sob os golpes dos outros,<br />

domados 'por seus próprios braços', isto é, por sua própria força física."( BRANDÃO. 1988, p. 174.)<br />

Odin possui uma lança, cujo nome é Gungnir. De acordo com uma versão do mito, ela foi feita <strong>de</strong> um<br />

galho <strong>de</strong> Iggdr<strong>as</strong>il, o freixo do mundo, árvore que para os escandinavos e germanos era o sustentáculo do<br />

cosmo. A divin<strong>da</strong><strong>de</strong>, logo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar com Mímir, o <strong>de</strong>us <strong>da</strong> sabedoria, o seu olho esquerdo como<br />

pagamento por ter bebido <strong>da</strong> sua fonte (8), teria arrancado um galho <strong>da</strong> árvore sagra<strong>da</strong> e feito uma lança com<br />

ele, arma com a qual se automutilou. No Hávamál, poema constante <strong>da</strong> Ed<strong>da</strong> poética, "Odhinn conta como<br />

obteve a runa, símbolo <strong>da</strong> sabedoria e do po<strong>de</strong>r mágicos. Suspenso durante nove noites na árvore Yggdr<strong>as</strong>il,<br />

'ferido pela lança e sacrificado a Odhinn, eu mesmo sacrificado a mim mesmo, sem alimento nem bebi<strong>da</strong>, eis<br />

que a runa, ao meu chamado, se revelou'. Obtém <strong>as</strong>sim a ciência oculta e o dom <strong>da</strong> poesia. Trata-se, sem<br />

dúvi<strong>da</strong>, <strong>de</strong> um rito <strong>de</strong> iniciação <strong>de</strong> estrutura paraxamânica. Odhinn permanece enforcado na árvore cósmica.<br />

[...] Ferindo-se a si mesmo com a lança, abstendo-se <strong>de</strong> água e <strong>de</strong> alimento, o <strong>de</strong>us sofre a morte ritual e<br />

adquire a sabedoria <strong>de</strong> tipo iniciático."( ELIADE, 1983, p. 177-178.)<br />

Uma outra variante diz que a lança teria sido forja<strong>da</strong> por anões(9), os filhos <strong>de</strong> Ivald, e era mágica, ou<br />

seja, tinha o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> sempre atingir o alvo. Quando Odin partia para a guerra com seu elmo <strong>de</strong> ouro e sua<br />

resplan<strong>de</strong>cente armadura, Gungnir estava sempre com ele, já que era o símbolo <strong>de</strong> sua força e po<strong>de</strong>r (<strong>as</strong><br />

lanç<strong>as</strong> eram, em algum<strong>as</strong> oc<strong>as</strong>iões, <strong>as</strong>sociad<strong>as</strong> a meteoros, que por sua vez simbolizavam ameaç<strong>as</strong> <strong>de</strong><br />

guerra). Tanto a força quanto o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> Odin estavam garantidos em função dos acordos que ele fazia com<br />

seus adversários. Esses pactos eram gravados com caracteres rúnicos em sua lança.<br />

De acordo com o mito, Odin/Wotan subjugou os gigantes <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> uma sangrenta guerra. Após a<br />

vitória, fez com os dois únicos sobreviventes, F<strong>as</strong>olt e Fafner, um acordo <strong>de</strong> paz: eles construiriam um c<strong>as</strong>telo<br />

inexpugnável, o Valhalla e, em troca, o <strong>de</strong>us lhes <strong>da</strong>ria Freia, a <strong>de</strong>i<strong>da</strong><strong>de</strong> do amor e <strong>da</strong> beleza. Pressionado<br />

por Fricka, sua esposa e, na ópera <strong>de</strong> Wagner, irmã <strong>de</strong> Freia, Wotan recua ao se ver cobrado pelos gigantes,<br />

intimando-os secamente a escolher outro pagamento que não seja a <strong>de</strong>usa do amor. F<strong>as</strong>olt começa então a<br />

expor os <strong>de</strong>talhes <strong>da</strong> sua concepção <strong>de</strong> justiça e <strong>da</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> realização do contrato: "Tu, filho <strong>da</strong> luz,<br />

que era fácil <strong>de</strong> persuadir, escuta e tenha cui<strong>da</strong>do: mantém-te fiel a teu pacto! O que és o és graç<strong>as</strong> aos<br />

pactos. Tens quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s para o po<strong>de</strong>r e o dispens<strong>as</strong> bem. Nos ganha em <strong>as</strong>túcia e inteligência, e nos<br />

obrig<strong>as</strong>te, a nós que éramos livres, a manter a paz. M<strong>as</strong> amaldiçôo todo teu o saber e renuncio à tua paz, se<br />

não sabes ou não po<strong>de</strong>s aceitar, <strong>de</strong> maneira nobre e livre, como manter-te fiel a um pacto. Um gigante<br />

estúpido te dá este conselho: tu, sábio apren<strong>de</strong>-o <strong>de</strong> mim."( WAGNER, R. março <strong>de</strong> 2001, p. 20.)<br />

Estamos aqui diante <strong>de</strong> um conflito que foi regulamentado nos mol<strong>de</strong>s do antigo direito germânico, tal<br />

como atesta Michel Foucault: "o direito germânico não opõe a guerra à justiça, não i<strong>de</strong>ntifica justiça e paz.<br />

M<strong>as</strong> ao contrário, supõe que o direito não seja diferente <strong>de</strong> uma forma singular e regulamenta<strong>da</strong> <strong>de</strong> conduzir<br />

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