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Roma e as sociedades - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ

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HIEROFANIAS CONSTANTINIANAS: A TEOLOGIA POLÍTICA DE CONSTANTINO I<br />

Diogo Pereira <strong>da</strong> Silva – LHIA/IFCS/UFRJ<br />

Nesta comunicação buscamos apresentar <strong>as</strong> consi<strong>de</strong>rações iniciais sobre <strong>as</strong> hierofani<strong>as</strong> na vi<strong>da</strong> do<br />

Imperador Constantino I, o Gran<strong>de</strong> (306-337), presentes no Panegírico Latino VII (VI); na Vi<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

Constantino, <strong>de</strong> Eusébio <strong>de</strong> Cesaréia; e em Sobre a Morte dos Perseguidores, <strong>de</strong> Lactâncio. A partir <strong>de</strong>ssa<br />

reali<strong>da</strong><strong>de</strong> documental textual, que inclui textos <strong>de</strong> origem politeísta e cristã, e <strong>de</strong> seus autores, traçaremos<br />

pon<strong>de</strong>rações sobre o papel d<strong>as</strong> hierofani<strong>as</strong> na teologia política <strong>de</strong> Constantino.<br />

Esta comunicação se origina d<strong>as</strong> reflexões do projeto que <strong>de</strong>senvolvo sob orientação <strong>da</strong> Profª. Drª.<br />

Norma Musco Men<strong>de</strong>s, no âmbito do LHIA, no qual me proponho analisar os caracteres legitimatórios, e a<br />

construção <strong>da</strong> imagem do Imperador Constantino I, levantando a hipótese <strong>da</strong> “legitimação multifaceta<strong>da</strong>”,<br />

uma característica própria <strong>de</strong>ste governo, a qual seria a conjugação <strong>de</strong> caracteres cristãos e politeíst<strong>as</strong><br />

(pagãos), sendo um <strong>de</strong>senvolvimento do novo momento vivido pelo Império <strong>Roma</strong>no após <strong>as</strong> transformações<br />

estruturais sofrid<strong>as</strong> a partir <strong>de</strong> inícios do III século (ALFÖLDY, 1989,172 ss). Neste projeto objetivo estu<strong>da</strong>r a<br />

construção <strong>da</strong> imagem <strong>de</strong> Constantino I a partir dos discursos dos agentes integrados à propagan<strong>da</strong> imperial,<br />

seja cristãos ou politeíst<strong>as</strong>, relacionando-os com a documentação <strong>de</strong> cultura material, como os marcos<br />

arquitetônicos, <strong>as</strong> epígrafes e <strong>as</strong> moed<strong>as</strong>, objetos <strong>de</strong> comunicações anteriores.<br />

Por hierofania seguimos os estudos <strong>de</strong> Mircea Elia<strong>de</strong>, para o qual esta é algo <strong>de</strong> sagrado que se<br />

nos revela, seria a “a manifestação <strong>de</strong> algo ‘<strong>de</strong> or<strong>de</strong>m diferente’ – <strong>de</strong> uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong> que não pertence ao<br />

nosso mundo – em objetos que fazem parte integrante do nosso mundo ‘natural’, ‘profano’” (ELIADE: 1999,<br />

17). Sendo a hierofania, na concepção <strong>de</strong> Elia<strong>de</strong>, uma genuína manifestação <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r, uma vez que o<br />

sagrado, representando algo que não pertence ao domínio do natural, visível e sensível, encontra-se,<br />

saturado <strong>de</strong> ser, <strong>de</strong> potência, <strong>de</strong> ação criadora, que é coloca<strong>da</strong> em movimento para produzir a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

garantir a sua perpetuação.<br />

Segundo Gilvan <strong>da</strong> Silva, “o sagrado é uma categoria pertencente por excelência ao âmbito <strong>da</strong><br />

experiência religiosa, razão pela qual, os contornos sagrados do po<strong>de</strong>r po<strong>de</strong>m ser mais bem observados em<br />

<strong>socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s</strong> n<strong>as</strong> quais <strong>as</strong> prátic<strong>as</strong> e concepções religios<strong>as</strong> encontra-se <strong>de</strong> tal modo internalizad<strong>as</strong> que se<br />

torna impossível conceber o exercício do po<strong>de</strong>r político sem que este <strong>de</strong> algum modo esteja <strong>as</strong>sociado com a<br />

religião, a exemplo do que acontece n<strong>as</strong> <strong>socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s</strong> antig<strong>as</strong> n<strong>as</strong> quais o Estado, seja ele representado pela<br />

comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> dos ci<strong>da</strong>dãos ( a ciuit<strong>as</strong> ou a politeia) ou por um chefe excepcional, é tido como a materialização<br />

<strong>da</strong> transcendência, a totali<strong>da</strong><strong>de</strong> que institui a or<strong>de</strong>m e fixa a permanência <strong>de</strong> tudo o que é justo, propício e<br />

<strong>de</strong>sejável” (SILVA: 2003,100-101).<br />

Como norteamento teórico, em nosso esboço, nos utilizaremos <strong>da</strong> categoria realeza sagra<strong>da</strong> para<br />

enten<strong>de</strong>r os componentes simbólicos <strong>da</strong> soberania exerci<strong>da</strong> pelo imperador. Esta categorização, segundo<br />

Gilvan <strong>da</strong> Silva emb<strong>as</strong>a-se em três princípios fun<strong>da</strong>mentais (SILVA: 2003, 102): (1) aquilo que po<strong>de</strong>ríamos<br />

<strong>de</strong>finir como teologia política, ou seja, a concepção <strong>de</strong> que o regime político (no c<strong>as</strong>o a monarquia) reproduz<br />

em alguma medi<strong>da</strong> o que ocorre n<strong>as</strong> esfer<strong>as</strong> celestes ou foi <strong>da</strong>do a conhecer aos homens por intermédio d<strong>as</strong><br />

potesta<strong>de</strong>s sobrenaturais e que a legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> do rei para governar é <strong>de</strong> origem sobrenatural; (2) a ação do<br />

soberano em face do sagrado, o seu direito <strong>de</strong> intervir em <strong>as</strong>suntos religiosos ao mesmo tempo em que se<br />

incumbe d<strong>as</strong> taref<strong>as</strong> ordinári<strong>as</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa e <strong>de</strong> justiça; (3) a existência <strong>de</strong> todo um repertório <strong>de</strong> atributos<br />

visíveis e invisíveis que expressem a inserção do soberano no mundo divino.<br />

Contextualizando nosso objeto, o Império <strong>Roma</strong>no <strong>da</strong> época <strong>de</strong> Constantino apresenta-se-nos como<br />

resultante d<strong>as</strong> profund<strong>as</strong> transformações que ocorreram no século III. No período <strong>de</strong> meio século anterior à<br />

<strong>as</strong>censão <strong>de</strong> Diocleciano (284-305), cerca <strong>de</strong> vinte imperadores governaram o Império. A profun<strong>da</strong><br />

preocupação com <strong>as</strong> fronteir<strong>as</strong> e o <strong>de</strong>clínio <strong>da</strong> influência senatorial encorajou um clima no qual vários<br />

generais, animados com seus sucessos militares, foram compelidos à púrpura.<br />

Poucos imperadores conseguiram diminuir o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> seus generais, Valeriano dividiu o Império<br />

com seu filho Galieno, não apen<strong>as</strong> para garantir a sucessão, m<strong>as</strong> também para prover o Império <strong>de</strong> uma<br />

li<strong>de</strong>rança eficaz em ca<strong>da</strong> fronte. Na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 270, Aureliano (270-275) cunhou moed<strong>as</strong> que continham a<br />

legen<strong>da</strong> DEO ET DOMINO NATO (Cohen, v. VI. 200), em um esforço <strong>de</strong> elevar-se ante aos generais e <strong>da</strong><br />

população em geral, <strong>de</strong>monstrando <strong>as</strong>sim <strong>de</strong> modo incisivo, que a práxis política escapa por completo a<br />

qualquer ingerência humana, sendo <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> tão-somente por fatores extramun<strong>da</strong>nos.<br />

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