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Roma e as sociedades - Núcleo de Estudos da Antiguidade - UERJ

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Licínio “transtornado” é uma clara referência ao conflito entre ele e Constantino, e uma “pequena<br />

perseguição” narra<strong>da</strong> por Eusébio, que teria sido realiza<strong>da</strong> por Licínio, em represália à conduta pró-cristã <strong>de</strong><br />

Constantino, o que terminou em 324 quando Licínio foi <strong>de</strong>rrotado e morto por Constantino.<br />

Além disso, não foi apen<strong>as</strong> Constantino que viu o sinal no céu, “todo seu exército” viu,<br />

consi<strong>de</strong>rando-se que eram mais <strong>de</strong> três mil homens temos um c<strong>as</strong>o no qual o sagrado se manifestou para<br />

milhares <strong>de</strong> pesso<strong>as</strong>.<br />

A narrativa que apresenta uma intervenção direta <strong>de</strong> Deus, com o aparecimento <strong>de</strong> Cristo ao<br />

imperador, apresenta <strong>de</strong>sse modo, uma relação direta entre Deus e Constantino, representa uma “Aliança”<br />

entre o imperador e Deus, através <strong>da</strong> construção <strong>de</strong> uma cópia do símbolo que lhe foi apresentado por Cristo.<br />

Outro fato a ser explorado diz respeito ao troféu <strong>de</strong> guerra, enquanto Lactâncio fala apen<strong>as</strong> <strong>da</strong><br />

pintura do cristograma nos escudos dos sol<strong>da</strong>dos, Eusébio (na “Vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> Constantino”) apresenta a<br />

construção <strong>de</strong> um troféu feito em ouro e pedr<strong>as</strong> precios<strong>as</strong>, o qual estaria <strong>de</strong>positado no palácio <strong>de</strong><br />

Constantinopla. Isso é um dos fatos ain<strong>da</strong> mais interessantes, pois se Constantino fez um troféu como<br />

narrado por Eusébio, por que Lactâncio, o qual estava na corte <strong>de</strong> Constantino não disse algo sobre isso?<br />

M<strong>as</strong> não avançaremos nesta sen<strong>da</strong>, a qual nos levaria a novos questionamentos.<br />

As hierofani<strong>as</strong> cristãs têm então como foco a aliança <strong>de</strong> Constantino com Deus, o qual acatando <strong>as</strong><br />

prescrições que <strong>as</strong> rotur<strong>as</strong> do sagrado engendraram no profano, torna-se agente terreno <strong>da</strong> aliança que trará<br />

paz e uni<strong>da</strong><strong>de</strong> ao mundo.<br />

Em relação ao Panegírico, há o relato <strong>da</strong> aparição <strong>de</strong> Apolo ao Imperador. Apolo, <strong>de</strong>us solar,<br />

universal, encarna o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> sabedoria, realizadora do equilíbrio e <strong>da</strong> harmonia dos <strong>de</strong>sejos, não pela<br />

supressão d<strong>as</strong> pulsões human<strong>as</strong>, m<strong>as</strong> por orientá-l<strong>as</strong>, no sentido <strong>de</strong> uma espiritualização progressiva que se<br />

processa graç<strong>as</strong> ao <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> consciência.<br />

No texto, Apolo encarna o “império universal”, o qual é oferecido a Constantino, juntamente com a<br />

Vitória. A hierofania impõe-se <strong>de</strong> forma a explicar em termos <strong>de</strong> teologia política o império universal <strong>de</strong><br />

Constantino, além <strong>da</strong> proteção do Deus Solar que lhe prediz trinta anos <strong>de</strong> reinado.<br />

As hierofani<strong>as</strong> constantinian<strong>as</strong> apresentam-se então como espaços <strong>de</strong> manifestação do sagrado,<br />

havendo “não somente a rotura <strong>da</strong> homogenei<strong>da</strong><strong>de</strong> do espaço, como também revelação <strong>de</strong> uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

absoluta, que se opõe à não-reali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> imensa extensão envolvente. A manifestação do sagrado fun<strong>da</strong><br />

ontologicamente o mundo. Na extensão homogênea e infinita on<strong>de</strong> é possível nenhum ponto <strong>de</strong> referência, e<br />

on<strong>de</strong>, portanto, nenhuma orientação po<strong>de</strong> efetuar-se, a hierofania revela um ‘ponto fixo’ absoluto, um<br />

‘Centro’” (ELIADE: 1999, 26). Constantino estaria na posição <strong>de</strong> intermediário entre <strong>as</strong> du<strong>as</strong> esfer<strong>as</strong>. O<br />

imperador opera <strong>de</strong>ssa forma como um ponto <strong>de</strong> intersecção entre o sagrado e o profano.<br />

A guisa <strong>de</strong> conclusão, embora esta comunicação não se tenha proposto conclusiva, po<strong>de</strong>mos<br />

observar a manifestação do sagrado no seu sentido estrito na pessoa <strong>de</strong> Constantino. Em Lactâncio, o<br />

sagrado manifesta-se no sonho, no qual foi prescrito ao imperador que grav<strong>as</strong>se o sinal <strong>de</strong> Cristo nos<br />

escudos. Já em Eusébio, ele e seu exército compartilharam <strong>da</strong> experiência sagra<strong>da</strong> do sinal, no entanto,<br />

apen<strong>as</strong> o imperador forjou, em seu sonho, uma aliança com o Deus Cristão através <strong>de</strong> Jesus Cristo. E não é<br />

Jesus Cristo o maior exemplo <strong>de</strong> hierofania do Cristianismo? O Verbo <strong>de</strong> Deus encarnado?<br />

Em contraparti<strong>da</strong>, no panegírico VII, Apolo se manifesta a Constantino, o qual simbolicamente lhe<br />

oferece trinta anos <strong>de</strong> reinado. E não era Apolo o Deus dos Oráculos? Mitológicamente seu oráculo em<br />

Delfos não se encontra como ponto <strong>de</strong> parti<strong>da</strong> na narração mitológica <strong>de</strong> heróis e povos greco-romanos, o<br />

Centro do Mundo? Apolo também era o Deus <strong>da</strong> perfeição, e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Augusto imperadores buscavam uma<br />

<strong>as</strong>sociação a essa divin<strong>da</strong><strong>de</strong>, e no período helenístico não se encontrava <strong>as</strong>sociado à figura <strong>de</strong> um culto<br />

solar, ao qual Constantino se ligava através d<strong>as</strong> emissões monetári<strong>as</strong> ao SOL INVICTVS?<br />

Por fim, os três autores possivelmente nunca se encontraram, mesmo <strong>as</strong>sim, os três apresentam <strong>as</strong><br />

manifestações do sagrado na pessoa <strong>de</strong> Constantino. Os três relatos têm como princípios a <strong>de</strong>legação do<br />

império universal a Constantino, simbolicamente apresentam a mesma explicação teológica para o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

Constantino: o Imperador é um escolhido d<strong>as</strong> Divin<strong>da</strong><strong>de</strong>s, e, no c<strong>as</strong>o cristão, do Deus Único, su<strong>as</strong> vitóri<strong>as</strong><br />

são-lhe graç<strong>as</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>uses que possuem o “império universal”. Essa explicação <strong>de</strong> teologia política é própria<br />

do momento em que analisamos, <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma realeza sagra<strong>da</strong>, e pertence à própria cultura<br />

política <strong>da</strong> época <strong>de</strong> fins do III e inícios do IV século.<br />

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