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Isabela Arteiro_dissert.pdf - Unicap

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Na moral. Nem que a ponta saia depois. É a tal da fissura. Você tira a roupado corpo, fica nu, mas tem que fumar. Quando eu tive a overdose, fiqueiassustado. A médica olhou meus exames e disse que meu sangue estavacontaminado com 10% de crack. O cara tinha colocado na minha mão 200gramas de pedra para eu revender. Eu passei uma parte e fiquei com outra.Foram dez dias direto. Fumei pra mais de 500 pedras. Em dinheiro, se fossepara levantar, dava uns R$ 5 mil. Tinha que pagar. Se eu não pagasse,estava morto. Precisei vender o que tinha conseguido com sacrifício. Vendiminhas criações de bode. Dezenove cabeças de criação. Com o dinheiro,eu comprei 30 quilos de maconha. Eu dei a erva para pagar a pedra. Osusto foi a minha porta de saída. Eu cheguei apagado no Recife. Morto. Sólembro de ter acordado no hospital. Você não tem fome, não tem sono. Eufiquei parecendo um aidético. É o fim do mundo. No Sertão, não tem maismaconha para vender. Ninguém quer. Na terra dela, perdeu lugar para ocrack. Uma cidade pequena como Floresta, por exemplo, que não tem nem25 mil habitantes, está vivendo um tráfico de capital. Aqui, se acabar ocrack, um bocado de gente vai engordar em pouco tempo. Porque o crackconsome tudo. As autoridades precisam tomar uma medida drástica. Opovo não quer mais perder tempo com maconha não. Parte logo pra vendercrack. Dá muito mais dinheiro. Sem comparação. É mesmo que compararJesus com um jegue. Tem gente que não está mais nem querendo plantar,porque não tem mais futuro. Não é porque não quer, é porque não valemais a pena o risco. A polícia fica na porta, a perseguição é muita. Essecrack veio para acabar com o comércio de maconha. Acabar de tudo. Temmuita gente que ainda planta. Mas muitos estão desistindo. Antigamentecompensava. Dava um trocado. Agora é roubada. Os traficantes sabem queo usuário de crack é muito mais vantajoso para ele. Porque são poucos osque conseguem largar. A probabilidade é mínima. Graças a Deus, estou háquatro meses e 18 dias sem fumar. Você só faz acabar com o que vocêtem. É um segundo. Um segundo de alucinação e, depois, só perturbação.Você está comprando sua morte antecipada. Eu ia ficar nessa vida paraquê? Ia perder minha família, minhas filhas, minha esposa. Por causa deuma coisa que foi inventada pelo homem? Ou eu ou ela. Eu sou mais eu doque ela. Eu posso, eu quero, eu consigo 49 .Através do presente depoimento, torna-se evidente a exclusividade e oestado de escravidão proporcionado pela fixação à experiência intoxicante. É comose houvesse uma mudança no estilo de vida, em que o sujeito permanece em buscade novas experiências sensoriais, razão pela qual é difícil renunciar à droga. Nessescasos, fica nítida a extrapolação dos limites do próprio corpo, pois busca levar amente a um estado de alucinação e pura excitação; todos os órgãos do sentidoestão potencializados até atingir níveis de exaustão. Na overdose, ultrapassa-se olimite do suportável e, por isso, chega-se à morte. Parecem corpos gulosos, ávidos eimpacientes, querendo gozar a qualquer custo. “Na verdade, o corpo é provocado acada instante: nas percepções – atuais, mnemônicas ou fantasistas dos objetosdesejáveis –, na vivência do gozo” (SISSA, 1999, p. 8).49 Relato colhido do Especial sobre crack – Epidemia do tráfico, divulgado pelo Jornal do Comércio em Recife-PE datado de 20 de junho, 2007. O entrevistado é agricultor, residente no sertão Pernambucano.108

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