Você consegue pensar o que você buscava, nesse “todo dia”?O que eu buscava? Ah, satisfação, realização, não sei...Como era essa satisfação, o que você sentia com isso?Sentia bem, feliz, sentia tranqüilo, às vezes. Tipo... O que eu não tinha em casa, euconseguia na droga, em relação a minha mãe, né? É isso aí!O que não tinha em casa?Não assim, parte material, financeira, tinha de tudo, mas não tinha a parte afetiva... aparte emocional, em relação à eu e meus irmãos era diferente. Ela tratava elesmelhor do que eu. Eu vejo as fotos, não tem foto minha de criança... Uma serie deoutras coisas, assim, relacionadas a esse tipo.Por que você acha que acontecia isso?Porque eu fiquei sabendo já depois de grande, com 25 anos que minha mãe nãoqueria que eu nascesse quando ela tava grávida e meu avô veio falecer no dia queeu nasci. E como meu avo tinha presenciado o nascimento de outros irmãos maisvelhos, né, e não ia presenciar o meu, então ela não queria que eu nascesse. Aí,tipo, ela me rejeitou, né, Aí isso foi por parte dela e não por minha parte. Mas eu nãome apego muito a isso não, o culpado sou eu mesmo. Eu não posso culpar ela, oculpado sou eu também. Mesmo ela me tratando com distinção assim, acho que elaqueria meu bem, né... Sempre tive do bom e do melhor, estudei em colégioparticular e sempre tive do bom e do melhor, assim... Mas isso não era importantepra mim, a parte material, era importante a parte emocional, que não tinha, né? Seeu errasse, ela já vinha em cima e se meus irmãos errasse, não. Meu pai não, meupai já era bem diferente, meu pai tratava todo mundo igual. Hoje eu vejo que ela tamudando, mas porque eu to buscando também. Mas como eu disse pra ela, dissepro meu pai também: “É pra mim isso, não é pra vocês não. A vida é minha, não éde vocês não, porque vocês já têm a vida resolvida, né. E eu ainda não resolvi nada,pelo contrário, só piorei ela”. Então agora é minha vez de dar uma guinada e bolapra frente.Você já passou por outros tratamentos?Já, mas não era assim de ficar internado. Você ia durante o dia e depois retornavapra casa, então não tinha muito efeito, né? Ficava o dia todo lá, mas quando voltava,já bebia, já usava droga..., aquela vida louca de sempre.211
Me conta um pouco dessa vida louca? Como era? O que você pode detalhardisso?Como era? Era droga, viagens que eu fazia, como vou dizer pra senhora... é...Através das drogas, eu me envolvi com a criminalidade, me envolvi desde moleque,mas daí entrei de cabeça, mesmo... Me envolvi em quadrilhas e tal, daí comecei aroubar. Eu falava que ia viajar, trabalhar fora, mas era tudo mentira, eu ia roubarmesmo... Eu chegava nos lugar e ia roubar, o dinheiro era pra droga, mulher,bebida...orgia, né. Então, era isso, minha vida era assim, durante muitos anos foiassim. Desde os 15 anos foi assim, nunca comprei nada, só gastava em droga,mulheres e bebida.O que veio antes, a droga ou a criminalidade?Veio os dois juntos. Eu morava num bairro, o bairro era bom, só que fazia divisa coma periferia, e eu só gostava de andar na periferia... Ali todo mundo é igual. Nasociedade tem as diferença e ali não, todo mundo é igual. Eu me dava bem aliporque todo mundo era igual. Eles gostam de mim e eu gosto de todo mundo, daícomecei a ser chamado de traficante, ladrão, homicida e assim por diante...E, sua família, tinha um status social diferente?Ah, até hoje, tem. Todos meus irmãos são doutores, familia de empresários, até hojetem empresas na cidade, família conhecida, tradicional da cidade... Então, eles têmné, tem status. Só que eu nunca me apeguei em bens materiais, eu gosto de viverdo meu jeito. Pra mim se tem tá bom, se não tem tá bom também, mas eu gosto dapessoa verdadeira. O que ela é independente do que ela tem. Quando meu paitomou minhas coisas, eu falei: “Pega meu carro, vende, que eu não quero mais...”.Aí os amigos da sociedade você acaba perdendo, os outros não, gosta de mim peloo que eu sou. Eu achei melhor vender, do que ficar e dar para um traficante e eu iame arrepender pro resto da vida, né. Então eu penso assim...E, na infância, você já notava que tinha preferências diferentes das dos seusirmãos, gostos diferentes?Ah, eu tive muita frustração na minha infância. Meus irmãos pediam, eles ganhavam,né? E eu pedia era assim: “Ah, amanhã eu te dou, depois a gente vê isso...”. Eupedia e nunca chegava nada. Mas, ter eu sempre tive. Eu gostava de futebol, aítinha os uniformes dos times que eu gostava..., do Palmeiras..., tinha do Flamengo212
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Você consegue pensar, hoje, o porq
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“panquecar”, até que você dur