Texto completo em PDF - Museu da Vida
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outro trabalho, CALDAS (2002, pp. 135-136) diz que o fato relatado na mídia “é um recorte<br />
frágil e distorcido <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de”, uma versão do fato observado, pois “desde a coleta de <strong>da</strong>dos,<br />
a observação dos fatos, do relato <strong>da</strong> declaração do outro à construção <strong>da</strong> notícia,<br />
inevitavelmente, ocorre uma construção de sentidos que vai além <strong>da</strong> reali<strong>da</strong>de observa<strong>da</strong>”.<br />
Sobre essa construção de sentidos, apresento ex<strong>em</strong>plos nos capítulos VI e IX, dedicados<br />
respectivamente à análise dos gêneros reportag<strong>em</strong> e notícia.<br />
Lúcia SANTAELLA (1996, p. 331) observa que a linguag<strong>em</strong> apresenta um<br />
descompasso <strong>em</strong> relação à reali<strong>da</strong>de, por sua própria natureza de mediadora inalienável entre<br />
nós e o mundo. Segundo ela, “a essa diferença substantiva entre a linguag<strong>em</strong> e o real<br />
acrescentam-se as diferenças adjetivas, quer dizer, as variações próprias às posições históricas<br />
e sociais dos agentes que as produz<strong>em</strong> e consom<strong>em</strong>”. Isso significa que há construção de<br />
sentido tanto no ato de produção discursiva quanto no ato de recepção, pois, segundo<br />
Maurizio GNERRE (1998, p. 19), “entender não é reconhecer um sentido invariável, mas<br />
‘construir’ o sentido de uma forma no contexto no qual ela aparece”, uma vez que “as<br />
palavras não têm reali<strong>da</strong>de fora <strong>da</strong> produção lingüística; as palavras exist<strong>em</strong> nas situações nas<br />
quais são usa<strong>da</strong>s”. Para esse autor (id<strong>em</strong>, p. 6), a linguag<strong>em</strong> é uma forma de poder, já que n<strong>em</strong><br />
todos os integrantes de uma socie<strong>da</strong>de têm acesso a to<strong>da</strong>s as varie<strong>da</strong>des <strong>da</strong> língua e a todos os<br />
conteúdos referenciais, e a varie<strong>da</strong>de de maior prestígio social – a língua padrão, representa<strong>da</strong><br />
pela escrita – “é um sist<strong>em</strong>a comunicativo ao alcance de uma parte reduzi<strong>da</strong> dos integrantes<br />
de uma comuni<strong>da</strong>de”.<br />
Essa forma de poder aponta<strong>da</strong> por Gnerre se torna evidente nos discursos<br />
especializados, como os <strong>da</strong> ciência. De acordo com Maria José CORACINI (1991, p. 45), na<br />
ciência ocorre uma dominação “com relação ao grande público, que se at<strong>em</strong>oriza diante <strong>da</strong><br />
terminologia incompreensível e <strong>da</strong> sabedoria mítica, provocando uma reação de inferiori<strong>da</strong>de<br />
e admiração”. To<strong>da</strong>s as linguagens especiais, como a científica, têm, segundo GNERRE<br />
(1998, p. 23), uma função social: “elas têm um real valor comunicativo mas exclu<strong>em</strong> <strong>da</strong><br />
comunicação as pessoas <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong>de lingüística externa ao grupo que usa a linguag<strong>em</strong><br />
especial e, por outro lado, têm a função de reafirmar a identi<strong>da</strong>de dos integrantes do grupo<br />
reduzido que t<strong>em</strong> acesso à linguag<strong>em</strong> especial”. Esse autor (id<strong>em</strong>, p. 21) defende que para<br />
reduzir ou ampliar a faixa dos eventuais receptores de mensagens especializa<strong>da</strong>s, “é suficiente<br />
ajustar a sintaxe, o quadro de referências e o léxico”. Em tese, é esse “ajuste” que deve ser<br />
feito na produção do discurso de divulgação científica para ampliar os receptores de<br />
mensagens sobre ciência, que são restritos quando se trata de discurso científico (apresento<br />
diferentes posicionamentos teóricos sobre essa questão no capítulo IV). As escolhas lexicais e<br />
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