Texto completo em PDF - Museu da Vida
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O fato de Brooks ser do MIT e de ser diretor do Laboratório de Inteligência Artificial<br />
dessa consagra<strong>da</strong> instituição de pesquisa norte-americana, de certa forma, o “autoriza”<br />
(cf. MAINGUENEAU, 1987) a proferir essa fala seleciona<strong>da</strong> pela autora <strong>da</strong> resenha – pelo<br />
menos para o público leigo, ele goza de prestígio como fonte váli<strong>da</strong> e legítima para tratar do<br />
assunto. O uso argumentativo <strong>da</strong> fala de Brooks também aparece na escolha do verbo usado<br />
pela autora <strong>da</strong> resenha para relatar essa fala. Apesar de não estar na lista dos verbos<br />
introdutores de opinião proposta por MARCUSCHI (1991, p. 89), o verbo “esclarecer”<br />
grifado acima poderia estar entre os que o autor classifica de “indicadores de posições oficiais<br />
e afirmações positivas”. Na ver<strong>da</strong>de, verbos como “explicar” e “esclarecer” confer<strong>em</strong> ao autor<br />
<strong>da</strong> frase relata<strong>da</strong> a autori<strong>da</strong>de de qu<strong>em</strong> detém um certo conhecimento, o qual está sendo<br />
socializado através de sua fala. Como observa ZAMBONI (1997, p. 101), “o discurso <strong>da</strong><br />
ciência desfruta de um aspecto socialmente privilegiado, <strong>da</strong><strong>da</strong> sua representação como o<br />
‘discurso <strong>da</strong> ver<strong>da</strong>de’, de uma ‘fala incontestável’”. Segundo essa autora (id<strong>em</strong>, ibid<strong>em</strong>), isso<br />
“acarreta desigual<strong>da</strong>de na atribuição de valor social aos discursos, de modo que alguns [como<br />
o científico] gozam de maior valor simbólico do que outros”.<br />
Glacy de Roure usou <strong>em</strong> sua argumentação a fala de um <strong>em</strong>inente cientista, com<br />
posição de destaque <strong>em</strong> uma renoma<strong>da</strong> instituição de pesquisa – nota<strong>da</strong>mente o trecho <strong>em</strong> que<br />
ele fala que os robôs do futuro não terão vontade própria. Cabe observar aqui que essa fala de<br />
Brooks contém um dizer implícito: se a maior parte dos robôs não terá vontade própria, isso<br />
significa que pelo menos uma pequena parte dos robôs terá vontade própria. A autora <strong>da</strong><br />
resenha usa apenas o dizer explícito de Brooks para reforçar o seu argumento de que os robôs<br />
seriam, então, “objetos perfeitos para ocupar<strong>em</strong> o lugar de objeto de gozo do outro que o<br />
possui”. Segundo ela, esse é o caso do meca-filho do filme Inteligência Artificial, programado<br />
apenas para amar a mãe adotiva, s<strong>em</strong> que seus construtores previss<strong>em</strong> que ele também<br />
acabaria querendo o afeto dela. Glacy de Roure apresenta essa idéia após divagar<br />
psicanaliticamente – com o apoio de Lacan, outra “voz” incluí<strong>da</strong> <strong>em</strong> sua argumentação –<br />
acerca de crianças “impedi<strong>da</strong>s de se constituir <strong>em</strong> sujeito desejante”. Abaixo, ver<strong>em</strong>os a<br />
relação que ela estabelece entre o robô do filme – um mero objeto de desejo <strong>da</strong> mãe adotiva,<br />
na sua visão, que se torna um “meca-brinquedo” para o filho ver<strong>da</strong>deiro do casal – com um<br />
brinquedo que protagoniza uma fábula infantil.<br />
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