Texto completo em PDF - Museu da Vida
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No capítulo anterior, vimos que <strong>em</strong> todo gênero do discurso há um caráter dialógico,<br />
que é ain<strong>da</strong> mais explícito no gênero <strong>da</strong> reportag<strong>em</strong>, pois o texto construído pelo<br />
repórter/re<strong>da</strong>tor, além de se dirigir a um público leitor, também dialoga constant<strong>em</strong>ente com<br />
as falas de suas fontes, que ele seleciona para essa construção. Mikhail BAKHTIN (1997,<br />
p. 317) afirma que “a expressivi<strong>da</strong>de de um enunciado é s<strong>em</strong>pre, <strong>em</strong> menor ou maior grau,<br />
uma resposta; <strong>em</strong> outras palavras: manifesta não só sua própria relação com o objeto do<br />
enunciado, mas também a relação do locutor com os enunciados do outro”. Segundo ele, no<br />
caso específico dos discursos produzidos pela ciência, qualquer probl<strong>em</strong>a científico, no exame<br />
de seu histórico, “enseja uma confrontação dialógica ... entre os enunciados de cientistas que<br />
pod<strong>em</strong> na<strong>da</strong> saber uns dos outros”, pois o probl<strong>em</strong>a comum, objeto de análise, leva a essa<br />
relação dialógica (id<strong>em</strong>, ibid<strong>em</strong>, p. 354). Os fragmentos abaixo mostram que na construção de<br />
seu texto, a repórter Suzana Dias faz pesquisadores de universi<strong>da</strong>des e estados diferentes<br />
dialogar<strong>em</strong> entre si, ao comentar sobre o mesmo assunto, s<strong>em</strong> necessariamente se conhecer.<br />
(Reportag<strong>em</strong> 1 - Fragmento 1)<br />
São poucos os locais onde se mantêm com<strong>em</strong>orações no 13 de maio. No Vale do<br />
Paraíba, no estado de São Paulo, o 13 de maio é dia de festa. “Não porque a princesa<br />
foi uma santa ou porque os abolicionistas simpáticos foram fun<strong>da</strong>mentais, mas porque<br />
a população negra reconhece que a abolição veio <strong>em</strong> decorrência de muita luta”, diz<br />
[Flávio] Gomes [do Departamento de História <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong>de Federal do Rio de<br />
Janeiro]. Albertina Vasconcelos, professora do Departamento de História <strong>da</strong><br />
Universi<strong>da</strong>de Estadual do Sudoeste <strong>da</strong> Bahia, também l<strong>em</strong>bra que a <strong>da</strong>ta [13 de maio]<br />
é celebra<strong>da</strong> <strong>em</strong> vários centros de umban<strong>da</strong> na Bahia como o dia do preto-velho e que<br />
moradores antigos do Quilombo do Bananal, <strong>em</strong> Rio de Contas, Bahia, contam que<br />
seus pais e avós festejaram o 13 de maio de 1888 com muitos fogos e festas. (grifos<br />
meus)<br />
As duas fontes <strong>da</strong> reportag<strong>em</strong> sobre o Dia <strong>da</strong> Consciência Negra que dialogam no<br />
fragmento acima – Flávio Gomes, <strong>da</strong> UFRJ, e Albertina Vasconcelos, <strong>da</strong> UESB – comentam<br />
sobre a <strong>da</strong>ta à qual se contrapõe o dia 20 de nov<strong>em</strong>bro. Na fala do primeiro pesquisador, há<br />
implicitamente uma condenação aos que enaltec<strong>em</strong> o papel <strong>da</strong> princesa Isabel e dos<br />
abolicionistas para o fim <strong>da</strong> escravidão no Brasil. Segundo POSSENTI (1988, p. 122), as<br />
teorias dos implícitos argumentam “contra a hipótese de que tudo o que se diz está dito”. A<br />
interpretação <strong>da</strong> fala do pesquisador, no fragmento acima, “precisa ser busca<strong>da</strong> segundo uma<br />
outra estratégia que não apenas o desven<strong>da</strong>mento <strong>da</strong> combinatória dos el<strong>em</strong>entos constituintes<br />
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