15.04.2013 Views

O Riso no Mundo Antigo - NUCLAS

O Riso no Mundo Antigo - NUCLAS

O Riso no Mundo Antigo - NUCLAS

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

outro que com ele se diverte. 503<br />

Nessa passagem, observamos o que Bergson chama de “fantoche a cordões”<br />

como essa personagem que, acreditando controladora de seus movimentos, age<br />

tal qual a vontade de um controlador, sobera<strong>no</strong> dela e da cena. Nesse ponto, <strong>no</strong>s é<br />

fácil identifi car a fi gura de Penteu como este fantoche. Mas, se abrangermos ainda<br />

mais esse conceito, não seriam todos os personagens trágicos, esses que tão controlados<br />

são pelos deuses e o próprio desti<strong>no</strong>, “fantoches a cordões”? Como então<br />

não acharíamos graça da fi gura de Édipo, por exemplo, fantoche que é do desti<strong>no</strong><br />

e da vontade divina?<br />

É interessante observarmos que, talvez por termos apenas o texto, talvez por<br />

perdermos a <strong>no</strong>ção da tradição, a certa medida, todo personagem trágico, cego que<br />

está por sua determinação, poderia ser visto de certo modo como um pouco cômico.<br />

O próprio Bergson <strong>no</strong>s fala da questão da rigidez cômica. Um caráter muitas<br />

vezes rígido <strong>no</strong>s parece cômico se levado ao extremo de sua rigidez. A cegueira,<br />

tão frequente em tragédias, pode ser observada como cômica, mas apenas se <strong>no</strong>s<br />

distanciarmos dela. Seria então, <strong>no</strong> momento que <strong>no</strong>s apiedamos de Édipo, que<br />

deixamos de lado a situação da cegueira, percebendo a situação da personagem e<br />

<strong>no</strong>s identifi cando com ela. Aí está perdido o cômico. No entanto, numa situação<br />

como a de Penteu, em que o cômico de sua cegueira surge ao lado de um deus que<br />

o engana, é que temos a possibilidade de identifi cação. Como mortais que somos,<br />

deveríamos <strong>no</strong>s identifi car com Penteu, mas temos ainda Dioniso, o deus que busca<br />

por justiça para ele e sua mãe, em cena.<br />

Na situação já citada do “fantoche a cordões” de Bergson, o riso <strong>no</strong>s é possível<br />

ao <strong>no</strong>s identifi carmos como o trapaceiro. Ele diz: “Por um instinto natural,<br />

e porque se prefere, pelo me<strong>no</strong>s em imaginação, enganar-se a ser enganado, é do<br />

lado do trapaceiro que se põe o espectador.” 504 Nesse caso, podemos então, postos<br />

ao lado de Dioniso disfarçado que está de mortal, <strong>no</strong>s aliar ao deus a fi m de aproveitar<br />

da trapaça, rir com os discursos enga<strong>no</strong>sos e gozar plenamente das celebrações,<br />

loucura e vingança do deus. É uma escolha, muitas vezes inconsciente que<br />

fazemos, mas que resulta em uma visão da peça do lado de quem se vinga, faz a<br />

trapaça e ri dos inimigos. Postos ao lado do deus, difi cilmente <strong>no</strong>s emocionaremos<br />

ou <strong>no</strong>s apiedaremos de Penteu. Cabe a nós, então, apenas rir das situações em que<br />

os Teba<strong>no</strong>s são enganados, presentes que estão em toda a peça.<br />

Vemos então as bacas tebanas, infi éis e cegas que estão, e o próprio Penteu,<br />

na mesma situação que as mulheres, só que me<strong>no</strong>s consciente de sua cegueira.<br />

503 BERGSON, Henri. O <strong>Riso</strong>. Traduzido da 375ª edição francesa. Rio de Janeiro: Editora<br />

Guanabara, 1987. p. 46.<br />

504 Ibden. p. 46.<br />

322

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!