josé da silva carvalho - DSpace CEU

Este trecho veiu lançar viva luz sobre algumas phrases da correspondencia
dos plenipotenciarios portuguezes. No oflicio n.° 6, de 12 de dezembro, referem-se
elles «ás exigencias de que a Hcspanha fará depender o seu reconhecimento»,
e, no oflicio reservado n.° 1, de 21 do mesmo mez, dizem que, permanecendo a
naciío no síatu quo, «será inevitavel o sacrificio quasi completo das instituiçoes,
se a Hespanba, continuando no systema que ainda agora segué, assim o exigir».
«Neste ultimo caso, bem pode v. ex.» pensar que, fiéis ás nossas instrucçoes»,
. . . «só tomaremos ad referendum as proposiçoes que nos forem feitas» . . . «Que
os nossos poderes sejam revogados e a nossa missao substituida por outrem, se
parecer que uin resultado que julgamos só filho das circumstancias possa ser
attribuido a culpa ou omissáo dos negociadores.»
Com estas insinuaçoes, pretendiam os plenipotenciarios preparar a Regencia
para os sacrificios sera limites, promettidos a lord Palmerston. Eis o que motivou a
sua desgraça.
Nunca mais o resentimento e a desconfiança se desvaneceram completamente
no espirito do Regente contra o marquez de Palmella. Depois de demittido
do ministerio e da missao diplomática, deixou-se o marquez ficar ainda por
alguns mezes no estrangeiro, magoado e cheio de despeito, mas impenitente. A
27 de março, escrevia a Abreu e Lima: «Parece que elle (tur Stratford Canning)
tinha communicaçoes directas do Porto e que o Imperador estava disposto a
acceder a tudo quanto se quizesse, sem exigir outras condiçoes mais do que a da
exclusüo do infante D. Miguel».
«Que dcsgraça que esta mesma condescendencia nao fosse manifestada ha
mais tempo e logo que se couheceu a impossibilidade em que estavamos de concluir
por meio das armas a nossa contenda. Agora é de recear que talvez seja
tarde e que a falta de meios pecuniarios nos faca rebentar de uin momento para
o outro! Deus afaste tao funestos agouros.» 1
Com a condescendencia c os agouros de Palmella contrastava a resistencia
heroica de D. Pedro e dos seus novos ministros, que elle acabava de defender
contra as invectivas de lord Palmerston, allegando que os tinha «tirado daclasse
mais ¡Ilustrada da emigraçao, que offerecia ao mesmo tempo um justo meio termo
entre a pura aristocracia, que, por causas bem conhecidas, nao iuspirava ainda
á naçito bastante confiança, e os espiritos exaltados...» O plenipotenciario destituido,
que comproinettera a dignidade do seu partido com a celebre missao de
Canning, em que ninguem coufiou, nem mesmo lord Palmerston 2
, qualifica aquella
nobre e corajosa defeza como «delirio e ignorancia da verdadeira situaçiio dos
espiritos dentro e fora de Portugal-). Pouco depois,—mallogradas já, por completo,
as negociaçoes diplomáticas, em Madrid, e deparando-se-lbe na expediçao naval
que de Inglaterra ia partir em soccorro da causa constitucional portugueza um
ensejo de a servir, nao como urna especie de «amnistiado», mas readquirindo
talvez toda a sua autiga preponderancia, ou ainda mais,—resolve nao só acceitar
o convite «para lhe dar realidade», mas declara que, «havendo elle proposto e
insistido que a expediçao tocasse primeiramente no Porto, antes de emprehender
qualquer desembarque em Portugal, e havendo sido approvada esta alteraçao no
plano original, se presta a acoinpauhar a expedicáo, considerando-se meramente
1
Carreira, Correspondencia.
2 Yol. i, pag. 302.