josé da silva carvalho - DSpace CEU

e que por isso o citado Decreto nao produz obrigacáo de obediencia,
porque, segundo o § 1.° do artigo 145.°, «nenlium cidadáo pode ser
obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma cousa senáo em virtude
da lei».
A independencia do Poder Judicial nao é um favor concedido á
classe dos juizes, é uma garantia dada á sociedade: sem essa garantía
nao é possivel que o Poder Judicial preencha a alta missáo que a Carta
lhe confiou, elevando-o á categoría de Poder Político do Estado. Repousa
essencialmente a independencia dos juizes na sua perpetuidade, esta-
belecida no artigo 120.° da Carta, e ó esta perpetuidade que o
Decreto destroe; porquanto, ainda que no mesmo artigo se declare
que os juizes podem ser mudados de uns para outros logares pelo
tempo e modo que a lei determinar, dispoe o artigo 122.° que só por
sentença possam d'elles ser privados; e o Decreto, estabelecendo no
artigo 4.° que os juizes de 1. a
e 2. a
instancia, intimados para transfe­
rencia, deixem logo os seus logares vagos, sob pena de entender-se
haverem renunciado a todo e qualquer logar na Magistratura Judicial,
se algum acto mais de jurisdicyáo praticarem nelles, nao só priva os
ditos juizes dos seus cargos, mas exclue-os de occupar outros na
ordem judicial. E isto sem queixa contra elles feita, sem sua previa
audiencia e do Conselho d'Estado, nos termos do artigo 121.°, sem
processo nem sentenya e contra o direito natural produzido e appli-
cado na Ordenayáo do Reino, o qual nao consente que alguem seja
condemnado sem ser ouvido e convencido.
A lei regulamentar do artigo 120.° da Carta foi feita e publicada
pelos Poderes competentes, e, formando uma parte complementar do
mesmo artigo, só em sua conformidade podem ser transferidos os
juizes. Esta lei nao comprehendeu os juizes das Relaçoes, criados para
julgar as causas em segunda e ultima instancia, o que o Decreto faz,
offendendo as provisoes d'aquella lei. Estas provisoes conformam-se com
a lettra e espirito da Carta, e dio á transferencia um carácter de lega-
lidade, sem por em duvida a competencia de jurisdicyáo, carácter que
o Decreto lhe tirón na transferencia extraordinaria dos juizes, bem
como na ordinaria; porque, deixando ao arbitrio do Poder Executivo
o tempo e modo de verificar essa transferencia, pode acontecer que
este o faca de maneira que o juiz transferido venha desempenhar uma
rigorosa commissáo, o que ó expressamente prohibido no § 16.° do
artigo 145.° da Carta. Alem d'isto, aos juizes substitutos vem a faltar
a mais essencial das suas qualificayoes— a independencia; pois que o
mesmo Decreto os declarou sujeitos á demissáo arbitraria do Governo.
Taes sao, entre outras, as disposiyoes de um Decreto que, afora
a inconveniencia das mesmas, é vicioso e millo na sua origem. Quanto