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Memórias de Padre Germano

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Logo irás - respon<strong>de</strong>u ele. E, a partir daquele momento,<br />

<strong>de</strong>ixei <strong>de</strong> fazer minha vonta<strong>de</strong>.<br />

Meus mestres ficaram satisfeitos comigo, embora nunca<br />

tenham <strong>de</strong>monstrado. Jamais me acariciaram nem me<br />

castigaram. Minha vida era triste, muito triste, <strong>de</strong> uma<br />

monotonia insuportável. Eu sentia um frio na alma que me<br />

matava e só recuperava o alento quando León e Zoa apoiavam<br />

sua inteligente cabeça em meus joelhos. Nobres animais! Eles<br />

eram os únicos que me acariciavam e que <strong>de</strong>monstravam<br />

alegria ao me ver. Os outros moradores do convento jamais me<br />

dirigiram uma palavra carinhosa. Mais <strong>de</strong> uma vez recor<strong>de</strong>i os<br />

pobres pescadores que, em sua ru<strong>de</strong>za, amavam-me e me<br />

ouviam como a um oráculo. Mas eu tinha se<strong>de</strong> <strong>de</strong> ciência, eu<br />

queria ser um gran<strong>de</strong> sábio e em minha juventu<strong>de</strong> o homem só<br />

tinha dois caminhos para engran<strong>de</strong>cer: o campo <strong>de</strong> batalha ou<br />

a religião. As artes estavam mortas. Virão tempos melhores,<br />

nos quais o homem po<strong>de</strong>rá escolher à vonta<strong>de</strong>. Mas, na época,<br />

o saber estava nos conventos, e eu queria ser sábio a todo<br />

custo, <strong>de</strong> modo que <strong>de</strong>vorei em silêncio minha solitária infância<br />

e minha austera juventu<strong>de</strong>. Todo meu afã era ler, ler sempre, e<br />

<strong>de</strong>corei todos os livros que havia na biblioteca do convento. E<br />

ainda fiz a avaliação crítica <strong>de</strong> todos eles. E aos <strong>de</strong>zesseis<br />

anos pronunciei um discurso refutando todos os silogismos<br />

teológicos, o que me valeu uma duríssima reprimenda <strong>de</strong> meus<br />

superiores e a ameaça <strong>de</strong> horríveis castigos se me rebelasse<br />

contra a madre Igreja que havia me acolhido em seu seio<br />

quando eu não tinha mais que o pão da carida<strong>de</strong>.<br />

No ano seguinte, por normas do ensino, tive que pronunciar<br />

um novo discurso que me valeu um ano <strong>de</strong> clausura, seis<br />

semanas a pão e água e privação temporária <strong>de</strong> subir à<br />

cátedra sagrada.<br />

Poucos dias antes <strong>de</strong> celebrar pela primeira vez o sacrifício<br />

da missa, o ancião a quem eu havia pedido, quando menino,<br />

que me ensinasse a ler, chamou-me a sua cela e me disse:<br />

<strong>Germano</strong>, eu te quero muito bem, embora nunca tenha<br />

<strong>de</strong>monstrado, porque a estreiteza e a austerida<strong>de</strong> da Or<strong>de</strong>m a<br />

que pertencemos não permitem expansões ao coração, e<br />

temos que sufocar todos os sentimentos. E isso é o que quero

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