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Memórias de Padre Germano

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meu belo i<strong>de</strong>al, havia formado as sólidas bases da religião que<br />

eu ensinava, havia transformado minha velha igreja em um<br />

ninho <strong>de</strong> amor e <strong>de</strong> esperança.<br />

Certa tar<strong>de</strong>, estava eu estudando quando vi Sultão entrar<br />

em meu oratório. Veio, como <strong>de</strong> costume, apoiar sua<br />

inteligente cabeça em meus joelhos. Depois, olhou para mim e<br />

soltou um uivo lastimoso, fechando os olhos. Duas crianças<br />

vinham com ele e, ao vê-lo abrir e fechar os olhos várias vezes,<br />

começaram a rir, e a maior disse: "<strong>Padre</strong>, não enten<strong>de</strong> o que<br />

Sultão lhe está dizendo? Diz que encontramos uma pobre<br />

cega. Vin<strong>de</strong>, padre, vin<strong>de</strong>! Esta sim que precisa do senhor,<br />

porque está blasfemando, está dizendo aos gritos que Deus<br />

não existe. Como essa mulher <strong>de</strong>ve ser má! Não é, padre, que<br />

<strong>de</strong>ve ser má?"<br />

Sem saber por que, as acusações daquele menino me<br />

fizeram mal, e eu disse:<br />

Olha, meu filho, ninguém tem direito <strong>de</strong> julgar o outro.<br />

Mas se ela diz que Deus não existe... - replicou o menino. -<br />

Vá ver, padre.<br />

Saí com meus infantis companheiros e nos dirigimos à<br />

Fonte da Saú<strong>de</strong>, on<strong>de</strong> encontrei o seguinte quadro: cerca <strong>de</strong><br />

doze crianças cercavam uma mulher que estava quase nua,<br />

com o cabelo solto, os olhos fundos, mas abertos, contornados<br />

por um círculo violáceo, roxo, e tinham uma fixação aterradora.<br />

Apesar <strong>de</strong> estar muito magra (pois parecia um esqueleto),<br />

viam-se no rosto daquela <strong>de</strong>safortunada as marcas <strong>de</strong> sua<br />

perdida beleza. Seu perfil conservava a marca da perfeição.<br />

Olhei-a atentamente e parecia que uma voz murmurava em<br />

meu ouvido: "Olha bem para ela! Não te lembras? Olha para<br />

trás'! Em minha mente eu ia evocando todas as minhas<br />

lembranças, e a voz me dizia: "Mais longe, mais longe ainda'! E<br />

fui retroce<strong>de</strong>ndo até o pobre casebre on<strong>de</strong> passei os primeiros<br />

anos <strong>de</strong> minha vida. "Aqui?'! perguntei. "Aqui <strong>de</strong>vo parar?" A<br />

voz misteriosa não respon<strong>de</strong>u a minha pergunta, mas as<br />

apressadas batidas <strong>de</strong> meu coração me disseram que entre<br />

aquela mulher e eu havia um íntimo parentesco. Entre a infeliz<br />

blasfemadora e o padre das almas existia um laço, o laço mais<br />

forte que une os seres entre si. Eu era carne <strong>de</strong> sua carne! Eu

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